A visão espírita do suicídio – Palestra 29.6.16
A VISÃO ESPÍRITA DO SUICÍDIO
29/06/16 – Ellen – CELC
I. – DA INTRODUÇÃO
Um RELATÓRIO da ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) divulgado em 2014, sobre o SUICÍDIO fez um alerta: mais de 800 mil pessoas cometeram suicídio, no mundo, no ano de 2012. Isso representa uma morte a cada 40 segundos. Ou seja, a cada 2 (dois) minutos três pessoas se suicidavam no mundo em 2012.
No site “worldometers”, que fornece estatísticas mundiais em tempo real, no dia 29/06/2016, às 12:25 horas, o mesmo informava o seguinte número de suicídios ocorridos, no mundo, neste ano até referido horário: 530.415, o que representa por volta de 2.954 suicídios por dia, de forma que, atualmente, a cada 2 minutos cerca de 4 pessoas se suicidam.
Os dados do RELATÓRIO da OMS indicam que o maior índice de suicídios ocorre entre pessoas com mais de 70 anos de idade. Mas, no mundo, o suicídio é a segunda principal causa de morte entre a população de 15 a 29 anos; a primeira causa (de morte entre os jovens) são os acidentes de trânsito; e em 3° lugar: a AIDS.
O RELATÓRIO da OMS afirma ainda que há mais mortes causadas por suicídio do que por guerras e homicídio juntos.
Por causa dessa situação, a OMS considera que o suicídio é “um grande problema de saúde pública”, apesar de não ser tratado como tal. Cerca de 75% dos casos ocorrem em países de rendas média e baixa.
Segundo o RELATÓRIO da OMS, o Brasil é o oitavo país com mais suicídios. Em 2012, foram registrados 11.821 casos. A Índia está em primeiro lugar com 258 mil casos, seguida da China, Estados Unidos, da Rússia, do Japão, da Coreia do Sul, do Paquistão e do Brasil.
Os métodos mais usados globalmente são uso de pesticidas, enforcamento e armas de fogo. Sobre as causas, o RELATÓRIO da OMS afirma que em países desenvolvidos a prática do suicídio tem relação com transtornos mentais decorrentes, principalmente, da depressão e de abuso de álcool, enquanto que nas nações menos favorecidas essas causas resultariam da pressão e do estresse suscitados por problemas socioeconômicos.
Não bastassem os números acima, temos ainda outra vertente de suicídio que é a eutanásia (ato de proporcionar morte sem sofrimento a um doente atingido por afecção incurável), e segundo um artigo sobre a prática da eutanásia publicado na Revista Cláudia, de Abril de 2016, tem-se que nos Estados Unidos, cinco estados admitem a eutanásia e outros vinte discutem propostas legislativas, como ocorre no Reino Unido, na Alemanha e na África do Sul. Em 2001 a Holanda foi a primeira a legalizá-la, seguida pela Bélgica. A Colômbia tem decisão favorável na Corte Constitucional e no Uruguai, desde 1934, um Juiz pode isentar de culpa o cidadão que atende às súplicas de um doente. Na Suíça funcionam a “EXITE” e a “DIGNITAS” que são organizações de suicídio assistido.
No entanto, a eutanásia é uma infração às leis de Deus, conforme consta na questão 953 do Livro dos Espíritos: que nos ensina que “Sempre se é culpado por não esperar o termo fixado por Deus.”
E, neste estudo, abordaremos A VISÃO ESPÍRITA DO SUICÍDIO.
II. – DO CONCEITO DO SUICÍDIO SEGUNDO A DOUTRINA ESPÍRITA
Mediante a análise dos ensinos contidos nas obras básicas da Doutrina Espírita, verificamos que, o suicídio é numa transgressão da Lei Divina (L. E., questão n. 944) e constitui sempre uma falta de resignação e submissão à vontade do Criador (L. E., questão n. 953-a).
Desse modo, “Jamais tem o homem o direito de dispor da sua vida, porquanto só a Deus cabe retirá-lo do cativeiro da Terra, quando o julgue oportuno. Todavia, a justiça divina pode abrandar-lhe os rigores, de acordo com as circunstâncias, reservando, porém, toda a severidade para com aquele que se quis subtrair às provas da vida. O suicida é qual prisioneiro que se evade da prisão, antes de cumprida a pena; quando preso de novo, é mais severamente tratado. O mesmo se dá com o suicida que julga escapar às misérias do presente e mergulha em desgraças maiores.” (Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XXVIII, item 71).
Na Nota de Kardec sobre a resposta da questão 957, no L.E., a qual trata sobre as consequências do suicídio, Kardec diz que: “A religião, a moral, todas as filosofias condenam o suicídio como contrário à lei natural. Todas nos dizem, em princípio, que não se tem o direito de abreviar voluntariamente a vida; mas por que não se tem esse direito? Por que não se é livre para pôr termo aos sofrimentos? Estava reservado ao Espiritismo demonstrar, pelo exemplo daqueles que sucumbiram, que isso não é só uma falta como infração a uma lei moral, consideração de pouca importância para certos indivíduos, mas um ato estúpido, visto que com ele nada se ganha. Isso não é a teoria que nos ensina, mas os fatos que ele coloca sob nossos olhos.”
II. I. – DO SUICÍDIO INDIRETO e DO SUICÍDIO DIRETO
II. I. I. – DO SUICÍDIO INDIRETO
Na obra “O CÉU E O INFERNO” (Segunda Parte, Capítulo V, intitulado “SUICIDAS”), pág. 252, na nota explicativa sobre o suicídio direto cometido pelo pai, com o fito de evitar que seu filho fosse enviado à guerra, Allan Kardec nos dá a definição de suicídio indireto, a saber:
“O suicídio não consiste somente no ato voluntário que produz a morte instantânea, mas em tudo quanto se faça conscientemente para apressar a extinção das forças vitais.”
Ou seja, qualquer ato contínuo ou esporádico de irresponsabilidade para com o corpo físico, diminuindo o tempo programado de existência é considerado como suicídio indireto.
No Livro dos Espíritos, a questão 952 chama o suicídio indireto de suicídio moral, e pergunta se comete suicídio o homem que se consome no abuso de seus vícios que ele sabe que apressarão seu fim, mas que ele não tem mais o poder de resistir, porque o hábito fez deles verdadeiras necessidades físicas?
A resposta diz que este homem comete “suicídio moral” (suicídio indireto), e que é duplamente culpado, porque há nele falta de coragem e animalidade, além disso, o esquecimento de Deus. Pois, tem consciência que seus atos estão apressando o fim do corpo físico, mas mesmo assim, continua no erro, não adota o procedimento adequado para vencer suas dificuldades. E que é, inclusive, mais culpado do que aquele que tira a vida por desespero, porque teve tempo de raciocinar sobre o seu suicídio e que será muito mais punido, porque as penas são sempre proporcionais à consciência que se tem das faltas cometidas.
Como exemplo de suicídio indireto temos André Luiz, conforme seu relato na obra “NOSSO LAR” (Capítulo 4, intitulado “O MÉDICO ESPIRITUAL”), psicografia de Chico Xavier, onde utiliza o termo suicídio indireto ou inconsciente.
Vale lembrar que André Luiz após a desencarnação permaneceu por oito anos no Umbral, nas Zonas Inferiores, onde seres maldosos e sarcásticos gritavam a André Luiz:
“Suicida! Suicida! Criminoso! Infame!” – gritos assim, cercavam-me de todos os lados. Onde os sicários (assassinos) de coração empedernido (insensível)? Por vezes, enxergava-os de relance, escorregadios na treva espessa e, quando meu desespero atingia o auge, atacava-os, mobilizando extremas energias. Em vão, porém, esmurrava o ar nos paroxismos (momento de intensidade) da cólera. Gargalhadas sarcásticas (com zombaria, com desprezo ou desdém) feriam-me os ouvidos, enquanto os vultos negros desapareciam na sombra.
(…)
– Que buscas, infeliz! Aonde vais, suicida?
Tais objurgatórias (censuras, repreensões), incessantemente repetidas, perturbavam-me o coração. Infeliz, sim; mas, suicida? – nunca! Essas increpações (acusações), a meu ver, não eram procedentes. Eu havia deixado o corpo físico a contragosto.”
(excertos extraídos do Cap. 2 – “CLARÊNCIO”, de “NOSSO LAR” )
André Luiz não se conformava em ser acusado de suicida, pois acreditava que não o fora, lembrava-se de haver morrido no hospital, após cirurgia intestinal. Depois de oito anos de sofrimento no umbral, quando sentia que suas energias lhe faltaram de todo, sem forças para reerguer-se, pediu a Deus, orou com humildade, com sinceridade, em resposta, surgiu o benfeitor Clarêncio, acompanhado por 2 (dois) auxiliares e André Luiz foi conduzido ao “Nosso Lar”.
Já em “NOSSO LAR”, hospitalizado André Luiz é atendido pelo médico Henrique de Luna que comprova sua condição de suicida indireto, conforme narra o Cap. 4- “O MÉDICO ESPIRITUAL”:
“Sorridente, o velhinho amigo (Clarêncio) apresentou-me o companheiro. Tratava- se, disse, do irmão Henrique de Luna, do Serviço de Assistência Médica da colônia espiritual. Trajado de branco, traços fisionômicos irradiando enorme simpatia, Henrique auscultou-me (ação médica que consiste em aplicar o ouvido ou o estetoscópio para inspecionar o funcionamento dos órgãos pelos ruídos produzidos) demoradamente, sorriu e explicou:
– É de lamentar que tenha vindo pelo suicídio.
Enquanto Clarêncio permanecia sereno, senti que singular assomo (explosão) de revolta me borbulhava no íntimo.
Suicídio? Recordei as acusações dos seres perversos das sombras.
Não obstante o cabedal de gratidão que começava a acumular, não calei a incriminação (imputação).
– Creio haja engano – asseverei, melindrado -, meu regresso do mundo não teve essa causa. Lutei mais de quarenta dias, na Casa de Saúde, tentando vencer a morte. Sofri duas operações graves, devido a oclusão (obstrução) intestinal…
– Sim – esclareceu o médico, demonstrando a mesma serenidade superior -, mas a oclusão radicava-se em causas profundas. Talvez o amigo não tenha ponderado bastante. O organismo espiritual apresenta em si mesmo a história completa das ações praticadas no mundo.
E inclinando-se, atencioso, indicava determinados pontos do meu corpo:
– Vejamos a zona intestinal – exclamou. – A oclusão derivava de elementos cancerosos, e estes, por sua vez, de algumas leviandades do meu estimado irmão, no campo da sífilis. A moléstia talvez não assumisse características tão graves, se o seu procedimento mental no planeta estivesse enquadrado nos princípios da fraternidade e da temperança.
Entretanto, seu modo especial de conviver, muita vez exasperado (exaltado, irritado) e sombrio, captava (trazia para si), destruidoras vibrações naqueles que o ouviam. Nunca imaginou que a cólera fosse manancial de forças negativas para nós mesmos? A ausência de autodomínio, a inadvertência no trato com os semelhantes, aos quais muitas vezes ofendeu sem refletir, conduziam-no frequentemente à esfera dos seres doentes e inferiores. Tal circunstância agravou, de muito, o seu estado físico.
Depois de longa pausa, em que me examinava atentamente, continuou:
– Já observou, meu amigo, que seu fígado foi maltratado pela sua própria ação; que os rins foram esquecidos, com terrível menosprezo às dádivas sagradas?
Singular desapontamento invadira-me o coração. Parecendo desconhecer a angústia que me oprimia, continuava o médico, esclarecendo:
– Os órgãos do corpo somático possuem incalculáveis reservas, segundo os desígnios do Senhor. O meu amigo, no entanto, iludiu excelentes oportunidades, esperdiçado (desperdiçado) patrimônios preciosos da experiência física. A longa tarefa, que lhe foi confiada pelos Maiores da Espiritualidade Superior, foi reduzida a meras tentativas de trabalho que não se consumou. Todo o aparelho gástrico foi destruído à custa de excessos de alimentação e bebidas alcoólicas, aparentemente sem importância. Devorou-lhe a sífilis energias essenciais. Como vê, o suicídio é incontestável.
Meditei nos problemas dos caminhos humanos, refletindo nas oportunidades perdidas. Na vida humana, conseguia ajustar numerosas máscaras ao rosto, talhando-as conforme as situações. Aliás, não poderia supor, noutro tempo, que me seriam pedidas contas de episódios simples, que costumava considerar como fatos sem maior significação. Conceituara, até ali, os erros humanos, segundo os preceitos da criminologia. Todo acontecimento insignificante, estranho aos códigos, entraria na relação de fenômenos naturais. Deparava-se-me, porém, agora, outro sistema de verificação das faltas cometidas. Não me defrontavam tribunais de tortura, nem me surpreendiam abismos infernais; contudo, benfeitores sorridentes comentavam-me as fraquezas como quem cuida de uma criança desorientada, longe das vistas paternas. Aquele interesse espontâneo, no entanto, feria-me a vaidade de homem. Talvez que, visitado por figuras diabólicas a me torturarem, de tridente nas mãos, encontrasse forças para tornar a derrota menos amarga.
Todavia, a bondade exuberante de Clarêncio, a inflexão de ternura do médico, a calma fraternal do enfermeiro, penetravam-me fundo o espírito. Não me dilacerava o desejo de reação; doía-me a vergonha. E chorei. Rosto entre as mãos, qual menino contrariado e infeliz, pus-me a soluçar com a dor que me parecia irremediável. Não havia como discordar. Henrique de Luna falava com sobejas (excessivas) razões. Por fim, abafando os impulsos vaidosos, reconheci a extensão de minhas leviandades de outros tempos. A falsa noção da dignidade pessoal cedia terreno à justiça. Perante minha visão espiritual só existia, agora, uma realidade torturante: era verdadeiramente um suicida, perdera o ensejo precioso da experiência humana, não passava de náufrago a quem se recolhia por caridade.
Foi então que o generoso Clarêncio, sentando-se no leito, a meu lado, afagou-me paternalmente os cabelos e falou comovido:
– Oh! meu filho, não te lastimes tanto. Busquei-te atendendo à intercessão dos que te amam, dos planos mais altos. Tuas lágrimas atingem seus corações.
– Não desejas ser grato, mantendo-te tranquilo no exame das próprias faltas? Na verdade, tua posição é a do suicida inconsciente; mas é necessário reconhecer que centenas de criaturas se ausentam diariamente da Terra, nas mesmas condições. Acalma-te, pois. Aproveita os tesouros do arrependimento, guarda a bênção do remorso, embora tardio, sem esquecer que a aflição não resolve problemas. Confia no Senhor e em nossa dedicação fraternal.
Sossega a alma perturbada, porque muitos de nós outros já perambulamos igualmente nos teus caminhos.
Ante a generosidade que transbordava dessas palavras, mergulhei a cabeça em seu colo paternal e chorei longamente.
(excerto extraído do Cap. 4- “O MÉDICO ESPIRITUAL”, de “NOSSO LAR” )
André Luiz através da obra “OBREIROS DA VIDA ETERNA“, no Cap. 14, intitulado “PRESTANDO ASSISTÊNCIA”, psicografia de Chico Xavier, nos conta outro caso de suicídio indireto. Neste livro a equipe de André Luiz parte de viagem e a caminho estaciona na “CASA TRANSITÓRIA DE FABIANO”, que é uma instituição fundada por Fabiano, nas cercanias da Crosta, é um asilo móvel, pois quando há necessidade transporta-se para outras regiões espirituais, tem defesas elétricas contra espíritos maldosos, e, nesta casa, é que serão recolhidos quatro Espíritos cuja desencarnação terá o amparo da equipe de André Luiz.
E no Capítulo 14, consta que André Luiz deixando a Casa Transitória foi até a casa onde estava ocorrendo o velório de Dimas (um dos quatro Espíritos que a desencarnação teve o amparo da equipe), a casa estava cheia de amigos e simpatizantes, encarnados e desencarnados. Em recuado recanto, ainda ligado às vísceras inertes pelo cordão fluídico-prateado, permanecia Dimas no regaço (colo) da genitora, ao pé de dois amigos que, cuidadosos, o assistiam. A mãe do Dimas apresentou André Luiz aos companheiros presentes, um deles era o Fabriciano, que narrou caso de suicídio indireto:
“Respeitável senhora, jovem ainda, pelas disposições sadias que demonstrou no campo da benemerência social, foi ligada a dedicada corrente de serviço, organizada por amigos nossos. Verificando-se, contudo, pequenas rusgas entre ela e o esposo, e tendo conhecimento da imortalidade da vida, além do sepulcro, desejou a pobre criatura ardentemente morrer. Tolas leviandades do marido bastaram para que maldissesse o mundo e a Humanidade. Não soube quebrar a concha do personalismo inferior e colocar-se a caminho da vida maior. Pela cólera, pela intemperança ( imoderação) mental, criou a ideia fixa de llbertar-se do corpo de qualquer maneira, embora sem utilizar o suicídio direto. Conhecia os amigos espirituais a que se havia unido, mas, longe de assimilar-lhes ajuizadamente os conselhos, repelia-lhes as advertências fraternas para aceitar tão somente as palavras de consolação que lhe eram agradáveis, dentre as admoestações (advertências, reprimendas) salutares que lhe endereçavam. E tanto pediu a morte, insistindo por ela, entre a mágoa e a irritação persistentes, que veio a desencarnar em manifestação de icterícia complicada com simples surto gripal. Tratava-se de verdadeiro suicídio inconsciente, mas a senhora, no fundo, era extraordinariamente caridosa e ingênua. Não se recebeu qualquer autorização para conceder-lhe descanso e muito menos auxilio especial. Os benfeitores de nossa esfera, apesar de eficiente intercessão em beneficio da infeliz, somente puderam afastá-la das vísceras cadavéricas, há dois dias, em condições impressionantes e tristes. Não havendo qualquer determinação de assistência particularizada, por parte das autoridades superiores, e porque não seria aconselhável entregá-la ao sabor da própria sorte, em face das virtudes potenciais de que era portadora, o diretor da comissão de serviço, a que se filiara a imprevidente amiga, recolheu-a, por espírito de compaixão, em plena luta, e ela se foi, de roldão (de golpe; em sobressalto), a trabalhar por aí, ativamente, em condições muito mais sérias e complicadas.
(. . .)
Fabriciano, estampando belo sorriso, aduziu:
— Não frutifica a paz legitima sem a semeadura necessária. Alguém, para gozar o descanso, precisa, antes de tudo, merecê-lo. As almas inquietas entregam-se facilmente ao desespero, gerando causas de sofrimento cruel.”
(excerto extraído do Cap. 14- “PRESTANDO ASSISTÊNCIA “, de “OBREIROS DA VIDA ETERNA” )
Ainda na obra OBREIROS DA VIDA ETERNA, no Cap. 5 – “IRMÃO GOTUZO”, Gotuzo, que é um médico assistente da Casa Transitória de Fabiano, diz para André Luiz, sobre os que buscam a morte física através do suicídio indireto que: “mais venturosa lhes seria a existência totalmente desprovida de encanto, com pesadas disciplinas a lhes inibirem as divagações”, do que as consequências do suicídio.
No Livro dos Espíritos, temos na questão 943 a seguinte pergunta: “De onde vem o desgosto da vida que se apodera de certos indivíduos, sem motivos plausíveis?”
“– Efeito da ociosidade, da falta de fé e, frequentemente, da saciedade. Para aquele que exercita suas faculdades com um objetivo útil e segundo suas aptidões naturais, o trabalho não tem nada de árido e a vida se escoa mais rapidamente. Ele suporta as vicissitudes com tanto mais paciência e resignação, quanto age tendo em vista uma felicidade mais sólida e mais durável que o espera.”
II. I. II. – DO SUICÍDIO DIRETO
Para falar sobre o suicídio direto e suas consequências utilizaremos o livro: MEMÓRIAS DE UM SUICIDA, psicografia de YVONNE A. PEREIRA, pelo Espírito CAMILO CÂNDIDO BOTELHO, pseudônimo adotado pelo português CAMILO CASTELO BRANCO (que foi um famoso escritor romancista, cronista, crítico, dramaturgo, historiador, poeta e tradutor, era uma personalidade conhecida tanto em Portugal quanto no Brasil), que conta o sobre o suicídio que cometeu, aos 65 anos de idade, ao disparar um tiro contra o próprio ouvido direito no ano de 1890, após receber a notícia que a cegueira que o acometia seria irreversível, e as consequências no plano espiritual. Na PRIMEIRA PARTE, descreve os sofrimentos experimentados pelos que se suicidam e na SEGUNDA e na TERCEIRA PARTES narra os trabalhos de assistência e de preparação para uma nova encarnação.
Na INTRODUÇÃO da obra Yvonne Pereira conta que as páginas deste livro (MEMÓRIAS DE UM SUICIDA) não foram psicografadas, ela em desdobramento, via e ouvia as cenas descritas no livro (MEMÓRIAS DE UM SUICIDA), observava as personagens, os locais, com clareza e certeza absolutas, como se os visitasse e a tudo estivesse presente e não como se apenas obtivesse notícias através de simples narrativas e daí ao despertar Yvonne escrevia tudo aquilo que tinha visto em desdobramento.
Na PRIMEIRA PARTE – intitulada “OS RÉPROBOS”, temos o CAPÍTULO I – “O VALE DOS SUICIDAS” e no CAPÍTULO II – “OS RÉPROBOS”, Camilo nos conta que as primeiras horas que se seguiram ao suicídio passaram-se sem que ele pudesse dar acordo de si mesmo. É como se desmaiasse, e depois, pouco a pouco sentia-se acordando das sombras confusas. Sentia muito frio, como se vestisse vestes de gelo, sentia falta de ar, todavia, sentia odores fétidos, dor aguda no corpo inteiro, principalmente localizada particularmente no cérebro e no ouvido direito, donde o sangue corria do orifício causado pelo projétil da arma de fogo de que se servira para cometer o suicídio.
Camilo sentia-se cego e entendia-se ferido e não morto, porque a vida continuava, como antes do suicídio, para seu desespero, o ferimento que produzira em si mesmo não fora suficiente, aumentando assim os já tão grandes sofrimentos.
Camilo reviu sua vida em retrospecto, sentia-se vivo, supôs estar preso a um leito de hospital, ou em sua própria casa, mas como nada via, não reconhecia onde se encontrava, a solidão o angustiava, bradou por seus familiares, por amigos, médicos, enfermeiros e nada apenas silêncio. Sentia fome e sede.
Depois de algumas horas assim, para seu espanto, começou a ouvir um vozerio ensurdecedor, um coro de vozes como se fosse uma assembleia de loucos, as vozes não conversavam entre si, mas, queixavam-se, lamentavam-se, reclamavam, gritavam, gemiam, choravam desesperadamente com súplicas de socorro.
Camilo sentiu estranhos empurrões, como se fosse puxado por este vozerio e sentiu tanto terror que se mexeu com intuito de ir para local onde não ouvisse mais estas vozes. Tateando nas trevas tentou caminhar, todavia tropeçou num monte de destroços e, instintivamente, curvou-se para o chão, então, repentinamente, a loucura apoderou-se de Camilo que começou a gritar e uivar enfurecido, tal como o vozerio do qual tentava fugir, pois percebeu que aquele monte de escombros era nada menos do que a terra de uma cova recentemente fechada, Camilo viu que estava num Cemitério e passou a se perguntar por que estava ali? E sua própria consciência lhe respondeu: “não quiseste o suicídio?…Pois aí o tens...”
E neste momento Camilo vê-se, a si próprio, como à frente de um espelho, morto estirado num caixão em estado de decomposição, no fundo de uma sepultura, justamente aquela sobre a qual acabara de tropeçar. Fugiu aterrorizado, querendo se ocultar de si mesmo, enquanto gargalhadas estrondosas explodiam atrás de Camilo e o coro de vozes perseguia seus ouvidos para onde quer que ele se refugiasse.
Camilo fugindo, reproduziu a cena do suicídio mentalmente, como se por uma segunda vez buscasse morrer a fim de desaparecer. E nesta fuga correu e ia entrando em todas as portas que encontrava abertas, mas era enxotado a pedradas, sem conseguir distinguir quem as dirigia. Até que foi até sua casa, e lá seus objetos não estavam da forma como ele sempre os deixara, o que muito o enfureceu. Sentiu-se estranho em sua própria casa, procurou amigos e parentes e todos lhes foram indiferentes; foi então a consultórios médicos, tentou fixar-se em hospitais, mas todos foram indiferentes, Camilo disse que “ninguém me concedeu sequer o favor de um olhar” (pág. 48).
Sem conseguir encontrar local para se estabilizar, a fim de obter conforto e alívio, Camilo passou a sentir que lhe faltava alguma coisa, se sentia incompleto, sentia-se atraído para algo que perdera, e esta coisa lhe atraía com uma força de um ímã, com uma tão profunda afinidade, que não sendo possível fixar-se em nenhum local, atraído foi para a “coisa”, que era o seu corpo, o seu cadáver, Camilo voltou ao Cemitério.
Lá Camilo ficou vagando por dois meses, sofrendo, sendo perseguido por entidades perversas da erraticidade, que armavam ciladas para escravizar os suicidas, para deles se servirem para obsessões de influenciações letais; sendo que ao dobrar uma esquina Camilo deparou-se com uma multidão de cerca de 200 individualidades de ambos os sexos, que era a mesma do coro sinistro que tanto atemorizava Camilo, e viu-se envolvido pela mesma e foi levado de roldão, empurrado e arrastado, contra sua vontade, e percebeu que esta multidão estava sendo conduzida por um grupo de soldados, com cavalos e lanças afiadas.
Camilo protestou disse que não era criminoso, e se identificou, declarando seus títulos e qualidades, mas os cavaleiros não o ouviam, eram silenciosos, mudos e marchavam levando a multidão. A caminhada foi longa, caminharam por um vale profundo, no qual cavernas surgiam, montanhas sombrias, e todas numeradas, tratava-se de uma cidade em que as cavernas eram as habitações; não se distinguia terreno, senão pedras, lamaçais ou pântanos (planície inundada por águas paradas), andaram até chegar numa praça encharcada como um pântano, e os soldados os deixaram ali e foram embora. Era o Vale dos Suicidas.
Camilo se suicidou porque ficou cego. E em espírito se supunha cego, no entanto enxergava todas as torpezas, as tristezas, as aflições, mas não conseguia ver a luz do Sol, e o azul do firmamento (pág. 51), sua cegueira espiritual decorria da consciência culpada (pág. 65).
Ou seja, Camilo sugestionava-se de que era cego, e, como tal, se conservava, não obstante sua cegueira só se definir, em verdade, pela inferioridade moral do Espírito distanciado da Luz. Ao Camilo cego não passaria, contudo, despercebido o que se apresentasse mal, feio, sinistro, imoral, obsceno, pois conservavam seus olhos visão bastante para toda essa escória contemplar – agravando-se sua infelicidade.
O VALE DOS SUICIDAS, que era composto de vales profundos, o solo coberto de matérias enegrecidas e fétidas lembrando a fuligem, era imundo, pastoso, escorregadio, repugnante! O ar pesadíssimo, asfixiante, gelado, o céu anoitecido com enormes nuvens, como se eternas tempestades rugissem em torno; e ao respirarem tal ar, os Espíritos ali presos sufocavam-se. Não havia ali, nem paz, nem consolo, nem esperança: tudo estava marcado pela desgraça, pela miséria, pelo desespero e horror.
No Livro é feita uma comparação do VALE DOS SUICIDAS com o VALE DOS LEPROSOS (que era o lugar repulsivo da antiga Jerusalém, que evocava o último grau da degração e do sofrimento), dizendo que o VALE DOS LEPROSOS seria consolador estágio de repouso se comparado ao VALE DOS SUICIDAS.
Pois, no VALE DOS LEPROSOS, pelo menos, existia a solidariedade entre os renegados! Os de sexo diferente chegavam mesmo a se amar! Adotavam-se em boas amizades, irmanando-se no seio da dor para suavizá-la! Criavam a sua sociedade, divertiam-se, prestavam-se favores, dormiam e sonhavam que eram felizes! No VALE DOS LEPROSOS havia a magnitude compensadora do Sol para fortificar e revigorar os corações! Existia o ar fresco das madrugadas com seus orvalhos regeneradores! Poderia o banido da sociedade ali detido contemplar o céu azul… o poético clarear da lua cheia, as estrelas, e tudo isso era como dádivas celestiais para reconciliá-lo com Deus, fornecendo-lhe tréguas na desgraça.
Mas, no VALE DOS SUICIDAS, verdadeiro presídio, nada disso era possível, porque as lágrimas que ali se choravam eram demais ardentes para se permitirem outras atenções que não fossem as derivadas da sua própria intensidade! É a dor que nada consola, a desgraça que nenhum favor ameniza. Não há céu azul, não há luz, não há sol, não há perfume, não há tréguas! O que há é o choro revoltado e inconsolável dos suicidas que nunca se harmonizam! É o assombroso “ranger de dentes nas trevas exteriores“. O que há é a raiva e o desaponto, porque se sente vivo a despeito de se haver arrojado na morte! É a revolta, a praga, o insulto. O que há é o inferno, na mais dramática exposição, porque, além do mais, existem cenas repulsivas de animalidade, práticas abjetas (desprezíveis) dos mais sórdidos (repugnante) instintos.
Após a morte, antes que o Espírito se oriente, gravitando para o verdadeiro “lar espiritual” que lhe cabe, será sempre necessário o estágio numa “antecâmara“, numa região cuja densidade e aflitivas configurações locais corresponderão aos estados vibratórios e mentais do recém-desencarnado. Aí se deterá até que se desfaça dos fluidos e forças vitais de que são impregnados todos os corpos materiais.
EM SE TRATANDO DE SUICIDAS ESTES AÍ SE DEMORARÃO, GERALMENTE, O TEMPO QUE AINDA LHES RESTAVA PARA CONCLUSÃO DO COMPROMISSO DA EXISTÊNCIA QUE PREMATURAMENTE CORTARAM. Ou seja, permanecerão no Vale dos Suicidas até se despojarem das forças vitais que se encontram revestindo-lhes os envoltórios físico-espirituais. Para tais infelizes um só bálsamo existe: a prece das almas caritativas!
Observação: Na SEGUNDA PARTE do livro MEMÓRIAS DE UM SUICIDA, intitulada “OS DEPARTAMENTOS”, no Capítulo I, “A Torre de Vigia”, contém o ensinamento, nas págs. 260/261, de que sempre que um suicida tiver extinguido ou mesmo aliviado o carregamento de vitalidade animalizada – esteja ele sinceramente arrependido ou não – o mesmo será socorrido; pelo serviço de socorro da Vigilância, o qual partirá imediatamente ao seu encontro, trazendo-o para a guarda da Legião dos Servos de Maria. Então, tal seja a sua condição moral – arrependido, revoltado, endurecido – será encaminhado por aquele Departamento ao local que lhe competir: – o Hospital, o Isolamento, o Manicômio.
SE, POR MUITO LONGO, ESSE ESTÁGIO NO VALE DOS SUICIDAS PARA SE DESPOJAREM DAS FORÇAS VITAIS QUE SE ENCONTRAM, exorbite das medidas normais ao caso – a reencarnação imediata será a terapêutica indicada, embora amarga e dolorosa; o que será preferível a muitos anos em tão desgraçada situação, assim se completando, então, o tempo que faltava ao término da existência cortada.
Incluímos aqui importante esclarecimento prestado na SEGUNDA PARTE do livro “MEMÓRIAS DE UM SUICIDA”, no Capítulo I: “A TORRE DE VIGIA”, págs. 231/268, que nos casos em que a vida interrompida deveria ser longa, a Misericórdia de Deus encaminha para a reencarnação imediata:
“( . . . ) tais casos, tidos como os mais graves, a reencarnações imediatas onde o delinquente completará o tempo que lhe faltava para o término da existência que cortou. Conquanto muito dolorosas, mesmo anormais, tais reencarnações serão preferíveis às desesperações de além-túmulo, evitando, ao demais, grande perda de tempo ao paciente. Veremos então homens deformados, mudos, surdos, débeis mentais, idiotas ou retardos de nascença, etc. É um caso de vibrações, tão-somente. O perispírito não teve forças vibratórias para modelar a nova forma corpórea, a despeito do auxilio recebido dos técnicos do mundo Invisível. Assim concluirão o tempo que lhes faltava para o compromisso da existência prematuramente cortada, corrigirão os distúrbios vibratórios e, logicamente, sentir-se-ão aliviados. Trata-se de uma terapêutica, nada mais, recursos extremos exigidos pela calamidade da situação. É o único, aliás, para os casosem que a vida interrompida deveria ser longa. Ó vós que ledes estas páginas! Quando encontrardes pelas ruas um irmão vosso assim anormalizado, não pejeis (acanheis) de orar em presença dele: vossas vibrações harmoniosas serão também excelente terapêutica!”
Os suicidas que temporariamente permanecem no VALE DOS SUICIDAS são provindos, preferentemente, de Portugal, da Espanha, do Brasil e colônias portuguesas da África.
Camilo, era dotado de grande sensibilidade, para maior mal tinha-a agora como superexcitada, o que o levava a experimentar também os sofrimentos dos outros, seus compares, fenômeno esse ocasionado pelas correntes mentais que se despejavam sobre toda a falange e oriundas dela própria, que assim realizava impressionante afinidade de classe. O que é o mesmo que asseverar que sofriam, também, as sugestões dos sofrimentos uns dos outros, além das angústias a que os submetiam os seus próprios sofrimentos.
Às vezes, conflitos brutais se verificavam pelos becos lamacentos onde se enfileiravam as cavernas que serviam de domicílio. Constantemente irritados, por motivos insignificantes atiravam-se uns contra os outros em lutas corporais violentas, nas quais, levava sempre o melhor aquele que tivesse maior destreza e truculência. Camilo narra que frequentemente era ali insultado, ridicularizado nos seus sentimentos mais caros o que lhe revoltava até o âmago; apedrejado e espancado até que, excitado por fobia idêntica, ele se atirava a represálias selvagens, lutando com eles na lama.
Sentiam como se tivessem o seu corpo carnal, e de forma ainda mais aguçada: fome, sede, frio congelante, fadiga, insônia, exigências físicas martirizantes; a promiscuidade, muito vexatória, de Espíritos que foram homens e mulheres; sofriam com as tempestades constantes, inundações mesmo, a lama, o fétido, as sombras que nunca acabavam, a desesperança, o supremo desconforto físico e moral – eis o panorama por assim dizer “material” que emoldurava os mais pungentes padecimentos morais dos suicidas!
Nem mesmo sonhar com o Belo, ou ter recordações beneficentes era concedido, pois naquele ambiente superlotado de males o pensamento jazia encarcerado nas amarguras, só podendo emitir vibrações que se afinassem ao tono da própria perversidade local. De forma que não havia ninguém que pudesse atingir um instante de serenidade e reflexão para se lembrar de Deus e bradar por Sua paternal misericórdia!
Não se sabia quando era dia ou quando voltava a noite, porque sombras perenes (eternas, perpétuas) rodeavam as horas. Perderam a noção do tempo, e o desânimo e o desespero decorrentes do suicídio lhes davam a certeza de que tal estado de coisas seria eterno. Igualmente ignoravam em que local se encontravam. Tentavam, aflitos, fugir do local para voltarem aos seus lares, e o faziam em desabaladas e insanas correrias de loucos furiosos, só que como ímãs poderosos eram atraídos de volta ao VALE DOS SUICIDAS.
De outras vezes, tateando nas sombras, os suicidas iam, por entre gargantas, vielas e becos, sem lograrem indício de saída… Cavernas, sempre cavernas – todas numeradas; ou longos espaços pantanosos quais lagos lodosos circulados de muralhas abruptas, que lhes afiguravam levantadas em pedra e ferro, como se eles tivessem sido sepultados vivos nas profundas tenebrosidades de algum vulcão! Era um labirinto onde se perdiam sem conseguirem jamais alcançar o fim! A mais vulgar impressão era de que se encontravam encarcerados no subsolo, em presídio cavado no seio da Terra, nas entranhas de uma cordilheira, da qual fizesse parte também algum vulcão extinto.
Como se fantásticos espelhos perseguissem obsessoramente suas faculdades, lá se reproduzia a visão do corpo a se decompor sob o ataque de milhões de vermes vorazes, viam seus corpos se deteriorando lentamente. E sentiam as dores em suas configurações astrais das picadas dos vermes! Por se encontrar o perispírito ainda provido de abundantes forças vitais, no mesmo se refletia o que ocorria no corpo físico, e isto enfurecia os suicidas até à demência.
E, nesta situação, os suicidas se julgavam à frente do Tribunal dos infernos e os obsessores (os mesmos que haviam alimentado nas mentes dos suicidas a ideia do suicídio) se apresentavam como juízes e os julgavam e condenavam. Submetiam os suicidas a vexames e violências. E tais obsessores eram, em verdade, Espíritos que também foram homens que viveram no crime, sensuais, alcoólatras, devassos, hipócritas, sedutores, assassinos perversos, caluniadores, enfim, falange maléfica.
Camilo descreve que os suicidas tinham aparência repulsiva, com fisionomias alarmadas pelo horror, desfigurados, desalinhados, seriam mesmo irreconhecíveis por aqueles mesmos que os amassem; todos com vestes empastadas de lodo das sepulturas, com feições alteradas e doloridas estampando a marca do gênero de suicídio. Os suicidas ficavam em cacoetes (gestos, trejeitos ou hábitos corporais feios) nervosos rememorando o suicídio cometido, julgando-se, de momento a momento, envolvidos em chamas e apavorando-se com o fogo, tentando livrar o pescoço da corda, tentavam estancar o sangue, que jorrava, etc.
O pensamento é criador, e, portanto, fabrica, corporifica e retém imagens! A mente edifica e produz. E cada um dos suicidas retendo com as forças mentais o momento do suicídio, criavam os cenários e as respectivas cenas derradeiras, tais cenas eram refletidas ao derredor de cada um, de modo que se deparavam, aqui e ali forças erguidas balançando o corpo do próprio suicida que evocava a hora da morte voluntária. Ou seja, retratavam, sem cessar o episódio, pondo à visão dos companheiros afins suas hediondas recordações.
Rios caudalosos e mesmo trechos alongados de oceano surgiam repentinamente no meio daquelas vielas sombrias: era meia dúzia de réprobos (que foram excluídos da sociedade) que passava enlouquecida, deixando à mostra cenas de afogamento, por arrastarem na mente a trágica lembrança de quando se atiraram às suas águas!… Homens e mulheres transitavam desesperados: uns ensanguentados, outros estorcendo-se no suplício das dores pelo envenenamento, e, o que era pior, deixando à mostra o reflexo das entranhas carnais corroídas pelo tóxico ingerido, enquanto outros mais, incendiados, a gritarem por socorro em correrias insensatas, traziam pânico ainda maior entre os companheiros de desgraça, os quais receavam queimar-se ao seu contacto, todos possuídos de loucura coletiva!
E coroando a intensidade desses martírios – as penas morais: os remorsos, as saudades dos seres amados, dos quais se não tinham notícias, os mesmos dissabores que haviam dado causa ao desespero e que persistiam em afligir!… E as penas físico-materiais: a fome, o frio, a sede, exigências fisiológicas em geral, torturantes, a fadiga, a insônia depressora, a fraqueza, a visão do cadáver apodrecendo, seus fétidos asquerosos, a repercussão, na mente excitada, dos vermes a consumirem o lodo carnal, fazendo que o suicida se supusesse igualmente atacado de podridão!
E os suicidas traziam, pendente de si, fragmentos despedaçados de cordão luminoso fosforescente, qual um cabo de fios elétricos arrebentados, a desprenderem fluidos. É o cordão fluídico-magnético, que liga a alma ao envoltório carnal e lhe comunica a vida, e somente se separa do corpo por ocasião da morte natural.
No entanto, com o suicídio, o cordão fluídico-magnético foi partido e não desligado, foi despedaçado, contendo ainda muito vigor fluídico-magnético. Portanto, uma vez que a reserva de forças magnéticas não se havia extinguido ainda, isto leva o suicida a sentir-se um “morto-vivo”.
E tal situação prolonga-se até que as reservas de forças vitais e magnéticas se esgotem, o que varia segundo o grau de vitalidade de cada um. De forma que, o VALE DOS SUICIDAS é apenas um estágio temporário, sendo o suicida para lá encaminhado por movimento de impulsão natural, com o qual se afina, até que se desagreguem dele os fluidos vitais que lhe revestiam a organização física, adaptadas ao perispírito, para, só então, obter possibilidade vibratória que lhe faculte alívio e progresso.
E além disto, tal seja a feição do seu caráter, tais os deméritos e grau de responsabilidades gerais – tal será o agravo da situação, tal a intensidade dos padecimentos a experimentar, pois, nestes casos, não serão apenas as consequências decepcionantes do suicídio que lhe afligirão a alma, mas também o reverso dos atos pecaminosos anteriormente cometidos.
Todavia, sobrepondo-se a tudo isto existia e existe a misericórdia do Deus Altíssimo, do Pai justo e bom que “não quer a morte do pecador, mas que ele viva e se arrependa” (Ezequiel, 33:11).
Um dia, profundo esgotamento sucedeu em Camilo e grande fraqueza o colocou como que desfalecido, a urgência de repouso o fazia desmaiar frequentemente, obrigando-o ao recolhimento em sua caverna. E não se tinham passado, porém, sequer vinte e quatro horas desde que o novo estado o surpreendera, quando os servos de Maria chegaram ao Vale dos Suicidas.
Os Servos de Maria, periodicamente, vinham ao Vale dos Suicidas em caravanas à procura daqueles suicidas cujos fluidos vitais tinham sido desagregados, permitindo-se, assim, a locomoção para as camadas do Invisível intermediário, ou de transição. Eram Espíritos que se materializarem o suficiente para se tornarem plenamente percebidos à precária visão dos suicidas e infundiam confiança no socorro que davam. Entravam aqui e ali, pelo interior das cavernas habitadas, examinando seus ocupantes e retiravam os que apresentassem condições de poderem ser socorridos. Voz grave e dominante, de alguém invisível que falasse pairando no ar, guiava-os no caridoso afã, esclarecendo detalhes ou desfazendo confusões momentaneamente suscitadas. A mesma voz fazia a chamada dos prisioneiros a serem socorridos, proferindo seus nomes próprios, o que fazia que se apresentassem, sem a necessidade de serem procurados, aqueles que se encontrassem em melhores condições, facilitando o serviço dos caravaneiros.
Outros, porém, que não se apresentavam a tempo eram procurados pelos socorristas. Mas a voz indicava o lugar exato em que estariam os suicidas, dizendo: Abrigo número tal… Rua número tal… Ou, conforme a circunstância: – Dementado… Inconsciente… Não se encontra no abrigo… Vagando em tal rua… Não atenderá pelo nome… Reconhecível por esta ou aquela particularidade… Os obreiros da Fraternidade consultavam um mapa, iam rapidamente ao local indicado e traziam os mencionados, alguns carregados em seus braços generosos, outros em padiolas…
De súbito ressoou a chamada o nome de Camilo, em seguida, ouviram-se os nomes dos quatro companheiros que com Camilo se achavam presentes na praça (Abrigo número 36 da rua número 48 – Atenção!… Abrigo número 36 – Ingressar no comboio de socorro – Atenção!… – Camilo Cândido Botelho – Belarmino de Queiroz e Souza – Jerônimo de Araújo Silveira – João d’Azevedo – Mário Sobral).
Depois de rigorosa busca, saiam do vale dos Suicidas defendidos por lanceiros hindus. Em vão clamavam por socorro os que se sentiam preteridos, incapacitados de compreenderem que, se assim sucedia, era porque nem todos se encontravam em condições vibratórias para emigrarem para regiões menos hostis. Em vão suplicavam justiça e compaixão ou se agitavam revoltados, exigindo que os deixassem também seguir com os demais. Não respondiam os caravaneiros com um gesto sequer; e se algum mais desgraçado ou audacioso tentasse assaltar as viaturas a fim de atingi-las e nelas ingressar, dez, vinte lanças faziam-no recuar, interceptando-lhe a passagem. Então, um coro hediondo de uivos e choro sinistros, de pragas e gargalhadas satânicas repercutia longa e dolorosamente pelas ruas lamacentas, parecendo que loucura coletiva atacara os míseros detentos, elevando suas raivas ao incompreensível no linguajar humano!
E assim ficavam… quanto tempo?… Oh! Deus piedoso! Quanto tempo?…Até que suas inimagináveis condições de suicidas, de mortos-vivos, lhes permitissem também a transferência para localidade menos trágica…
Camilo entrou no carro e nas portas de entrada lia-se a legenda: Legião dos Servos de Maria. Afastava-se o veículo… A pouco e pouco a cerração de cinzas se ia dissipando aos olhos de Camilo torturados, durante tantos anos, pela mais cruciante das cegueiras: – a da consciência culpada! O nevoeiro de sombras ficava para trás e agora as estradas eram amplas e retas, a se perderem de vista… A atmosfera fazia-se branca como neve… “Deus Misericordioso!… Havíamos deixado o Vale Sinistro!… Comovido e pávido (assustado), pude, então, elevar o pensamento à Fonte Imortal do Bem Eterno, para humildemente agradecer a grande mercê (graça, benefício) que recebia”.
Camilo Cândido Botelho é conduzido ao “HOSPITAL MARIA DE NAZARÉ” e o Livro segue contando a experiência de Camilo e de outros suicidas.
III. – DAS REGIÕES ONDE FICAM OS SUICIDAS E DA UTILIZAÇÃO DOS SUICIDAS PARA A INDUÇÃO AO SUICÍDIO DE ENCARNADOS
No livro “MEMÓRIAS DE UM SUICIDA“, na SEGUNDA PARTE, intitulada “OS DEPARTAMENTOS”, Capítulo I – “A TORRE DE VIGIA”, págs. 231/268, nos ensina que nem todos os suicidas são levados para o Vale:
“Há no entanto aqueles que são aprisionados, ou seduzidos e desencaminhados, antes de atingirem o Vale, por maltas de obsessores, que, às vezes, também foram suicidas, ou mistificadores, entidades perversas e criminosas, cujo prazer é a prática de vilezas, escória do mundo invisível desnorteada pelas próprias maldades, que continuam vivendo na Terra ao lado dos homens, contaminando a sociedade e os lares terrenos que lhes não oferecem resistência através da vigilância dos bons pensamentos e prudentes ações, infelicitando criaturas incautas (imprudentes) que lhes fornecem acesso com a própria inferioridade moral e mental!
( . . . )
Porque não disponham de poderes espirituais verdadeiros, esses infelizes, que vivem divorciados da luz do Bem e do Amor ao próximo, aquartelam-se, geralmente, em locais pavorosos e sinistros da própria Terra, – afinados com seus estados mentais, tais como o seio das florestas tenebrosas, catacumbas abandonadas dos cemitérios, cavernas solitárias de montanhas muitas vezes desconhecidas dos homens e até antros sombrios de rochedos marinhos e crateras de vulcões extintos.
Hipócritas e mentirosos, fazem crer às suas vítimas serem tais regiões obras suas, construídas pelo poder de suas capacidades, pois invejam as Colônias regeneradoras dirigidas pelas entidades iluminadas, e, aprisionando-as, torturam-nas por todas as formas, desde a aplicação dos maus tratos “físicos” e da obscenidade, até a criação da loucura para suas mentes já incendidas (estimuladas) pela profundidade dos sofrimentos que lhes eram pessoais; infligem-lhes suplícios, finalmente, cuja concepção ultrapassa a possibilidade de raciocínio das vossas mentes, e cuja visão não suportaríeis por ainda serdes demasiadamente fracos para vos isolardes das pesadas sugestões que sobre vós cairiam, capazes de vos levarem a adoecer!
Mas… aos trabalhadores especializados, iluminados por um excelente progresso, nada afeta! São imunizados, dominam o próprio horror a que assistem com as forças mentais e vibratórias de que dispõem, e até às mais estranhas regiões do globo descem as lentes dos seus telescópios magnéticos, da sua televisão poderosa, assim como a solicitude dos seus elevados pensamentos de fraternidade cristã… E vão à procura da alma superatribulada dos desgraçados que se viram duplamente desviados da rota lógica do destino, pelo próprio ato do suicídio e pela afinidade inferior que os arrastou à junção com o elemento da mais baixa espécie existente no Invisível!”
E sobre A UTILIZAÇÃO DOS SUICIDAS PARA INDUÇÃO DE ENCARNADOS AO SUICÍDIO, temos os esclarecimentos prestados por mensagem descrita na Revista REFORMADOR, de Agosto de 2010, ditada pelo Espírito de Yvonne Pereira, psicografia de Marta Antunes de Moura: “A FORÇA DO AMOR”, a saber:
“As regiões de sofrimento onde vivem os suicidas, de todas as categorias, são inúmeras e vastas nos planos do Espírito. Brotam de um dia para o outro, pois os excessos da Humanidade têm reduzido o tempo de reencarnação para um número significativo de pessoas. Os atentados contra a manutenção da saúde física, mental e psicológica atingem cifras realmente assustadoras.
(. . . )
Localizamos em determinado nicho (reentrância ou vão), em nosso plano, uma comunidade de suicidas vivendo em situação precária, em todos os aspectos. Chamava a nossa atenção que tal reduto (espaço fechado) de dor nunca reduzia de tamanho. Ao contrário, contabilizávamos um número crescente, dia após dia. Procurando analisar a problemática por todos os seus ângulos, verificamos que no local, incrustado (enraizado) em espaço de difícil acesso, existia uma espécie de ‘escola’ – se este é o nome que se pode utilizar – cujos integrantes se especializaram em indução ao suicídio: técnicas, recursos e equipamentos sofisticados eram desenvolvidos para que encarnados cometessem suicídio.
O suicida era, então, conduzido à instituição e, sob tortura, a alma sofredora fornecia elementos mentais que serviam de alimento à manutenção de diferentes desarmonias que conduzem o homem ao desespero.
Fomos surpreendidos pela existência de tal organização e estarrecidos diante do fato, de como a alienação, associada à maldade, pode desestruturar o ser humano.
(. . .)
Desfazer a organização não representaria, em princípio, maiores problemas; o desafio seria convencer os instrutores a não fazer mais aquele tipo de maldade. Várias tentativas foram envidadas (empenhadas), neste sentido. Orientadores esclarecidos da Vida maior foram rejeitados e até ridicularizados. Nada conseguimos com os dirigentes daquela instituição voltada para a prática do suicídio.
Mas, a vitória chegou, gloriosa, no final da tarde do domingo último, quando convidados a participar do encerramento do Congresso (3° Congresso Espírita Brasileiro, em 18/04/2010), aqueles dirigentes presenciaram a luminosidade do amor. Conseguiram finalmente ver o significado da vida, a sua importância e fundamentos.
( . . . )
Jesus tinha se aproximado do Planeta, em brevíssima visita de luz, amor e compaixão.
Jamais presenciei tanta beleza e tanta paz!”
(Artigo: “A FORÇA DO AMOR”, Revista REFORMADOR, de Agosto de 2010, ditada pelo Espírito de Yvonne Pereira, psicografia de Marta Antunes de Moura)
Novamente no livro “MEMÓRIAS DE UM SUICIDA”, na SEGUNDA PARTE, intitulado “OS DEPARTAMENTOS”, Capítulo III – “O MANICÔMIO”, págs. 299/332, Camilo nos conta que, com finalidade de instrução, fez visita juntamente com outros suicidas no Manicômio que fazia parte do Departamento Hospitalar (Hospital Maria de Nazaré) da COLÔNIA CORRECIONAL DA LEGIÃO DOS SERVOS DE MARIA, onde foram esclarecidos pelo diretor do Manicômio, o Irmão João, que os suicidas lá tratados eram:
“portadores dos mais nefandos (execráveis) perigos – não só para homens encarnados, mas até para Espíritos não ainda imunizados pelas atitudes mentais sadias e vigorosas -, razão pela qual temo-los separados de vós outros, mantendo-os isolados. Seus deploráveis estados vibratórios, rebaixados a nível superlativo de depressão e inferioridade, são de tal sorte prejudiciais que, se se aproximassem de um homem encarnado, junto dele permanecendo vinte e quatro horas, e se esse homem, ignorante em assuntos psíquicos, lhes oferecesse analogias mentais, prestando-se à passividade para o domínio das sugestões, poderia suceder que o levassem ao suicídio, inconscientes de que o faziam, ou o prostrassem (debilitassem) gravemente enfermo, alucinado, mesmo louco! Junto a uma criança poderão matá-la de um mal súbito, se o pequenino ser não tiver ao redor de si alguém que, por disposições naturais, para si atraia tão perniciosas irradiações, ou uma terapêutica espiritual imediata, que o salvaguarde do funesto contágio, que, no caso, será o efeito lógico de uma peste que se propagou…”
(. . . )
Através da higienização mental, no reajustamento dos sentimentos à prática do verdadeiro Bem, assim como no cumprimento do Dever; nas harmoniosas vibrações originadas da comunhão da mente com a Luz que do Alto irradia em tonos de beneficência para aqueles que a buscam, poderá a individualidade encarnada imunizar-se de tal contágio, (. . . )
Para aquele que se deixou vencer pelo assédio da entidade desencarnada, os males daí resultantes serão a consequência da invigilância, da inferioridade de costumes e sentimentos, do acervo de atitudes mentais subalternas, do alheamento da ideia de Deus, em que se prefere estagnar, esquecido de que a ideia de Deus é o manancial imarcescível (inalterável) a fornecer elementos imprescindíveis ao bem-estar, à vitória, em qualquer setor em que se movimente a criatura! Para o causador “inconsciente” do mal positivado, será o demérito de um ônus a mais, derivado do seu ato de suicídio, e cuja responsabilidade irá juntar-se às demais que o sobrecarregam…”
IV. – DO TRAÇO COMUM AOS SUICÍDIOS:
IV. I. – O SUICIDA COMETE O ATO EXTREMO EM LOCAL QUE SERÁ ENCONTRADO
Allan Kardec, na REVISTA ESPÍRITA de 1862, no artigo “ESTATÍSTICA DOS SUICÍDIOS”, do mês de julho, comentou um traço comum aos suicídios é que aquele que se suicida faz isto em local onde sempre será encontrado, a saber:
”Faremos notar, de passagem, um traço característico do suicídio, é que os atos dessa natureza, realizado em lugares completamente isolados e desabitados, são excessivamente raros; o homem perdido no deserto ou sobre o Oceano, morrerá de privações, mas não se suicidará, então mesmo que não espere nenhum socorro.
Aquele que quer deixar voluntariamente a vida aproveita bem o momento em que está só para não ser detido em seu desígnio, mas o faz de preferência nos centros de população, onde seu corpo tem pelo menos alguma chance de ser encontrado. Tal se lançará do alto de um monumento no centro de uma cidade, que não o fará do alto de um rochedo à beira-mar, onde todo traço seu estará perdido; tal outro se dependurará nas árvores de Boulogne (grande parque público localizado em Paris), e não irá fazê-lo numa floresta onde ninguém passe.
O suicida quer muito não ser impedido, mas deseja que se saiba, cedo ou tarde, que se suicidou; parece-lhe que essa lembrança dos homens o liga ao mundo que quis deixar, tanto é verdade que a idéia do nada absoluto tem alguma coisa mais terrível do que a própria morte.”
(REVISTA ESPÍRITA — ANO V — JULHO DE 1862, “ESTATÍSTICA DOS SUICÍDIOS”)
IV. II. – O SUICIDA SENTE DESGOSTO/DECEPÇÃO PORQUE DESCOBRE QUE CONTINUA VIVO
No Livro ESTANTE DA VIDA – pelo Espírito Irmão X, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Cap. 2, intitulado “DEPOIMENTO”, Humberto de Campos nos traz as respostas de uma mulher que há 14 anos havia se suicidado, se envenenando, tomando formicida, aos 32 anos de idade, deixando o esposo e um filhinho em casa. Ela conta sobre seu suicídio, o que sentiu, desde o traslado do corpo, autópsia, enterro, rompimento do cordão magnético, até o aprisionamento e os abusos de toda ordem sofrida por obsessores, vejamos abaixo:
“(…) não era pessoa de cultura excepcional, do ponto de vista de cérebro, mas caracterizava-se, na Terra, por nobres qualidades morais, moça tímida, honesta, operosa, de instrução regular e extremamente devotada aos deveres de esposa e mãe.
Passemos, no entanto, às suas onze questões e vejamos as respostas que ela nos deu e que transcrevo, na íntegra:
A irmã possuía alguma fé religiosa, que lhe desse convicção na vida depois da morte?
Seguia a fé religiosa, como acontece a muita gente que acompanha os outros no jeito de crer, na mesma situação com que se atende aos caprichos da moda. Para ser sincera, não admitia fosse encontrar a vida aqui, como a vejo, tão cheia de problemas ou, talvez, mais cheia de problemas que a minha existência no mundo.
Quando sobreveio a morte do corpo, ficou inconsciente ou consciente?
Não conseguia sequer mover um dedo, mas, por motivos que ainda não sei explicar, permaneci completamente lúcida e por muito tempo.
Quais as suas primeiras impressões ao verificar-se desencarnada?
Ao lado de terríveis sofrimentos, um remorso indefinível tomou conta de mim. Ouvia os lamentos de meu marido e de meu filho pequenino, debalde gritando também, a suplicar socorro. Quando o rabecão (veículo que transporta mortos) me arrebatou o corpo imóvel, tentei ficar em casa mas não pude. Tinha a impressão de que eu jazia amarrada ao meu próprio cadáver pelos nós de uma corda grossa. Sentia em mim, num fenômeno de repercussão que não sei definir, todos os baques do corpo ao veículo em correria; atirada com ele a um compartimento do necrotério (local onde ficam os cadáveres à espera de autópsia), chorava de enlouquecer. Depois de poucas horas, notei que alguém me carregava para a mesa de exame. Vi-me desnuda de chofre e tremi de vergonha. Mas a vergonha fundiu-se no terror que passei a experimentar ao ver que dois homens moços me abriam o ventre sem nenhuma cerimônia, embora o respeitoso silêncio com que se davam à pavorosa tarefa. Não sei o que me doía mais, se a dor indescritível que me percorria a forma, em meu novo estado de ser, quando os golpes do instrumento cortante me rasgavam a carne. Mas, o martírio não ficou nesse ponto, porque eu, que horas antes me achava no conforto de meu leito doméstico, tive de aguentar duchas de água fria nas vísceras expostas, como se eu fosse um animal dos que eu vira morrer, quando menina, no sítio de meu pai… Então, clamei ainda mais por socorro, mas ninguém me escutava, nem via…
Recorreu à prece no sofrimento?
Sim, mas orava, à maneira dos loucos desesperados, sem qualquer noção de Deus… Achava-me em franco delírio de angústia, atormentada por dores físicas e mentais… Além disso, para salvar o corpo que eu mesma destruíra, a oração era um recurso de que lançava mão, muito tarde.
Encontrou amigos ou parentes desencarnados, em suas primeiras horas no plano espiritual?
Hoje sei que muitos deles procuravam auxiliar-me, mas inutilmente, porque a minha condição de suicida me punha em plenitude de forças físicas. As energias do corpo abandonado como que me eram devolvidas por ele e me achava tão materializada em minha forma espiritual quanto na forma terrestre. Sentia-me completamente sozinha, desamparada…
Assistiu ao seu próprio enterro?
Com o terror que o meu amigo é capaz de imaginar.
Não havia Espíritos benfeitores no cemitério?
Sim, mas não poderia vê-los. Estava mentalmente cega de dor. Senti-me sob a terra, sempre ligada ao corpo, como alguém a se debater num quarto abafado, lodoso e escuro…
Que aconteceu em seguida?
Até agora, não consigo saber quanto tempo estive na cela do sepulcro (túmulo), seguindo, hora a hora, a decomposição de meus restos… Houve, porém, um instante em que a corda magnética cedeu e me vi libertada. Pus-me de pé sobre a cova. Reconhecia-me fraca, faminta, sedenta, dilacerada… Não havia tomado posse de meus próprios raciocínios, quando me vi cercada por uma turma de homens que, mais tarde, vim a saber serem obsessores cruéis. Deram-me voz de prisão. Um deles me notificou que o suicídio era falta grave, que eu seria julgada em corte de justiça e que não me restava outra saída, senão acompanhá-los ao Tribunal. Obedeci e, para logo, fui por eles encarcerada em tenebrosa furna (caverna), onde pude ouvir o choro de muitas outras vítimas. Esses malfeitores me guardaram em cativeiro e abusavam da minha condição de mulher, sem qualquer noção de respeito ou misericórdia… Somente após muito tempo de oração e remorso, obtive o socorro de Espíritos missionários, que me retiraram do cárcere, depois de enormes dificuldades, a fim de me internarem num campo de tratamento.
Por que razão decidiu matar-se?
Ciúmes de meu esposo, que passara a simpatizar com outra mulher.
Julga que a sua atitude lhe trouxe algum benefício?
Apenas complicações. Após seis anos de ausência, ferida por terríveis saudades, obtive permissão para visitar a residência que eu julgava como sendo minha casa no Rio. Tremenda surpresa!… Em nada adiantara o suplício. Meu esposo, moço ainda, necessitava de companhia e escolhera para segunda esposa a rival que eu abominava… Ele e meu filho estavam sob os cuidados da mulher que suscitava ódio e revolta… Sofri muito em meu orgulho abatido. Desesperei-me. Auxiliada pacientemente, contudo, por instrutores caridosos, adquiri novos princípios de compreensão e conduta… Estou aprendendo agora a converter aversão em amor. Comecei procedendo assim por devotamento ao meu filho, a quem ansiava estender as mãos, e só possuía, no lar, as mãos dela, habilitadas a me prestarem semelhante favor… A pouco e pouco, notei-lhe as qualidades nobres de caráter e coração e hoje a amo, deveras, por irmã de minh’alma… Como pode observar, o suicídio me intensificou a luta íntima e me impôs, de imediato, duras obrigações.
Que aguarda para o futuro?
Tenho fome de esquecimento e de paz. Trabalho de boa vontade em meu próprio burilamento (aperfeiçoamento) e qualquer que seja a provação que me espere, nas corrigendas (correções) que mereço, rogo à Compaixão Divina me permita nascer na Terra, outra vez, quando então conto retornar o ponto de evolução em que estacionei, para consertar as terríveis consequências do erro que cometi.”
IV. III – O SUICIDA SENTIRÁ TENTAÇÃO DE COMETER O SUICÍDIO NOVAMENTE
No livro “MEMÓRIAS DE UM SUICIDA”, de psicografia de Yvonne do Amaral Pereira, pelo autor espiritual Camilo Cândido Botelho, na PRIMEIRA PARTE intitulada “OS RÉPROBOS”, no Capítulo V, denominado “O RECONHECIMENTO”, pág. 163/165, nos fala da tentação que o suicida sentirá de repetir o gesto extremo:
“5 – O Espírito de um suicida voltará a novo corpo terreno em condições muito penosas de sofrimento, agravadas pelas resultantes do grande desequilíbrio que o desesperado gesto provocou no seu corpo astral, isto é, no perispírito.
6 – A volta de um suicida a um novo corpo carnal é a lei. É lei inevitável, irrevogável! É expiação irremediável, à qual terá de se submeter voluntariamente ou não, porque a seu próprio benefício outro recurso não haverá senão a repetição do programa terreno que deixou de executar.
(…)
8 – Na Espiritualidade raramente o suicida permanecerá durante muito tempo. Descerá à reencarnação prestamente (em breve tempo), tal seja o acervo das danosas consequências acarretadas; ou adiará o cumprimento daquela inalienável necessidade caso as circunstâncias atenuantes forneçam capacidade para o ingresso em cursos de aprendizado edificante, que facilitarão as pelejas (combate) futuras a prol de sua mesma reabilitação.
(. . . )
10 – Renascendo em novo corpo carnal, remontará o suicida à programação de trabalhos e prélios (batalha, luta, peleja) diversos aos quais imaginou erradamente poder escapar pelos atalhos do suicídio; experimentará novamente tarefas, provações semelhantes ou absolutamente idênticas às que pretendera arredar; passará inevitavelmente pela tentação do mesmo suicídio, porque ele mesmo se colocou nessa difícil circunstância carreando para a reencarnação expiatória as amargas sequências (continuação) do passado delituoso! A tal tentação, porém, poderá resistir, visto que na Espiritualidade foi devidamente esclarecido, preparado para essa resistência. Se contudo vier a falir por uma segunda vez – o que será improvável – multiplicar-se-á sua responsabilidade, multiplicando-se, por isso mesmo, desastrosamente, as séries de sofrimentos e pelejas (lutas) reabilitadoras, visto que é imortal!
11 – O estado indefinível, de angústia inconsolável, de inquietação aflitiva e tristeza e insatisfações permanentes; as situações anormais que se decalcam (transferem) e sucedem na alma, na mente e na vida de um suicida reencarnado, indescritíveis à compreensão humana e só assimiláveis por ele mesmo, somente lhe permitirão o retorno à normalidade ao findar das causas que as provocaram, após existências expiatórias, testemunhos severos onde seus valores morais serão duramente comprovados, acompanhando-se de lágrimas ininterruptas, realizações nobilitantes (valorosas), renúncias dolorosas de que se não poderá isentar… podendo tão dificultoso labor dele exigir a perseverança de um século de lutas, de dois séculos… talvez mais… tais sejam o grau dos próprios deméritos e as disposições para as refregas justas e inalienáveis!”
No Livro “O CÉU E O INFERNO, OU A JUSTIÇA DIVINA SEGUNDO O ESPIRITISMO”, de Allan Kardec, na SEGUNDA PARTE, que traz exemplos, temos no Capítulo V, intitulado SUICIDAS, duas comunicações de espíritos suicidas que se suicidaram mais de uma vez, é a renovação da mesma prova em sucessivas encarnações, seguem alguns trechos de uma destas evocações:
“FÉLICIEN
Era um homem rico, instruído, poeta de espírito, possuidor de caráter são, obsequioso e ameno, de perfeita honradez.
Falsas especulações comprometeram-lhe a fortuna, e, não lhe sendo possível repará-la em razão da idade avançada, cedeu ao desânimo, enforcando-se em dezembro de 1864, no seu quarto de dormir.
Não era materialista, nem ateu, mas um homem de gênio um tanto superficial, ligando pouca importância ao problema da vida de além-túmulo. Conhecendo-o intimamente, evocamo-lo, quatro meses após o suicídio, inspirados pela simpatia que lhe dedicávamos.
(…)
– P. (ao Espírito). A vossa desencarnação tanto mais nos comoveu, quanto lhe prevíamos as tristes consequências, além da estima e intimidade das nossas relações. Pessoalmente, não me esqueci do quanto éreis obsequioso e bom para comigo. Seria feliz se pudesse testemunhar-vos a minha gratidão, fazendo algo de útil para vós.
– R. Entretanto, eu não podia furtar-me de outro modo aos embaraços da minha posição material. Agora, só tenho necessidade de preces; orai, principalmente, para que me veja livre desses hórridos (horripilantes) companheiros que aqui estão junto de mim, obsidiando-me com gritos, sorrisos e infernais motejos (crítica, desaprovação, zombaria, censura). Eles chamam-me covarde, e com razão, porque é covardia renunciar à vida. É a quarta vez que sucumbo a essa provação, não obstante a formal promessa de não falir… Fatalidade!… Ah! Orai… Que suplício o meu! Quanto sou desgraçado! Orando, fazeis por mim mais que por vos pude fazer quando na Terra; mas a prova, ante a qual fracassei tantas vezes, aí está retraçada, indelével (indestrutível), diante de mim! E preciso tentá-la novamente, em dado tempo… Terei forças? Ah! recomeçar a vida tantas vezes; lutar por tanto tempo para sucumbir aos acontecimentos, é desesperador, mesmo aqui! Eis por que tenho carência de força. Dizem que podemos obtê-la pela prece… Orai por mim, que eu quero orar também.
Nota – Este caso particular de suicídio, posto que realizado em circunstâncias vulgares, apresenta uma feição especial. Ele mostra-nos um Espírito que sucumbiu muitas vezes à provação, que se renova a cada existência e que renovará até que ele tenha forças para resistir. Assim se confirma o fato de não haver proveito no sofrimento, sempre que deixamos de atingir o fim da encarnação, sendo preciso recomeçá-la até que saiamos vitoriosos da campanha.
Ao Espírito do Sr. Félicien. – Ouvi, eu vo-lo peço, ouvi e meditai sobre as minhas palavras. O que denominais fatalidade é apenas a vossa fraqueza, pois se a fatalidade existisse o homem deixaria de ser responsável pelos seus atos.
(. . . )
A vossa provação consistia num encadeamento de circunstâncias que vos deveriam dar, não a necessidade, mas a tentação do suicídio; desgraçadamente, apesar do vosso talento e instrução, não soubestes dominar essas circunstâncias e sofreis agora as consequências da vossa fraqueza.
Essa prova, tal como pressentis com razão, deve renovar-se ainda; na vossa próxima encarnação tereis de enfrentar acontecimentos que vos sugerirão a idéia do suicídio, e sempre assim acontecerá até que de todo tenhais triunfado.
Longe de acusar a sorte, que é a vossa própria obra, admirai a bondade de Deus, que, em vez de condenar irremissivelmente (que não é digno de perdão) pela primeira falta, oferece sempre os meios de repará-la.
Assim, sofrereis, não eternamente, mas por tanto tempo quanto reincidirdes no erro. De vós depende, no estado espiritual, tomar a resolução bastante enérgica de manifestar a Deus um sincero arrependimento, solicitando instantemente (constantemente) o apoio dos bons Espíritos. Voltareis então à Terra, blindado na resistência a todas as tentações. Uma vez alcançada essa vitória, caminhareis na via da felicidade com mais rapidez, visto que sob outros aspectos o vosso progresso é já considerável. Como vedes, há ainda um passo a franquear, para o qual vos auxiliaremos com as nossas preces. Estas só serão improfícuas (não proveitosas) se nos não secundardes com os vossos esforços.
– R. Oh! obrigado! Oh! obrigado por tão boas exortações (advertências). Delas tenho tanto maior necessidade, quanto sou mais desgraçado do que demonstrava. Vou aproveitá-las, garanto, no preparo da próxima encarnação, durante a qual farei todo o possível por não sucumbir. Já me custa suportar o meio ignóbil (desprezível, vil, repugnante) do meu exílio.
Félicien.”
V. – DOS IMPOSITIVOS REAJUSTES EM EXISTÊNCIAS POSTERIORES
O Livro: “RELIGIÃO DOS ESPÍRITOS“, pelo Espírito Emmanuel, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Cap. 48, intitulado “SUICÍDIO”, pág. 121/123, traz comentários feitos por Emmanuel sobre as questões de “O Livro dos Espíritos”, e sobre o SUICÍDIO, Emmanuel comentando a questão 957 nos ensina que:
“No suicídio intencional, sem as atenuantes da moléstia ou da ignorância, há que considerar não somente o problema da infração ante as Leis Divinas, mas também o ato de violência que a criatura comete contra si mesma, através da premeditação mais profunda, com remorso mais amplo.
Atormentada de dor, a consciência desperta no nível de sombra a que se precipitou (arrastou), suportando compulsoriamente as companhias que elegeu para si própria, pelo tempo indispensável à justa renovação.
Contudo, os resultados não se circunscrevem (delimitam) aos fenômenos de sofrimento íntimo, porque surgem os desequilíbrios consequentes nas sinergias (uniões) do corpo espiritual, com impositivos (imposição) de reajuste em existências próximas.
É assim que, após determinado tempo de reeducação, nos círculos de trabalho fronteiriços da Terra, os suicidas são habitualmente reinternados no plano carnal, em regime de hospitalização na cela física, que lhes reflete as penas e angústias na forma de enfermidades e inibições.
Ser-nos-á fácil, desse modo, identificá-los, no berço em que repontam (reencarnam), entremostrando (mostrando incompletamente) a expiação a que se acolhem.
Os que se envenenaram, conforme os tóxicos de que se valeram, renascem trazendo as afecções (doenças) valvulares, os achaques do aparelho digestivo, as doenças do sangue e as disfunções endocrínicas, tanto quanto outros males de etiologia obscura; os que incendiaram a própria carne amargam as agruras da ictiose (doença de pele, com espessamento da epiderme, assemelhando-se às escamas de peixe) ou do pênfigo (Doença da pele que se manifesta por bolhas líquidas que descolam a epiderme); os que se asfixiaram, seja no leito das águas ou nas correntes de gás, exibem os processos mórbidos das vias respiratórias, como no caso do enfisema ou dos cistos pulmonares; os que se enforcaram carreiam consigo os dolorosos distúrbios do sistema nervoso, como sejam as neoplasias (tumores) diversas e a paralisia cerebral infantil; os que estilhaçaram o crânio ou deitaram a própria cabeça sob rodas destruidoras, experimentam desarmonias da mesma espécie, notadamente as que se relacionam com o cretinismo, e os que se atiraram de grande altura reaparecem portando os padecimentos da distrofia muscular (doença em que os músculos enfraquecem progressivamente) progressiva ou da osteíte difusa (inflamação do osso).
Segundo o tipo de suicídio, direto ou indireto, surgem as distonias (distúrbios neurológicos dos movimentos caracterizado por contrações involuntárias) orgânicas derivadas, que correspondem a diversas calamidades congênitas, inclusive a mutilação e o câncer, a surdez e a mudez, a cegueira e a loucura, a representarem terapêutica providencial na cura da alma.
Junto de semelhantes quadros de provação regenerativa, funciona a ciência médica por missionária da redenção, conseguindo ajudar e melhorar os enfermos de conformidade com os créditos morais que atingiram ou segundo o merecimento de que disponham.
Guarda, pois, a existência como dom inefável, porque teu corpo é sempre instrumento divino, para que nele aprendas a crescer para a luz e a viver para o amor, ante a glória de Deus.”
No livro “MEMÓRIAS DE UM SUICIDA”, de psicografia de Yvonne do Amaral Pereira, pelo autor espiritual Camilo Cândido Botelho, na SEGUNDA PARTE intitulada “OS DEPARTAMENTOS”, no Capítulo IV, denominado “OUTRA VEZ JERÔNIMO E FAMÍLIA”, pág. 374/475, nos conta que o suicida Jerônimo vai defrontar-se com a ruína financeira, que na existência última foi a razão qual se suicidou:
“Quando, na sociedade terrena, praticamos delitos irremediáveis, ao voltarmos à Pátria Espiritual havemos de nos preparar para mais tarde tornar ao teatro das nossas infrações, em existências posteriores, a fim de recapitular o passado operando de modo contrário ao em que fracassamos. Partindo dessa regra, no caso vertente veremos, necessariamente, meu pupilo em apreço novamente defrontar-se com a ruína financeira, a desonra comercial, tal como a Terra considera a falência de uma firma comercial; com a pobreza, com o descrédito – motivos estes que ontem o levaram ao suicídio -, a fim de que prove o arrependimento de que se acha possuído e os valores morais que a amarga experiência de além-túmulo levou-o a adquirir. Para que assim seja, a ruína deverá positivar-se, no entanto, a despeito dos seus esforços por evitá-la e apesar da sua probidade (retidão), mas nunca pela incúria (negligência) de que acaba de dar provas, depredando em gozos e vaidades mundanas o empréstimo da fortuna que o Distribuidor Supremo lhe confiara com vistas a amplas possibilidades de progresso para ele próprio, como para seus semelhantes… Restará o grave impasse criado com a família, a quem abandonou em situação espinhosa, fugindo ao dever sagrado de lutar para defendê-la… A consciência aconselhá-lo-á as particularidades do desempenho de tão melindrosa reparação, de acordo com os seus próprios sentimentos, pois ele possui o livre-arbítrio. As pelejas da expiação, no entanto, os testemunhos amaros (amargos), os dramas que será levado a viver no âmbito das reparações inadiáveis serão agravados por um precário estado de saúde orgânica e moral, males indefiníveis, que a ciência dos homens não removerá, porque serão repercussões danosas das vibrações do perispírito prejudicado pelo traumatismo, resultante do suicídio, sobre o sistema nervoso do envoltório físico-material, que então possuirá. É possível que até mesmo a surdez e uma paralisia parcial, que poderá afetar o aparelho visual, assinale seu futuro estado de reencarnado . . . porquanto preferiu ele matar-se dilacerando o aparelho auditivo com um projétil de arma de fogo… e sabeis, meus amigos, que o corpo astral – o Perispírito -, sendo, como é, organização viva e semimaterial, também se ressentirá, forçosamente, com a bruteza de um suicídio… e assim modelará o futuro corpo padecendo mentalmente dos mesmos prejuízos…”
VI. – DO MÉDIUM QUE SE SUICIDOU
No Livro INSTRUÇÕES PSICOFÔNICAS, psicografia de Chico Xavier, Espíritos Diversos, Editora FEB, Cap. 23, intitulado “COMPANHEIRO EM LUTA” nos conta a comunicação de um médium que se suicidou:
” A fase terminal de nossas tarefas, na noite de 12 de agosto de 1954, trouxe-nos à presença antigo companheiro de lides espíritas em Belo Horizonte, que passaremos a nomear simplesmente por Irmão Lima, já que o respeito fraternal nos impede Identificá-lo plenamente.
Lima, que era pai de família exemplar, desfrutava excelente posição social e, por muitos anos, exerceu os dons mediúnicos de que era portador em ambientes íntimos. Em 1949, como que minado por invencível esgotamento, suicidou-se sem razões plausíveis, trazendo, com isso, dolorosa surpresa a todos os seus amigos.
Na noite a que nos referimos, naturalmente trazido por Amigos Espirituais, utilizou-se das faculdades psicofônicas do médium e ofertou-nos o relato de sua história comovente, que constitui para nós todos uma advertência preciosa.
“Venho da escura região dos mortos-vivos, à maneira de muitos vivos-mortos que se agitam na Terra. O Espiritismo foi minha grande oportunidade. Fui médium. Doutrinei. Contribuí para que irmãos sofredores e transviados recebessem uma luz para o caminho. Recolhi as instruções dos mestres da sabedoria e tentei acomodar-me com as verdades que são hoje o vosso mais alto patrimônio espiritual. Fui consolado e consolei. Doentes, enfraquecidos, desesperados, tristes, fracassados, desanimados, derrotados da sorte, muitas vezes se reuniam junto de nós e junto de mim… Através da oração, colaborei para que se lhes efetivasse o reerguimento.
Mas, no círculo de minhas atividades, a dúvida era como que um nevoeiro a entontecer-me o espírito e, pouco a pouco, deixei-me enredar nas malhas de velhos inimigos a me acenarem do pretérito — do pretérito que guarda sobre o nosso presente uma atuação demasiado poderosa para que lhe possamos entender, de pronto, a evidência… E esses adversários sutilmente me impuseram à lembrança o passado que se desenovelou, dentro de mim, fustigando-me (machucar, magoar) os germes de boa-vontade e fé, assim como a ventania forte castiga a erva tenra. Enquanto a vida foi árdua, sob provações aflitivas, o trabalho era meu refúgio. No entanto, à medida que o tempo funcionava como calmante celeste sobre as minhas feridas, adoçando-me as penas, o repouso conquistado como que se infiltrou em minha vida por venenoso anestésico, através do qual as forças perturbadoras me alcançaram o mundo íntimo. E, desse modo, a idéia da autodestruição avassalou-me o pensamento. Relutei muito, até que, em dado instante, minha fraqueza transformou-se em derrota.
Dizer o que foi o suicídio para um aprendiz da fé que abraçamos, ou relacionar o tormento de um espírito consciente da própria responsabilidade é tarefa que escapa aos meus recursos. Sei somente que, desprezando o meu corpo de carne, senti-me sozinho e desventurado. Perambulei nas sombras de mim mesmo, qual se estivera amarrado a madeiro de fogo, lambido pelas chamas do remorso. Após muito tempo de agoniada contrição (arrependimento), percebi que o alívio celeste me visitava. Senti-me mais sereno, mais lúcido…
(. . . )
Imponho-me, assim, o dever de clamar a todos os companheiros quanto aos impositivos do serviço constante. A ação infatigável no bem é semelhante à luz do Sol, a refletir-se no espelho de nossa mente e a projetar-se de nós sobre a estrada alheia. Contudo, no descanso além do necessário, nossa vida interior passa a retratar as imagens obscuras de nossas existências passadas, de que se aproveitam antigos desafetos, arruinando-nos os propósitos de regeneração. Comunicando-me convosco, associo-me às vossas preces. Sou o vosso Irmão Lima, companheiro de jornada, médium que, por vários anos, guardou nas mãos o archote (tocha) da verdade, sem saber iluminar a si próprio. Creio que um mendigo ulcerado e faminto à vossa porta não vos inspiraria maior compaixão. Cortei o fio de minha responsabilidade… Amigos generosos estendem-me aqui os braços, no entanto, vejo-me na posição do sentenciado que condena a si mesmo, porquanto a minha consciência não consegue perdoar-se.
Sinto-me intimado ao retorno… A experiência carnal compele-me à volta.
( . . . )
Estou suplicando ao Senhor me conceda, oportunamente, a graça de reencarnar-me num bordel. Isso por haver desdenhado o lar que era meu templo… Indispensável que eu sofra, para redimir-me, diante de mim mesmo. Não mereço agora o sorriso e os braços abertos de nossos benfeitores, perante o libelo de meu próprio juízo. Cabia-me aproveitar o tesouro da amizade, enquanto o dia era claro e quando o corpo carnal — enxada divina — estava jungido à minha existência como instrumento capaz de operar-me a renovação. Ah! meus amigos, que as minhas lágrimas a todos sirvam de exemplo!… Sou o trabalhador que abandonou o campo antes da hora justa… O tormento da deserção dói muito mais que o martírio da derrota. Devo regressar… Reentrarei pela porta da angústia. Serei enjeitado, porque enjeitei.. Serei desprezado, por haver desprezado sem consideração… E, mais tarde, encadear-me-ei (ligar-me-ei), de novo, aos velhos adversários. Sem a forja da tentação, não chegaremos ao reajuste. Rogo, pois, a Deus para que o trabalho não se afaste de minhas mãos e para que a aflição não me abandone… Que a carência de tudo seja socorro espiritual em meu benefício e, se for necessário, que a lepra me cubra e proteja para que eu possa finalmente vencer. Não me olvideis nas vibrações de amizade e que Jesus nos abençoe. Lima”
(Livro Instruções Psicofônicas, psicografia de Chico Xavier, Espíritos Diversos, Editora FEB, Cap. 23, intitulado “COMPANHEIRO EM LUTA”, págs. 131/136)
FONTES:
– RELATÓRIO divulgado em 2014, sobre o SUICÍDIO da ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, OMS;
– Site ” http://www.worldometers.info/br/” – que fornece estatísticas mundiais em tempo real;
– REVISTA ESPÍRITA de 1862, Allan Kardec, no artigo “ESTATÍSTICA DOS SUICÍDIOS”, do mês de julho;
– Revista Cláudia, Abril de 2016, n. 4, Ano 55, Artigo de Patrícia Zaidan, com colaboração de Gabriela Abreu, págs. 100/105;
– O LIVRO DOS ESPÍRITOS, Allan Kardec, questões 943/957;
– O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO – Allan Kardec, Cap. XXVIII, item 71;
– “O CÉU E O INFERNO, OU A JUSTIÇA DIVINA SEGUNDO O ESPIRITISMO”, Allan Kardec, SEGUNDA PARTE, CAPÍTULO V, intitulado “SUICIDAS“, pág. 247/273;
– NOSSO LAR, pelo Espírito André Luiz, psicografia Chico Xavier, Capítulo 4, intitulado “O MÉDICO ESPIRITUAL”;
– “OBREIROS DA VIDA ETERNA“, pelo Espírito André Luiz, psicografia Chico Xavier, Capítulo 5 – “IRMÃO GOTUZO“, Capítulo 14, intitulado “PRESTANDO ASSISTÊNCIA“;
– Livro “MEMÓRIAS DE UM SUICIDA’, pelo Espírito Camilo Cândido Botelhopsicografia de Yvonne A. Pereira, PRIMEIRA PARTE intitulada “OS RÉPROBOS“: CAPÍTULO I – “O VALE DOS SUICIDAS”, págs. 19/38, CAPÍTULO II – “OS RÉPROBOS”, págs. 39/66, e Capítulo V, denominado “O RECONHECIMENTO”, pág. 141/166, e na SEGUNDA PARTE intitulada “OS DEPARTAMENTOS“: Capítulo I: “A TORRE DE VIGIA”, págs. 231/268, Capítulo III – “O MANICÔMIO”, págs. 299/332; Capítulo IV, denominado “OUTRA VEZ JERÔNIMO E FAMÍLIA”, pág. 333/376;
– Revista REFORMADOR, de Agosto de 2010, mensagem: “A FORÇA DO AMOR“, ditada pelo Espírito de Yvonne Pereira, psicografia de Marta Antunes de Moura;
– Livro ESTANTE DA VIDA – pelo Espírito Irmão X, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Cap. 2, intitulado “DEPOIMENTO”;
– Livro: RELIGIÃO DOS ESPÍRITOS, pelo Espírito Emmanuel, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Cap. 48, intitulado “SUICÍDIO“, pág. 121/123;
– Livro INSTRUÇÕES PSICOFÔNICAS, psicografia de Chico Xavier, Espíritos Diversos, Editora FEB, Cap. 23, intitulado “COMPANHEIRO EM LUTA”, Págs. 131/136;
29/06/16 – Ellen – CELC