Justiça Divina – palestra 25.01.17
Justiça Divina
Palestra CELC 25.01.17 Plinio
1) Doutrina Espírita.
Antes de falarmos de Justiça Divina, se faz necessário alguns esclarecimentos, no tocante às bases da doutrina espírita. A doutrina espírita tem seus fundamentos alicerçados nas obras de Alan Kardec, e esses fundamentos não podem ser desvirtuados, uma vez que constituem a essência da doutrina. Naturalmente, poderemos ampliar nossos conceitos sobre a doutrina, poderemos alargar nossos conhecimentos, buscando nas obras subsidiárias de André Luiz, Emmanuel, Humberto de Campos, dentre outros, um campo maior de entendimento, isso é natural, mas não podemos nunca nos desviar de seus fundamentos, de sua essência, porque a doutrina, não é obra dos homens. Ela não tem dono, não tem dogmas, não cultua adoração a imagens, não canoniza santos e não tem compromissos com organizações e seitas religiosas, porque ela é a doutrina dos espíritos.
O grande coordenador dessa doutrina, foi o Espírito de Verdade, juntamente com uma plêiade de Espíritos Superiores, Espíritos da envergadura espiritual de João Evangelista, São Luiz, Pedro, Paulo, Santo Agostinho, Swedenborg, Fenelon, Erasto, Arago, Sócrates, Platão, dentre outros colaboradores de luz. E esses Espíritos, escolheram dentro da plêiade de espíritos superiores, aquele que iria codificar a obra. Allan Kardec foi o escolhido para a missão. Daí a necessidade, de ao estudarmos a doutrina espírita, nos reportando às bases, aos fundamentos, ou seja, às obras de Kardec.
Porque fizemos questão de salientar isso; a doutrina espírita vem ganhando novos adeptos nos últimos anos, e existem sempre aqueles que gostam de ficar mais em evidência, até mesmo que o Codificador, querendo mostrar coisas novas, fatos novos, ou seja, uma nova doutrina. Não existe nova Doutrina Espírita. Tudo aquilo que estiver em discordância com os ensinamentos de Allan Kardec, é falso. Portanto, doutrinadores, escritores médium, que contrariam os fundamentos de Kardec, repetimos, é falso. Estão querendo não só contaminar a Doutrina, como também as mentes dos seus adeptos, portanto, devemos repelir com veemência qualquer ação contaria aos ensinamentos de Kardec.
Porque é falso? Porque a doutrina espírita, é o Evangelho de Jesus redivivo. Como podemos saber se uma doutrina, uma filosofia, um sistema religioso é verdadeiro? Quando ele cumpre as Leis de Deus em sua essência. Portanto tudo aquilo que estiver em contradição com as Leis de Deus, é apócrifo. E a doutrina espírita é a mais pura essência das Leis de Deus, e não poderia ser diferente, uma vez que foi o próprio Jesus, que a anunciou, se utilizando do Evangelho de João nos capítulos 14, versículos 16 e 17:
16 E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre, 17 o Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; mas vós o conheceis, porque habita convosco e estará em vós; e 26 Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito , capitulo 15, versículos 26 e 27,26 Mas, quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito da verdade, que procede do Pai, testificará de mim. 27 E vós também testificareis, pois estivestes comigo desde o princípio e, capitulo 16, versículo 7; todavia, digo-vos a verdade: que vos convém que eu vá, porque, se eu não for, o Consolador não virá a vós; mas, se eu for enviar-vo-lo-ei.
2) DEUS.
Em vista disso, vamos dedicar algumas linhas, para falar de Deus. Allan Kardec ao elaborar a monumental obra, o Livro dos Espíritos, já na sua primeira pergunta ele se reporta a Deus, e pergunta aos Espíritos: “O que é Deus? ” E a resposta é: “Inteligência Suprema; Causa Primária de todas as coisas”.
Muitos espiritas, não sabem textualmente essa resposta, divagam sobre o que é Deus. Ainda não tem a devida consciência espiritual a respeito do que é Deus. Ainda cultivam os velhos vícios do passado, em que guardavam submissão a igreja, e continuam agindo muita das vezes, como se fosse outrora, e acham ainda, que Deus é aquele velhinho de barba branca, carregando um cajado, sentado num trono, pronto para fazer a nossa vontade e nossos desejos. Necessário faz se desvencilhar desses conceitos, e trocar a roupagem, para uma nova realidade sobre o que é Deus.
Continuando, Kardec pergunta na questão número 4, sobre a existência de Deus: ” Onde se pode encontrar a prova da existência de Deus? ” Resposta: “Num axioma que aplicais às vossas ciências. Não há efeito sem causa. Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem e a vossa razão responderá. ” E aí, Kardec faz uma observação:
Para crer-se em Deus, basta se lance o olhar sobre as obras da Criação. O
Universo existe, logo tem uma causa. Duvidar da existência de Deus é negar que todo efeito tem uma causa e avançar que o nada pôde fazer alguma coisa.
Os traços de Deus, estão impressos em todas as Suas obras, como os traços do artista também são reconhecidos em suas obras. Quando um analista de obras de arte, se depara com um quadro de Da Vinci, ele afirma: isso é Da Vinci. Porque os traços do artista estão ali impressos. Assim são com as obras de Deus. Quando nos deparamos com as belezas naturais deste mundo, exclamamos: isto e obra de Deus, tem o dedo de Deus. Ali está a sua assinatura, seu DNA, comprovando que a obra realmente, é. Sua.
Dando seguimento Kardec, nos mostra na questão de número 13, os Atributos de Deus.
Deus é eterno. Se tivesse tido princípio, teria saído do nada, ou, então, também teria sido criado, por um ser anterior. É assim que, de degrau em degrau, remontamos ao infinito e à eternidade.
É imutável. Se estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o Universo nenhuma estabilidade teriam.
É imaterial. Quer isto dizer que a sua natureza difere de tudo o que chamamos matéria. De outro modo, ele não seria imutável, porque estaria sujeito às transformações da matéria.
É único. Se muitos Deuses houvessem, não haveria unidade de vistas, nem unidade de poder na ordenação do Universo.
É onipotente. Ele o é, porque é único. Se não dispusesse do soberano poder, algo haveria mais poderoso ou tão poderoso quanto ele, que então não teria feito todas as coisas.
As que não houvesse feito seriam obra de outro Deus.
É soberanamente justo e bom. A sabedoria providencial das leis divinas se revela, assim nas mais pequeninas coisas, como nas maiores, e essa sabedoria não permite se duvide nem da justiça nem da bondade de Deus.
Na Gênese capitulo segundo item 19, assevera-nos Kardec:
Deus é, pois, a inteligência suprema e soberana, é único, eterno, imutável, imaterial, onipotente, soberanamente justo e bom, infinito em todas as perfeições, e não pode ser diverso disso.
Tal o eixo sobre que repousa o edifício universal. Esse o farol cujos raios se estendem por sobre o Universo inteiro, única luz capaz de guiar o homem na pesquisa da verdade. Orientando-se por essa luz, ele nunca se transviará. Se, portanto, o homem há errado tantas vezes, é unicamente por não ter seguido o roteiro que lhe estava indicado.
Tal também o critério infalível de todas as doutrinas filosóficas e religiosas.
Para apreciá-las, dispõe o homem de uma medida rigorosamente exata nos atributos de Deus e pode afirmar a si mesmo que toda teoria, todo princípio, todo dogma, toda crença, toda prática que estiver em contradição com um só que seja desses atributos, que tenda não tanto a anulá-lo, mas simplesmente a diminuí-lo, não pode estar com a verdade.
Em filosofia, em psicologia, em moral, em religião, só há de verdadeiro o que não se afaste, nem um til, das qualidades essenciais da Divindade. A religião perfeita será aquela de cujos artigos de fé nenhum esteja em oposição àquelas qualidades; Aquela cujos dogmas todos suportem a prova dessa verificação sem nada sofrerem.
3) Justiça Divina.
Agora sim, poderemos adentrar ao nosso tema de estudo, que é a Justiça Divina. Porque não teria lógica, falar de Justiça Divina, se não fosse devidamente apresentado o Senhor de todas as coisas. Falar de Justiça Divina sem antes falar de Deus, seria um despropósito e o estudo ficaria incompleto, sem consistência.
É interessante salientar, que a presença Divina, se encontra junto de nós em todos os momentos de nossas vidas. Não foi por outra razão que Emmanuel, nos asseverou na obra O Consolador, psicografia de F. Xavier: ” que ninguém vale na Terra, se não por expressão da Misericórdia Divina que nos acompanha (Q. 390). Isso quer dizer, que estamos sendo sempre monitorados pela espiritualidade maior. Cada ato que praticamos, por mais insignificante que seja, cada movimento por mais insignificante que seja, eles estão sendo imperiosamente catalogados pelas forças maiores em nossa contabilidade espiritual.
E são esses atos diários que constroem a nossa individualidade, como nos ensina Joana De Angeles : ” o homem é a síntese das suas próprias experiências, autor do seu destino, que ele elabora mediante os impositivos do determinismo e do livre-arbítrio”. Ela acrescenta ainda, “que a vida são os acontecimentos de cada instante, a se encadearem incessantemente. Uma ação provoca uma reação correspondente, geradora de novas ações, e assim sucessivamente. Por tanto, o indivíduo é o resultado de suas atividades anteriores”. (Livro Plenitude – Joanna de Angelis e Divaldo Pereira Franco).
Vale lembrar que não existe injustiça nos desígnios de Deus. Tudo é perfeito, minuciosa e cuidadosamente examinado, elaborado, sempre levando em consideração as Suas Leis, que são como já vimos Soberanas e Imutáveis.
Podemos então dizer que se sofremos ,ou se expiamos, é sempre por conta de nossa própria imprevidência ou de erros cometidos nessa vida ou em vidas passadas. Já nos asseverava A.K., no ESE: ” o homem é sempre o artífice de seu próprio infortúnio”.
Portanto, se nós somos a síntese de nossa própria experiência, autor do nosso próprio destino, que elaboramos mediante os impositivos do determinismo e do livre arbítrio, resulta daí que; ” a cada um será dado segundo às suas obras”, conforme nos ensinou Jesus.
Assim, a Justiça Divina está sempre em consonância com a nossa vida de encarnado, e ao contrário da Justiça da Terra, ela não é só punitiva. A Justiça de Deus é severa, mas não é inflexível. Ela é curativa, educativa, pois sempre oferece ao infrator a oportunidade de se regenerar, de pagar suas faltas, de ressarcir seus débitos. Como isso acontece? Arrependendo-se expiando e reparando, como veremos mais adiante.
Mas a Justiça Divina no plano espiritual se processa sempre. Vejamos o que nos traz André Luiz, sobre isso, no livro Evolução em Dois Mundos, psicografia de F. Xavier, na Segunda Parte, capítulo 6:
No mundo espiritual, decerto, a autoridade da Justiça funciona com maior segurança, embora saibamos que o mecanismo da regeneração vige, antes de tudo, na consciência do próprio indivíduo. Ainda assim, existem aqui, como é natural, santuários e tribunais, em que magistrados dignos e imparciais examinam as responsabilidades humanas, sopesando lhes os méritos e deméritos. A organização do júri, em numerosos casos, é aqui observada, necessariamente, porém, constituída de Espíritos integrados no conhecimento do Direito, com dilatadas noções de culpa e resgate, erro e corrigenda, psicologia humana e ciências sociais, a fim de que as sentenças ou informações proferidas se atenham à precisa harmonia, perante a Divina Providência, consubstanciada no amor que ilumina e na sabedoria que sustenta. Há delinqüentes tanto no plano terrestre quanto no plano espiritual e, em razão disso, não apenas os homens recentemente desencarnados são entregues a julgamento específico, sempre que necessário, mas também as entidades desencarnadas que, no cumprimento de determinadas tarefas, se deixam, muitas vezes, arrastar a paixões e caprichos inconfessáveis. É importante anotar, contudo, que quanto mais baixo é o grau evolutivo dos culpados, mais sumário é o julgamento pelas autoridades cabíveis e, quanto mais avançados os valores culturais e morais do indivíduo, mais complexo é o exame dos processos de criminalidade em que se emaranham, não só pela influência com que atuam nos destinos alheios, como também porque o Espírito, quando ajustado à consciência dos próprios erros, ansioso de reabilitar-se perante a vida e diante daqueles que mais ama, suplica por si mesmo a sentença punitiva que reconhece indispensável à própria restauração.
A Justiça Divina para ser levada a termo, necessita de Leis especificas para que esses magistrados do plano espiritual, possam realizar condignamente seu trabalho. Foi então criado o Código Penal da Vida Futura, código este constante no Livro O Céu e o Inferno, no capitulo VII – As Penas Futuras, segundo o Espiritismo. Esse código é formado por 33 leis, que dão consistência a Justiça Divina. Iremos nos ater somente ao artigo 16, do referido código, uma vez que é ele fundamental para realizarmos o estudo em questão.
Lei 16 – O arrependimento, conquanto seja o primeiro passo para a regeneração, não basta por si só; São precisas a expiação e a reparação.
Arrependimento, expiação e reparação constituem, portanto, as três condições necessárias para apagar os traços de uma falta e suas conseqüências. O arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo pela esperança o caminho da reabilitação; Só a reparação, contudo, pode anular o efeito destruindo-lhe a causa. Do contrário, o perdão seria uma graça, não uma anulação.
Portanto, a lei divina repousa sobre três pilares, Arrependimento, expiação e reparação, as três condições necessárias para apagar os traços da falta e suas consequências. Assim, toda falta, toda violação às leis divinas, produzem duas coisas: primeira-traços, segunda-consequências.
Traços: se você comete uma falta, você deixa traços; Primeiro traço em você mesmo; a falta mora em você, e ela te acompanha aonde quer que você vá. A serpente carrega consigo o veneno que veicula. O escorpião carrega em si próprio a carga venenosa que ele mesmo segrega. (Emmanuel). Aonde quer que você vá, o traço a marca vibratória da sua ação está em você. Você emana a energia da sua falta. Não adianta eu estar todo arrumadinho cheiroso, os espíritos sentem a minha vibração, eu emano essa vibração, elas estão impressas em mim, então significa que os traços estão em mim. Segundo; os traços também estão no outro que sofreu o dano. Terceiro; os traços também estão na comunidade, que presenciou o fato. Isto está na parábola do filho prodigo.
O filho pede ao pai que antecipe a herança. Naquele tempo, fazer isso, era como se desejasse a morte do pai, e ainda cometia uma violação as Leis de Deus, que é: Honrar pai e mãe. Sai de casa e posteriormente retorna. Veja que ao sair de casa, ele criou três traços: Primeiro com o pai, depois com o irmão, e por fim coma comunidade. Ao retornar, ele é recebido pelo pai, que lhe dá um abraço e o perdoa, apagando assim o primeiro traço. Mas nós sempre erramos na presença de observadores, portanto, temos também que apagar os traços com a comunidade, então o que o pai faz; mata uma novilha e dá uma festa para os empregados, que presenciaram o fato, apagando assim o segundo traço, com a comunidade. E por fim com o irmão. Mas vejam que o traço com o irmão ficou em aberto, mal resolvido.
Consequências: além dos traços tem as consequências dos traços. No livro Sexo e destino, quando Felix analisa o caso de um abandono afetivo, ele diz assim para a criatura que abandonou; daqui para a frente tudo que essa pessoa cometer de erro, que estiver relacionado com esse abandono afetivo, você será corresponsável. Não foi por outra razão que Kardec, nos asseverou na questão 975 do Livro dos Espíritos: “Porque, ficai sabendo, o Espírito sofre por todo o mal que praticou, ou de que foi causa voluntária, por todo o bem que houvera podido fazer e não fez e por todo o mal que decorra de não haver feito o bem. ” São as consequências da falta, porque há consequências, e essas consequências são imprevisíveis ao infrator. Porque a mesma falta pode ter consequências diversas, não é previsível, ou seja, fez isso vai acontecer isso, não, as consequências são imprevisíveis.
Então vamos lá, aos três pilares:
Arrependimento:
No novo testamento essa palavra aparece, com João Batista que é o precursor de Jesus. Precursor é aquele que objetiva colocar o Cristo dentro de você, no seu coração. Ai o precursor pergunta, quer ter o Cristo dentro de você? Então arrependei-vos, porque é chegado o Reino dos Céus. O arrependimento, é a transformação da mentalidade. O verdadeiro arrependimento, é aquele que muda a mentalidade que gerou o fato, porque todos nós agimos sob uma mentalidade. Querem ver? Você acreditava que relacionamento era isso, isso, e isso, você acreditava que o certo era isso, isso, e isso, e o errado era isso. Então você tinha uma mentalidade, e essa mentalidade fundamentou a sua ação. Ora se você continua com a mesma mentalidade, você vai continuar a praticar os mesmos atos, é por isso que o espiritismo é uma doutrina renovadora, porque ela muda a mentalidade humana. Porque mudando sua mentalidade, você mudara as suas ações, seus procedimentos. Se isso não acontecer você entra num círculo vicioso, e pode acontecer o seguinte: sabe aquele desafeto seu, que desta vez está te causando prejuízo? Na outra foi você, na anterior foi ele, na anterior foi você, na anterior foi ele, na anterior foi você, mas pera aí, em que século nós estamos mesmo? Então os espíritos que dirigem a nossa evolução, olham para esse quadro e dizem assim; meu Deus que jogo repetitivo. Porque só altera posição. Aí você olha e diz, coitadinha foi vitima, vítima? Essa já foi a 25ª como vítima e 30ª como algoz. Então a base da Justiça Divina, é a mudança de mentalidade, eu preciso olhar para dentro de mim e mudar a minha mentalidade, a minha perspectiva, porque sem isso eu não apago o meu traço, a falta vai tornar a repetir. Você pode apagar a falta na comunidade, na pessoa que você prejudicou, mas não apagou em você.
Reparação:
É tratar das consequenciais do ato, porque há uma regra básica no Universo; tirou do lugar, adivinha que vai colocar, encontrou com uma criatura e deixou ela perturbada, adivinha quem vai recebe-la. Você. A reparação tem aspectos espetaculares, no livro Nosso lar, André Luiz, depois de muito tempo, encontra sua mãe, que não vivia em Nosso Lar, habitava esferas mais altas. Ao reencontra-la, se emocionou tanto, que em virtude disso ouviu uma recomendação de sua mãe: ”. Acalme se meu filho, a alegria quando excessiva, costuma castigar o coração. ” Após colocarem os assuntos em dia, se assim podemos dizer, André Luiz perguntou: E meu pai? Porque não veio com a senhora? Minha mãe estampou singular expressão no rosto e respondeu: Ah! Teu pai! Teu pai! Há doze anos que está numa zona de trevas compactas, no Umbral. Quando encarnado mantinha ligações clandestinas, fora do nosso lar com duas amantes, que estavam mentalmente ligadas a vasta rede de entidades maléficas, e, tão logo desencarnou o meu pobre Laerte, encontra-se no Umbral, porque as desventuradas criaturas, a quem fizera muitas promessas, aguardavam-no ansiosas, prendendo-o de novo nas teias da ilusão.
Que será feito dessas infelizes?
Minha mãe sorriu e respondeu:
– Serão minhas filhas daqui a alguns anos, e Laerte será novamente meu esposo. É preciso não esqueceres que irei ao mundo em auxílio de teu pai. Ninguém ajuda eficientemente, intensificando as forças contrárias, como não se pode apagar na Terra um incêndio com petróleo. É indispensável amar, André! Os que descreem perdem o rumo verdadeiro, peregrinando pelo deserto; Os que erram se desviam da estrada real, mergulhando no pântano. Teu pai é hoje um céptico e essas pobres irmãs suportam pesados fardos na lama da ignorância e da ilusão. Em futuro não distante, colocarei todos eles em meu regaço materno, realizando minha nova experiência.
Identificando-lhe o espírito de renúncia, ajoelhei-me e beijei-lhe as mãos.
Desde aquela hora, minha mãe não era apenas minha mãe. Era muito mais que isso. Era a mensageira do Amparo, que sabia converter verdugos em filhos do seu coração, para que eles retomassem o caminho dos filhos de Deus.
O pai de André Luiz, agora vai receber as duas moças como filhas, vai dedicar um eterno amor, mas um amor diferente, um amor paternal. Vai dar banhinho, vai limpar xixi, coco, trocar frauda, é assim que funciona. Mas tem um detalhe, quando essas meninas atingirem aos 15 anos, vai haver muita dificuldade para educá-las, porque o que esses espíritos aprenderam com o pai de André Luiz, o que? Pela condição espiritual de cada uma, deduz se que nada. E quem devera ensinar essas meninas a educação, o caminho do bem? Quem desviou e desencaminhou é quem deve reparar. E esse, será um caminho espinhoso, a caminhada nesse proposito será bastante árdua.
Expiação:
Segundo definição de Emmanuel, no Livro O Consolador, psicografia de F. Xavier, na questão 246: “a expiação é a pena imposta ao malfeitor que comete um crime”.
No Livro Justiça Divina, também de autoria dos acima mencionado, encontramos que, ” livres”, estamos interligados perante a Lei, para fazer o melhor, e, escravizados aos compromissos expiatórios, estaremos acorrentados uns aos outros no instituto da reencarnação, segundo a Lei, para anular o pior que já foi feito por nós mesmos nas existências passadas.
Ninguém progride sem alguém.
Abençoemos, assim, as provações que nos abençoam”.
… Se caíste tão fundo que todos os afetos te hajam abandonado, mesmo aí, nas dores da culpa, recorda que a justiça te golpeia e purifica em direitura do supremo resgate, porque nunca estiveste distante da presença de Deus. (1)
A Lei estabelece, porém, que as provas e as penas se reduzam, ou se extingam, sempre que o aprendiz do progresso ou o devedor da justiça se consagre às tarefas do bem, aceitando, espontaneamente, o favor de servir e o privilégio de trabalhar. (1)
Assim a expiação não é um castigo, ao contrário é uma benção Divina, pois é através dela, que os espíritos conseguem resgatar seus débitos, buscando assim a sua purificação. Muitas vezes, é necessário, a dor e o sofrimento, para que o auxílio se faça presente em nosso aprendizado. Certo é, que nem todo processo reencarnatório produz efeito imediato. Dependendo do grau de inferioridade do espirito e do seu histórico de passado, onde, presos aos crimes e as violações às Leis, necessário se faz mais de uma encarnação expiando, para o devido reajuste.
Mas tem um componente primordial nesse contexto, para que a Lei possa funcionar em conformidade com a Justiça Divina. É a Reencarnação.
Contempla o mundo ao qual voltaste, através da reencarnação, para resgatar o passado e construir o futuro. (1)
Na questão 166 do Livro dos Espíritos, Kardec pergunta: “Como pode a alma, que não alcançou a perfeição durante a vida corpórea, acabar de depurar-se? ” Resposta: “Sofrendo a prova de uma nova existência. ”E na questão 171: Em que se funda o dogma da reencarnação?
“Na justiça de Deus e na revelação, pois incessantemente repetimos: o bom pai deixa sempre aberta a seus filhos uma porta para o arrependimento. Não te diz a razão que seria injusto privar para sempre da felicidade eterna todos aqueles de quem não dependeu o melhorarem-se?
Não são filhos de Deus todos os homens? Só entre os egoístas se encontram a iniqüidade, o ódio implacável e os castigos sem remissão. ”
Mas como funciona o processo reencarnatório? Escolhemos nossas provas, ou somos impelidos a reencarnar?
Na questão 258 do Livro dos Espíritos: Quando na erraticidade, antes de começar nova existência corporal, tem o Espírito consciência e previsão do que lhe sucederá no curso da vida terrena?
“Ele próprio escolhe o gênero de provas por que há de passar e nisso consiste o seu livre-arbítrio. ” No item “a”, da questão 262, os Espíritos nos esclarecem: “Quando o Espírito goza do livre-arbítrio, a escolha da existência corporal dependerá sempre exclusivamente de sua vontade, ou essa existência lhe pode ser imposta, como expiação, pela vontade de Deus? ”
“Deus sabe esperar, não apressa a expiação. Todavia, pode impor certa existência a um Espírito, quando este, pela sua inferioridade ou má vontade, não se mostra apto a compreender o que lhe seria mais útil, e quando vê que tal existência servirá para a purificação e o progresso do Espírito, ao mesmo tempo em que lhe sirva de expiação. ”
Perfeição é a meta.
Reencarnação é o caminho.
E toda falha, na direção de obra perfeita, exige naturalmente corrigenda e recomeço.(1).
É importante salientar que o Livro dos Espíritos, foi escrito com o objetivo destinado aos espíritos inferiores, aos medianos e aos Superiores. Nas reencarnações compulsórias, não existe escolha, o espírito é impelido a reencarnar. O inferior não tem vontade determinante, nem condições espirituais para escolha.
Para o mediano, que é onde se concentra a grande maioria dos espíritos, podemos dizer que esses podem escolher suas provas. Mas isso também não se dá em sentido absoluto, uma vez que face aos nossos débitos de passado, temos vincado em nosso corpo perispiritual as nódoas que definem, nosso DNA espiritual. Então, escolhemos o nosso mapa de provas, em cima de nossas obras, todas devidamente registradas em nosso corpo espiritual. Como é da lei que quitemos nossas contas, por intermédio das reencarnações, escolhemos então as faltas que queremos, ou melhor que precisamos apagar, para a limpeza, ainda que relativa do nosso corpo espiritual. Relativa, pois nem sempre conseguimos quitar integralmente nossos débitos numa só existência. Dia chegará, em que estaremos quites com a justiça Divina, não necessitando mais das reencarnações, ao não ser por missão.
A Perfeita Justiça, porém, nunca se expressa sem a Perfeita Misericórdia e abre-nos a todos, sem exceção, o serviço do bem, que podemos abraçar na altura e na quantidade que desejarmos, como recurso infalível de resgate e reajuste, burilamento e ascensão. (1).
Misericórdia na Justiça Divina, consolações inefáveis, braços amigos, diretrizes renovadoras e auxílio constante não te faltam, em tempo algum; contudo, está em ti mesmo aceitar, adiar, reduzir, facilitar ou agravar o preço da tua libertação.(1)
Mostraremos a seguir, alguns casos de concessões Divinas, pinçadas do Livro Ação e Reação, onde o benfeitor André Luiz, nos elucida magistralmente, como funciona o mecanismo dos débitos, pela visão espiritual.
Débito estacionário.
Temos sob nossa atenção lamentável débito congelado. Nosso pobre companheiro, deploravelmente tombado, praticou numerosos delitos na Terra e no Plano Espiritual e, há mais de mil anos, vem sucumbindo, vaidoso e desprevenido, às garras da criminalidade…. De existência a existência, não soube senão consumir os recursos do campo físico, tumultuando as paisagens sociais em que o Senhor lhe concedeu viver. Calamidades diversas, como sejam homicídios, rebeliões, extorsões, calúnias, falências, suicídios, abortos e obsessões foram por ele provocados, desde muitos séculos, porquanto nada viu à frente dos olhos senão o seu egoísmo a saciar. Quase sempre inspirado nos pontos de vista de Poliana, que lhe vem sendo a companheira de múltiplas jornadas, cristalizou-se como infeliz empresário do crime, agigantando-se lhe de tal modo o desequilíbrio na existência última, terminada no suicídio indireto através do mergulho deliberado na viciação, que não houve outro remédio para ele senão o insulamento absoluto na carne, ao nevoeiro da romagem presente, na qual o identificamos, assim, como fera enjaulada na armadura de células aviltantes, sob a custódia da mulher que o ajudou nas quedas sucessivas, erigida agora à posição de enfermeira maternal do seu longo infortúnio. Poliana, a companheira fútil e transviada do bem, que habitualmente escolheu para si a condição de boneca do prazer delituoso, acordou, além-túmulo, para as realidades da vida, antes dele… Despertou e sofreu muito, aceitando a tarefa de auxiliá-lo na recuperação em que, por certo, despenderão muito tempo ainda… Sabino é um problema de débito estacionário, porque jaz em processo de hibernação espiritual, compulsoriamente enquistado no próprio íntimo, a benefício da comunidade de Espíritos desencarnados e encarnados, porquanto tão expressivos se lhe destacam os gravames de ordem material e moral que a sua presença consciente, na Terra ou no Espaço, provocaria perturbações e tumultos de conseqüências imprevisíveis. Desfruta, desse modo, uma pausa na luta, como ensaio de esquecimento, a fim de que possa, de futuro, encarar o montante dos compromissos em que se enleia, promovendo-lhes solução digna nos séculos próximos, a golpes de férrea vontade na renunciação de si mesmo. – Mas – indagou Hilário, inquieto – não disporia a Espiritualidade Superior de elementos para encarcerá-lo, a distância da carne? – Sim – confirmou Silas –, isso não é impossível. Entretanto, se temos enxovias pungentes para a expiação dos crimes que entenebrecem a mente humana, muitas delas a se expressarem por vales de miséria e de horror, é preciso considerar que os delinqüentes aí segregados atraem-se uns aos outros, contagiando-se mutuamente das chagas morais de que são portadores, gerando o inferno em que passam transitoriamente a viver. Por outro lado, contamos com muitas instituições, funcionando à semelhança de estufas, nas quais criaturas desencarnadas dormem pacificamente largos sonos, mergulhadas nos pesadelos que merecem até certo ponto, depois de efetuada a travessia do sepulcro…
Como vemos, tamanhas são as ligações de nosso companheiro nos planos infernais que, por mercê de Jesus, foi ele ocultado provisoriamente neste corpo monstruoso em que se faz não apenas incomunicável, mas também de algum modo irreconhecível, em favor dele próprio. É indispensável que o tempo com a Bondade Divina lhe amparem os problemas aflitivos e complexos
Dívida agravada
Temos aqui asfixiante problema de conta agravada. E designando a jovem mãe, agora extenuada, continuou:
—Marina veio de nossa Mansão para auxiliar a Jorge e Zilda, dos quais se fizera devedora. No século passado, interpôs-se entre os dois, quando recém-casados, impelindo-os a deploráveis leviandades que lhes valeram angustiosa demência no Plano Espiritual. Depois de longos padecimentos e desajustes, permitiu o Senhor que muitos amigos intercedessem, junto aos Poderes Superiores, para que se lhes recompusesse o destino, e os três renasceram no mesmo quadro social, para o trabalho regenerativo.
Marina, a primogênita do lar de nossa irmã Luísa, recebeu a incumbência de tutelar a irmãzinha menor, que assim se desenvolveu ao calor de seu fraternal carinho, mas, quando moças feitas, há alguns anos, eis que, segundo o programa de serviço traçado antes da reencarnação, a jovem Zilda reencontra Jorge e reatam, instintivamente, os elos afetivos do pretérito. Amam-se com fervor e confiam-se ao noivado. Marina, porém, longe de corresponder às promessas esposadas no Mundo Maior, pelas quais lhe cabia amar o mesmo homem, no silêncio da renúncia construtiva, amparando a irmãzinha, outrora repudiada esposa, nas lutas purificadoras que a atualidade lhe ofertaria, passou a maquinar projetos inconfessáveis, tomada de intensa paixão. Completamente cega e surda aos avisos da sua consciência, começou a envolver o noivo da irmã em larga teia de seduções e, atraindo para o seu escuso objetivo o apoio de entidades caprichosas e enfermiças, por intermédio de doentios desejos, passou a hipnotizar o moço, espontaneamente, com o auxílio dos vampiros desencarnados, cuja companhia aliciara sem perceber… E Jorge, inconscientemente dominado, transferiu-se do amor por Zilda à simpatia por Marina, observando que a nova afetividade lhe crescia assustadoramente no íntimo, sem que ele mesmo pudesse controlar-lhe a expansão…
Decorridos breves meses, dedicavam-se ambos a encontros ocultos, nos quais se comprometeram um com o outro na maior intimidade…
Zilda notou a modificação do rapaz, mas procurava desculpar-lhe a indiferença à conta de cansaço no trabalho e dificuldades na vida familiar. Todavia, em faltando apenas duas semanas para a realização do consórcio, surpreende-se a pobrezinha com a inesperada e aflitiva confissão… Jorge expõe-lhe a chaga que lhe excrucia o mundo interior…. Não lhe nega admiração e carinho, mas desde muito reconhece que somente Marina deve ser-lhe a companheira no lar. A noiva preterida sufoca o pavoroso desapontamento que a subjuga e, aparentemente, não se revolta. Mas, introvertida e desesperada, consegue na mesma noite do entendimento a dose de formicida com que põe termo à existência física. Alucinada de dor, Zilda desencarnada foi recolhida por nossa irmã Luísa, que já se achava antes dela em nosso mundo, admitida na Mansão pelos méritos maternais. A genitora desditosa rogou o amparo de nossos Maiores. Na posição de mãe, apiedava-se de ambas as jovens, de vez que a filha traidora, aos seus olhos, era mais infeliz que a filha escarnecida, embora esta última houvesse adquirido o grave débito dos suicidas, em seu caso atenuado pela alienação mental em que a moça se vira, sentenciada sem razão a inqualificável abandono…. Examinado o assunto, carinhosamente, pelo Ministro Sânzio, que conhecemos pessoalmente, determinou ele que Marina fosse considerada devedora em conta agravada por ela mesma. E, logo após a decisão, providenciou a fim de que Zilda fosse recambiada ao lar para receber aí os cuidados merecidos. Marina falhara na prova de renúncia em favor da irmã que lhe era credora generosa, mas condenara-se ao sacrifício pela mesma irmãzinha, agora imposta pelo aresto da Lei ao seu convívio, na situação de filha terrivelmente sofredora e imensamente amada. Foi assim que
Jorge e Marina, livres, casaram-se, recolhendo da Terra a comunhão afetiva pela qual suspiravam; entretanto, dois anos após o enlace, receberam Zilda em rendado berço, como filhinha estremecida.
Mas… desde os primeiros meses do rebento adorado, identificaram-lhe a dolorosa prova. Zilda, hoje chamada Nilda, nasceu surda-muda e mentalmente retardada, em conseqüência do trauma perispirítico experimentado na morte por envenenamento voluntário.
Inconsciente e atormentada nos refolhos do ser pelas recordações asfixiantes do passado recente, chora quase que dia e noite…. Quanto mais sofre, porém, mais ampla ternura recolhe dos pais que a amam com extremados desvelos de compaixão e carinho… A vida corria-lhes regularmente, não obstante atribulada pelas provas naturais do roteiro, quando, há meses, Jorge foi apartado para o leprosário, onde se encontra em tratamento. Desde então, entre o esposo doente e a filhinha infeliz, Marina, em seu débito agravado, padece o abatimento em que a encontramos, martelada igualmente pela tentação do suicídio.
O problema era doloroso do ponto de vista humano, contudo encerrava precioso ensinamento da Justiça Divina.
Dívida expirante.
Era agora num hospital, em triste pavilhão de indigentes, a nova lição que Silas nos reservava.
Leo, moribundo, era um viajante habilitado à grande romagem, tão somente à espera do sinal de partida.
Ainda assim, estava sereno e portava-se com bravura.
Já que vieram para anotar um processo de dívida expirante, podem algo perguntar ao companheiro, cuja memória se revela, tanto quanto possível, consciente e vigilante.
— Ouvir-nos-á, porém? — Inquiriu Hilário, entre surpreso e compungido.
— Não com os tímpanos da carne, contudo, assinalar-nos-á qualquer indagação em espírito — esclareceu o Assistente, afetuoso.
Dominado de intensa simpatia, inclinei-me sobre o irmão em rude prova, atraído pela fé que lhe abrilhantava as pupilas e, abraçando-o, indaguei, em voz alta:
— Leo amigo, reconhece-se você no limiar da vida verdadeira? Sabe que deixará o corpo em breves horas?
O interpelado, crendo raciocinar por si mesmo, registrou-me a inquirição, palavra por palavra, qual se lhe fossem transmitidas ao cérebro por fios invisíveis. E, como se conversasse a sós consigo, falou pensando:
– Oh! Sim, a morte! …. Sei que, provavelmente esta noite, chegarei ao justo fim…
Não tem receio?
— Nada posso temer… — refletiu muito calmo.
E, movendo os olhos com esforço, buscou fitar na alva parede da enfermaria uma pequena escultura do Cristo crucificado, refletindo de si para consigo:
— Nada posso recear, em companhia do Cristo, meu Salvador… Ele também foi vilipendiado e esquecido… Terá vomitado sangue na cruz do martírio, Ele que era puro, varado pelas chagas da ingratidão… Por que não me resignar à cruz do meu leito, suportando, sem reclamar, as golfadas de sangue que de quando em quando me anunciam a morte, eu que sou pecador necessitado da complacência divina? …
— Você é católico romano?
— Sim…
Meditei na sublimidade do sentimento cristão, vivo e sincero, seja qual for a escola religiosa em que se exprima, e prossegui, afagando-lhe o peito opresso:
— Nesta hora de tanta significação para o seu caminho, sinto a ausência de seus familiares humanos…
— Ah! Meus familiares… meus afetos… — respondeu, falando mentalmente — meus pais teriam sido no mundo os meus únicos amigos…. No entanto, demandaram o túmulo, quando eu era simplesmente um jovem enfermo… Separado de minha mãe, vi-me entregue aos desajustes orgânicos…
Logo após, meu irmão Henrique não hesitou em declarar-me incapaz…. Por direito à herança, cabiam-lhe grandes bens, contudo, prevalecendo-se do meu infortúnio o mano obteve da Justiça, com meu próprio assentimento, a documentação com que se fazia meu tutor…. Bastou, porém, a consecução dessa medida, para que se transformasse para mim num verdugo cruel…
Apossou-se-me de todos os recursos…. Internou-me num hospício, em que amarguei longos anos de isolamento…. Sofri muito…. Alimentei-me com o pão recheado de fel, destinado pelo mundo aos que lhe penetram as portas como réprobos do berço, porque o desequilíbrio mental me perseguia desde a idade mais tenra…. Quando algo melhorado, fui constrangido a deixar o manicômio.
Recorri-lhe à porta, mas expulsou-me sem compaixão…. Fiquei apavorado, vencido… Ó meu Deus, como escarnecer assim de um irmão doente e infeliz?
Debalde impetrei socorro à Justiça. Legalmente, Henrique era o único senhor dos haveres de nossa casa…. Envergonhado, busquei outros climas…. Tentei o trabalho digno, mas apenas obtive, em meu favor, a profissão de vigia noturno, passando a rondar vasto edifício comercial, amparado por um homem caridoso, condoído de minha fome… O frio da noite, porém, encontrava-me ao desabrigo e, a breve tempo, adquiri uma febre insidiosa que passou a devorar-me devagarinho…. Não sei quanto tempo estive, assim, chumbado a indefinível desânimo…
Certa feita, caí fatigado sobre a poça de sangue que se me derramava da boca e criaturas piedosas me angariaram o leito em que me refúgio…
— E que opinião mantém você, acerca de Henrique? Lembra-se dele com mágoa?
Qual se mergulhasse a memória em ondas de enternecimento e saudade, Leo deixou que as lágrimas se lhe entornassem dos olhos, em dolorosa quietude mental.
Em seguida, monologou por dentro:
— Pobre Henrique! …. Não deverei, antes, lastimá-lo? Acaso, não deverá ele igualmente morrer? De que lhe terá valido a apropriação indébita se será também um dia alijado do corpo? Por que me reportaria a perdão, se ele é mais infeliz que eu mesmo?
E, tornando a pousar os olhos na figura do Cristo,
Continuou:
— Jesus, escarnecido e espancado, esqueceu ofensas e deserções… Içado à cruz, não clamou contra os amigos que o haviam lançado à humilhação e ao sofrimento… Não teve uma palavra de censura para os truculentos algozes… Ao invés de incriminá-los, pedira ao Pai Celeste amorosa proteção para todos… E Jesus foi o Embaixador de Deus entre os homens…
Com que direito julgarei, assim, meu próprio irmão, se eu, alma necessitada de luz, não posso penetrar os Divinos Juízos da Providência?
Aquietara-se Leo em pranto, buscando internar a mente no templo de amor da prece.
A humildade a que se recolhia tocava-me o coração.
Em que ponto será lícito considerar a presente desencarnação de
Leo como débito expirante?
Nosso interlocutor fixou expressivo gesto e informou:
— Decerto, não me reportarei à conta integral de nosso amigo, perante a Lei. Não disponho pessoalmente de recursos informativos para relacionar-lhe as dívidas e créditos no tempo. Referir-me-ei, por isso, tão somente à culpa que o atormentava, quando ingressou em nossa casa, segundo os apontamentos que lá poderemos compulsar.
Pela humildade e paciência com que tem sabido aceitar os golpes reparadores, conquistou a felicidade de encerrar em definitivo o débito a que nos reportamos.
Porque emudecesse o orientador, preocupado em atender ao agonizante, então banhado pelo suor característico da morte, Hilário indagou:
— Assistente, como entender que o nosso companheiro está liquidando a dívida a que se refere?
Quando a nossa dor não gera novas dores e nossa aflição não cria aflições naqueles que nos rodeiam, nossa dívida está em processo de encerramento. Muitas vezes, o leito de angústia entre os homens é o altar bendito em que conseguimos extinguir compromissos ominosos, pagando nossas contas, sem que o nosso resgate a ninguém mais prejudique. Quando o enfermo sabe acatar os Celestes Desígnios, entre a conformação e a humildade, traz consigo o sinal da dívida expirante…
Fontes:
Justiça Divina – Emmanuel e F. Xavier.
Livro dos Espíritos – Allan Kardec.
A Gêneses – Allan Kardec.
Ação e Reação – André Luiz e F. Xavier.
O Consolador – Emmanuel e F. Xavier.
O Céu e o Inferno. Allan Kardec.
Evolução em Dois Mundos. André Luiz e F. Xavier.
Livro Plenitude – Joanna de Angelis e Divaldo Pereira Franco.
Bíblia Sagrada. João Ferreira de Almeida.