Centro Espírita Leocádio Corrêia

Evangelização, Cura e Desobsessão

  • Início
  • O Centro
  • Horários
  • Biblioteca Virtual
  • Palestras
  • Artigos
    • Lista de Artigos
    • Ver Categorias
  • Links
    • Kardec
    • Revista Espírita
    • Biografias
    • Rádio
  • Contato
  • Início
  • O Centro
  • Horários
  • Biblioteca Virtual
  • Palestras
  • Artigos
    • Lista de Artigos
    • Ver Categorias
  • Links
    • Kardec
    • Revista Espírita
    • Biografias
    • Rádio
  • Contato

Artigo

Centro Espírita Leocádio Corrêia > Artigos > Palestras > Estudo Sobre a Revista Espírita – ano 1858 – palestra 29.06.22

Estudo Sobre a Revista Espírita – ano 1858 – palestra 29.06.22

celcPalestras4 de julho de 20221

ESTUDO SOBRE A REVISTA ESPÍRITA – ANO I – 1858

 

CELC – 29/06/22 – Ellen

 

  1. – DA INTRODUÇÃO

Da APRESENTAÇÃO do livro “REVISTA ESPÍRITA, ÍNDICE GERAL – 1858 – 1869”, extraímos os seguintes esclarecimentos:

O êxito suscitado pela divulgação das ideias novas trazidas pelo “O LIVRO DOS ESPÍRITOS”, lançado em Paris, no dia 18 de abril de 1857, provocou uma enxurrada de cartas dirigidas a Kardec, a maioria o interrogando sobre este ou aquele ponto da doutrina, algumas lhe relatavam fenômenos espíritas exigindo a sua explicação. E, como se não bastasse, o fluxo crescente de visitantes que acorriam à sua casa, inclusive da nobreza local e estrangeira, ansiando por esclarecimentos mais substanciais.

Naquela época, a Europa só dispunha de um único jornal dedicado à divulgação do Espiritismo, e mesmo assim em Genebra (uma cidade da Suíça), longe do burburinho de Paris e praticamente fora do alcance dos leitores da cidade-luz, contrariamente ao que ocorria nos Estados Unidos, que contava com 17 (dezessete) jornais consagrados ao espiritualismo. Foi quando Allan Kardec se deu conta da:

“(…) imperiosa necessidade de criar uma folha que periodicamente pusesse os estudiosos dos fenômenos espíritas a par do que se passava no mundo e os instruísse de modo ordenado sobre as mais variadas questões doutrinárias (…), a despeito de lhe faltar o tempo necessário para semelhante empreendimento, considerando-se os seus afazeres pessoais, inclusive os voltados para a sua própria subsistência.” (KARDEC, Allan. Apresentação da FEB. Revista Espírita. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. Rio de Janeiro: FEB, 2004. Ano 1, 1858).

Do PREFÁCIO do livro “REVISTA ESPÍRITA, ÍNDICE GERAL – 1858 – 1869”, extraímos o seguinte:

A Revista Espírita (Revue Spirite – Journal d’Études Psychologiques) (…). Circulou de janeiro de 1858 até abril de 1869, sob a égide de Allan Kardec. Quando desencarnou, em 31 de março de 1869, o número de abril já estava composto e foi publicado com sua assinatura.

Sua semente foi lançada em reunião mediúnica na residência do Sr. Dufaux, em 15 de novembro de 1857. A Sra. Ermance Dufaux foi a médium pela qual Allan Kardec consultou o Espírito a respeito da ideia que alimentava de publicar um jornal espírita. De pronto recebeu o apoio da Entidade, que deu a ele a seguinte orientação:

“(…) De começo, deves cuidar de satisfazer à curiosidade; reunir o sério ao agradável: o sério para atrair os homens de Ciência, o agradável para deleitar o vulgo. Esta parte é essencial, porém a outra é mais importante, visto que sem ela o jornal careceria de fundamento sólido. Em suma, é preciso evitar a monotonia por meio da variedade, congregar a instrução sólida ao interesse que, para os trabalhos ulteriores, será poderoso auxiliar”. (Obras Póstumas, 33. ed. FEB, p. 294)

A tarefa não era fácil e implicava gastos de certa gravidade. A princípio Kardec procurou alguém que pudesse patrocinar a obra, colaborando financeiramente para que ela viesse à luz, mas não conseguiu o êxito desejado. Mesmo assim, disse ele:

“(…) apressei-me a redigir o primeiro número e fi-lo circular a 1º de janeiro de 1858, sem haver dito nada a quem quer que fosse. Não tinha um único assinante e nenhum fornecedor de fundos. Publiquei-o correndo eu, exclusivamente, todos os riscos e não tive de que me arrepender, porquanto o resultado ultrapassou a minha expectativa. A partir daquela data, os números se sucederam sem interrupção e (…) esse jornal se tornou um poderoso auxiliar meu.” (KARDEC, Allan. Obras Póstumas, 33ª. Ed., Rio de Janeiro: FEB, 2003. p. 294).

Do ponto de vista da apresentação, a Revista Espírita:

“(…), era facultativa dos livreiros e dos escritórios postais. Impressa em papel jornal, contava com 32 páginas, caderninhos de duas colunas em oitava; seu tamanho era de 23,5 x 15 cm, com peso estimado em trinta gramas. As páginas estavam compostas por quarenta linhas impressas em corpo doze; sua apresentação era rústica, com capas de papel.” (BARRERA, Florentino. Prontuário crítico das obras de Allan Kardec. Tradução de David Caparelli. São Paulo: Madras, 2003. p. 147).

E, no final de cada ano, os fascículos correspondentes eram reunidos, formando uma coleção de exemplares encadernados, com uma capa especial e um índice alfabético.

Quando lançou a Revista Espírita, em 01/01/1858, Allan Kardec ainda tinha pela frente a publicação de:

O QUE É O ESPIRITISMO (1859)

O LIVRO DOS MÉDIUNS (1861)

O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO (1864)

O CÉU E O INFERNO (1865)

A GÊNESE (1868).

Ainda estariam por serem lançadas algumas outras obras: O Espiritismo na sua expressão mais simples (1862), Viagem Espírita em 1862 (1862), Resumo da lei dos fenômenos espíritas (1864), Caracteres da Revelação Espírita (1868), sem falar da Instrução prática das manifestações espíritas (1858), livro de maior porte, substituído três anos mais tarde por O Livro dos Médiuns, muito mais abrangente e metódico.

Era todo um campo a pesquisar, ideias a desenvolver e a amadurecer, conceitos a serem validados pelo critério infalível da concordância e da universalidade do ensino dos Espíritos, antes de serem incorporados ao patrimônio da Doutrina Espírita. Havia, pois, necessidade de um laboratório experimental, onde tudo isto pudesse ser testado com segurança, sem açodamento (precipitação).

Ora, a Revista Espírita foi esse laboratório inestimável, espécie de tribuna livre, utilizada por Allan Kardec para sondar a reação dos homens e a impressão dos Espíritos acerca de determinados assuntos, ainda hipotéticos ou mal compreendidos, enquanto lhes aguardava a confirmação.E tanto isto é verdade que a maioria das ideias desenvolvidas nas obras da Codificação foram esboçadas previamente na Revista Espírita, e até mesmo transcritas literalmente, sobretudo em O Céu e o Inferno e em A Gênese.

Como se tratava de um periódico (revista) mensal, muitas vezes Allan Kardec transcrevia artigos e notícias de jornais, nacionais e estrangeiros, sobre os mais variados assuntos, desenvolvendo-os e correlacionando-os com os postulados espíritas. Isto emprestava à Revista um caráter de atualidade, identificando-a com os problemas e as preocupações da Paris do Segundo Império.

Suicídio, epidemias, pena de morte, duelos, assassinatos, nada escapou à observação do Codificador, que deles se aproveitava para edificar os leitores, por meio de comentários judiciosos e oportunos.

Quantos Espíritos desencarnados foram evocados a partir de referências extraídas dos jornais, e que brindaram os leitores da Revista Espírita com o testemunho da sua própria experiência! Muitos detalhes de toda ordem foram revelados por esses ‘repórteres’ do Mundo Espiritual e estampados no Jornal de Estudos Psicológicos de Allan Kardec.

E é sobre este amplo material da Revista Espírita de 1858 que, de forma singela, nos dedicamos e este estudo, através da transcrição de alguns artigos.

  1. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – JANEIRO DE 1858

Sobre o RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DOS ESPÍRITOS E DE SUAS MANIFESTAÇÕES, Kardec trouxe um artigo de um dos um dos principais jornais eclesiásticos de Roma, o Civiltà Cattolica, publicado no mês de Março de 1857, onde se afirma a existência e a manifestação dos Espíritos. Kardec pondera que o reconhecimento das manifestações espíritas “por uma autoridade tão grave e tão respeitável” é ponto capital. Vide abaixo um trecho extraído de referido artigo:

“(…) Apliquemos esta observação tão simples à seguinte questão: não podemos dizer até onde vão as forças da Natureza; não obstante, dando-se um fato, muitas vezes podemos, conforme seus caracteres, dizer com certeza que pertence à ordem sobrenatural. E para não sair do nosso problema, entre os fenômenos das mesas falantes há muitos que, em nossa opinião, manifestam esses caracteres da mais evidente maneira; tais são aqueles nos quais o agente que move as mesas age como causa inteligente e livre, ao mesmo tempo que mostra uma inteligência e uma vontade próprias, isto é, superiores ou contrárias à inteligência e à vontade dos médiuns, dos experimentadores, dos assistentes; numa palavra, distintas dessas, qualquer que seja a maneira por que tal distinção se afirme. Em casos tais, seja como for, somos forçados a admitir que esse agente é um Espírito, e não é um espírito humano; e que assim, está fora desta ordem, dessas causas que costumamos chamar de naturais, dessas que dizemos ultrapassarem as forças do homem.

(…)

“3.º) Implicando a ação de uma causa inteligente fora do homem, os fenômenos desta última ordem só podem ser explicados pela intervenção dos Espíritos, seja qual for, aliás, o caráter desses Espíritos, assunto de que nos ocuparemos a seguir.(…)”

 

*******************************************************

 

SOBRE A MANEIRA COMO FORAM OBTIDAS AS COMUNICAÇÕES QUE CONSTITUEM O LIVRO DOS ESPÍRITOS

Kardec relatou:

“Muitas vezes nos foram dirigidas perguntas sobre a maneira por que foram obtidas as comunicações que constituem o Livro dos Espíritos. Resumimos aqui, com muito prazer, as respostas que temos dado a tais perguntas. É uma oportunidade para resgatarmos uma dívida de gratidão para com as pessoas que tiveram a boa vontade de nos prestar o seu concurso.

Como explicamos, as comunicações por meio de batidas, outrora chamadas tiptologia, são muito lentas e muito incompletas para um trabalho de fôlego, por isso tal recurso jamais foi utilizado.

Tudo foi obtido pela escrita, por intermédio de diversos médiuns psicógrafos. Nós mesmos preparamos as perguntas e coordenamos o conjunto da obra.

As respostas são, textualmente, as que nos deram os Espíritos. A maior parte delas foi escrita sob nossas vistas, outras foram tiradas de comunicações que nos foram remetidas por correspondentes ou que colhemos aqui e ali, onde estivemos fazendo estudos. Parece que para isso os Espíritos multiplicam aos nossos olhos os motivos de observação.

Os primeiros médiuns que concorreram para o nosso trabalho foram as senhoritas B. . ., cuja boa vontade jamais nos faltou.

O livro foi quase todo escrito por seu intermédio e em presença de numeroso público que assistia às sessões, nas quais tinha o mais vivo interesse.

Mais tarde os Espíritos recomendaram uma revisão completa em sessões particulares, tendo-se feito, então, todas as adições e correções que eles julgaram necessárias.

Esta parte essencial do trabalho foi feita com o concurso da senhorita Japhet, a qual se prestou com a melhor boa vontade e o mais completo desinteresse a todas as exigências dos Espíritos, porque eram eles que marcavam dia e hora para suas lições. O desinteresse não seria aqui um mérito especial, desde que os Espíritos reprovam qualquer tráfico que se possa fazer da sua presença, mas a senhorita Japhet, que é também uma notável sonâmbula, tinha seu tempo utilmente empregado, e compreendeu que também lhe daria uma aplicação proveitosa ao se consagrar à propagação da doutrina.

Quanto a nós, já o declaramos desde o princípio, e temos a satisfação de reafirmá-lo agora: jamais pensamos em fazer do Livro dos Espíritos objeto de especulação. Seu produto será aplicado a coisas de utilidade geral. Por isso seremos sempre gratos aos que, de coração e por amor ao bem, se associaram à obra a que nos consagramos. – Allan Kardec.”

 

III. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – FEVEREIRO DE 1858

AOS LEITORES DA REVISTA ESPÍRITA

Ainda no mês de Fevereiro/1858, Kardec escreveu AGRADECENDO AS CORRESPONDÊNCIAS que são enviadas para ele, contendo fatos sobre o Espiritismo. Ele informa que fará as publicações e comentários quando for oportuno e que apenas não responde todas as cartas por absoluta falta de tempo. Kardec pede aos que lhe enviam as correspondências, que informem se ele poderá (nos artigos da Revista Espírita) mencionar os lugares e os nomes das pessoas cujos fatos são relatados nas cartas.

“(…) A multiplicidade de nossas ocupações, somada à extensa correspondência, nos deixa por vezes na impossibilidade material de responder como desejáramos, e como era nosso dever, às pessoas que nos honram com suas cartas. Rogamos encarecidamente que não interpretem mal o nosso silêncio, independente de nossa vontade. Esperamos que sua boa vontade não arrefeça e que não interrompam sua interessante correspondência. Neste particular, novamente chamamos a atenção para a nota no fim da introdução do nosso primeiro número, a respeito de informações que solicitamos obsequiosamente, pedindo, além disso, que não deixem de dizer-nos quando poderemos, sem inconvenientes, fazer menção às pessoas e aos lugares.

As observações acima se aplicam igualmente às questões que nos são dirigidas sobre vários pontos de doutrina. Quando requerem maior desenvolvimento, tanto menos possível nos é responder por escrito, quando muitas vezes a mesma coisa deve ser repetida a muitas pessoas. Como nossa revista se destina a servir de meio de correspondência, as respostas terão aqui seu lugar natural, à medida que os assuntos tratados nos oferecerem oportunidade. Isto será tanto mais vantajoso e de proveito para todos, quanto mais completas puderem ser as respostas. – ALLAN KARDEC”

 

*******************************************************

  1. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – MAIO DE 1858

SOCIEDADE PARISIENSE DE ESTUDOS ESPÍRITAS.

Kardec noticia na Revista de Maio de 1858, que a Sociedade de Estudos Espíritas foi fundada em Paris, em 1º de abril de 1858

“A extensão, por assim dizer universal, que tomam diariamente as crenças espíritas fazia desejar-se vivamente a criação de um centro regular de observações. Esta lacuna acaba de ser preenchida.

A Sociedade cuja formação temos o prazer de anunciar, composta exclusivamente de pessoas sérias, isentas de prevenções e animadas do sincero desejo de esclarecimento, contou, desde o início, entre os seus associados, com homens eminentes por seu saber e por sua posição social.

Estamos convictos de que ela é chamada a prestar incontestáveis serviços à constatação da verdade. Sua lei orgânica lhe assegura uma homogeneidade sem a qual não haverá vitalidade possível. Está baseada na experiência dos homens e das coisas e no conhecimento das condições necessárias às observações que são o objeto de suas pesquisas.

Vindo a Paris, os estrangeiros que se interessarem pela Doutrina Espírita encontrarão, assim, um centro ao qual poderão dirigir-se para obter informações e onde poderão também relatar suas próprias observações – ALLAN KARDEC.”

[Nota de Kardec: Para informações relativas à Sociedade, dirigir-se ao Sr. ALLAN KARDEC, Rue Sainte-Anne, n. 59, das 3 às 5 horas; ou ao Sr. LEDOYEN, livreiro, Galeria d’Orléans, n. 31, no Palais-Royal]

 

*******************************************************

 

  1. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – JUNHO DE 1858

CONVERSAS FAMILIARES DE ALÉM-TÚMULO

O SR. MORISSON, MONOMANÍACO

Obs.: Monomaníaco: aquele que tem monomania, que é uma alienação mental em que uma única ideia parece absorver todas as faculdades mentais do indivíduo.

 

“Em março último (MARÇO 1858) noticiava um jornal inglês o que se segue, a respeito do Sr. Morisson, recentemente falecido na Inglaterra, deixando uma fortuna de cem milhões de francos.

Segundo aquele jornal, nos dois últimos anos de vida ele era presa de singular monomania. Imaginava-se reduzido a extrema pobreza e devia ganhar o pão de cada dia com um trabalho manual.

A família e os amigos haviam reconhecido a inutilidade dos esforços para lhe tirar aquilo da cabeça: era pobre, não possuía um ceitil e devia trabalhar para viver: essa a sua convicção.

Todas as manhãs, punham-lhe, pois, uma enxada nas mãos e mandavam-no trabalhar em seus próprios jardins. Daí a pouco vinham procurá-lo, pois a tarefa estava concluída; pagavam-lhe um modesto salário pelo trabalho feito e ele ficava contente. Seu espírito ficava tranquilo e sua mania satisfeita. Teria sido o mais infeliz dos homens se o tivessem contrariado.”

“1. ─ Peço a Deus Todo-Poderoso que permita venha comunicar-se conosco o Espírito de Morisson, recém-falecido na Inglaterra, deixando uma fortuna considerável.

─ Estou aqui.

  1. ─ Lembra-se do estado em que se achava durante os dois últimos anos de sua existência corpórea?

─ É sempre o mesmo.

  1. ─ Depois da morte seu Espírito ficou ressentido da aberração das faculdades durante a sua vida?

─ Sim. (São Luís completa a resposta, dizendo espontaneamente: “Desprendido do corpo, o Espírito sente, durante algum tempo, a compressão dos seus laços.”)

  1. ─ Assim, após a morte, seu Espírito não recobrou imediatamente a plenitude de suas faculdades?

─ Não.

  1. ─ Onde estais agora?

─ Atrás de Ermance.

  1. ─ Você é feliz ou infeliz?

─ Algo me falta… Não sei o que… Procuro… Sim, sofro.

  1. ─ Por que sofre?

─ “Sofre pelo bem que não fez”. (Resposta de São Luís).

  1. ─ Por que essa mania de julgar-se pobre, quando possuía tão grande fortuna?

─ Eu o era. Em verdade, rico é aquele que não tem necessidades.

  1. ─ De onde vinha essa ideia de que lhe era necessário trabalhar para viver?

─ Eu era louco e ainda o sou.

  1. ─ Como lhe veio essa loucura?

─ Que importa? Eu tinha escolhido essa expiação.

  1. ─ Qual é a origem de sua fortuna?

─ Que te importa?

  1. ─ Entretanto a sua invenção não visava aliviar a Humanidade?

─ E enriquecer-me.

  1. ─ Que uso você fazia da fortuna quando gozava da plenitude da razão?

─ Nenhum. Creio que eu a gozava.

  1. ─ Por que lhe teria Deus concedido fortuna, desde que não devia empregá-la utilmente para os outros?

─ Eu tinha escolhido a prova.

  1. ─ Aquele que goza de uma fortuna adquirida no trabalho não é mais escusável por se apegar a ela do que o que nasceu no seio da opulência e jamais conheceu a necessidade?

─ Menos. (São Luís acrescenta: “Aquele conhece a dor, mas não a alivia.”)

  1. ─ Você se lembra de sua existência precedente a esta que acaba de deixar?

─ Sim.

  1. ─ O que você era então?

─ Um operário

  1. ─ Você nos disse que é infeliz. Vê um termo para o seu sofrimento?

─ Não. (São Luís acrescenta: “É cedo demais.”)

  1. ─ De quem depende isto?

─ De mim. Assim me disse aquele que está ali.

  1. ─ Conhece aquele que está ali?

─ Vós o chamais Luís.

  1. ─ Sabeis o que foi ele em França no século XIII?

─ Não… Eu o conheço por vosso intermédio… Agradeço por aquilo que me ensinou.

  1. ─ Você acredita numa outra existência corporal?

─ Sim.

  1. ─ Se tiverdes de renascer na vida corpórea, de quem dependerá sua futura posição social?

─ De mim, suponho. Já escolhi tantas vezes que isto não pode depender senão de mim.

OBSERVAÇÃO: As palavras “Já escolhi tantas vezes” são características. Seu estado atual prova que, apesar das numerosas existências, pouco progrediu, estando sempre a recomeçar.

  1. ─ Que posição social escolheria se pudesse recomeçar?

─ Baixa. Avança-se com mais segurança. Só se está encarregado de si mesmo.

  1. ─ (A São Luís): Não haverá um sentimento de egoísmo na escolha de uma posição humilde, na qual não se deve ter o encargo senão de si mesmo?

─ Em parte alguma estamos encarregados apenas de nós mesmos. O homem responde por aqueles que o cercam, e não apenas pelas almas cuja educação lhe foi confiada, mas ainda as outras: o exemplo faz todo o mal.

  1. ─ (A Morisson): Nós lhe agradecemos a bondade com que nos respondeu e rogamos a Deus lhe dê forças para suportar novas provas.

─ Vós me aliviastes. Eu aprendi.

OBSERVAÇÃO: Reconhece-se facilmente nas respostas acima o estado moral do Espírito. Elas são curtas e, quando não monossilábicas, têm algo de sombrio e de vago. Um louco melancólico não falaria diferentemente. Essa persistência da aberração das ideias após a morte é um fato notável, mas que não é constante, ou que por vezes apresenta um caráter completamente diverso.”

 

*******************************************************

 

  1. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – JULHO DE 1858

ESPÍRITOS IMPOSTORES

O FALSO PADRE AMBRÓSIO

“Um dos escolhos apresentados pelas comunicações espíritas é o dos Espíritos impostores, que podem induzir em erro quanto a sua identidade e que, ao abrigo de um nome respeitável, tentam passar os mais grosseiros absurdos. Em muitas ocasiões já nos pronunciamos sobre esse perigo, que deixa de existir para quem quer que investigue, simultânea e rigorosamente, a forma e o fundo da linguagem dos seres invisíveis com os quais nos comunicamos.

(…)

Estas reflexões nos são sugeridas por um artigo do Spiritualiste de la Nouvelle-Orléans, do mês de dezembro de 1857.

É uma conversa estabelecida através de um médium, entre dois Espíritos, um dizendo-se o Padre Ambrósio, o outro Clemente XIV. O Padre Ambrósio foi um respeitável sacerdote, falecido em Louisiana, no século passado. Era um homem de bem, de grande inteligência e deixou uma memória venerada.

 

Obs.: Clemente XIV, conhecido como “o Rigoroso”. Foi Papa de 19 de maio de 1769 até à data da sua morte em 22 de setembro de 1774

 

Nesse diálogo, onde o ridículo compete com o ignóbil (baixo, vil), é impossível nos enganarmos quanto à qualidade dos interlocutores e é forçoso convir que aqueles Espíritos tomaram poucas precauções com o seu disfarce, pois qual seria a criatura de bom senso que, ao menos por um minuto, admitiria que o Padre Ambrósio e Clemente XIV tivessem podido descer àquelas trivialidades que mais parecem uma exibição circense? Não se exprimiriam de modo diferente comediantes de última classe que parodiassem essas duas personagens. (…)

Pensamos que a evocação do verdadeiro e do falso Padre Ambrósio poderia oferecer material útil para observações relativas aos Espíritos impostores. Foi o que fizemos, como se pode ver pela seguinte entrevista:

  1. ─ Peço a Deus Todo-Poderoso permitir que o Espírito do verdadeiro Padre Ambrósio, falecido em Louisiana no século passado, e que deixou uma memória venerável, venha comunicar-se conosco.

─ Aqui estou.

  1. ─ Teríeis a bondade de dizer se fostes realmente vós e Clemente XIV que tivestes a conversa relatada no Spiritualiste de la Nouvelle-Orléans, cuja leitura fizemos na sessão passada?

─ Lamento os homens que foram vítimas dos Espíritos, tanto quanto lamento estes.

  1. ─ Qual foi o Espírito que tomou o vosso nome?

─ Um charlatão (impostor).

  1. ─ E o interlocutor era realmente Clemente XIV?

─ Era um Espírito semelhante ao que me tomou o nome.

  1. ─ Como pudestes permitir coisas semelhantes em vosso nome? Por que não viestes desmascarar os impostores?

─ Porque nem sempre posso impedir que homens e Espíritos se divirtam.

  1. ─ Concebemos isso quanto aos Espíritos; entretanto eram sérias as pessoas que recolheram aquelas palavras, e de modo algum buscavam divertir-se.

─ Uma razão a mais. Eles deviam pensar logo que tais palavras não poderiam deixar de ser a linguagem de Espíritos zombeteiros.

  1. ─ Por que os Espíritos não ensinam em Nova Orleans, princípios perfeitamente idênticos aos que aqui ensinam?

─ A doutrina que vos é ditada logo lhes servirá. Haverá apenas uma.

  1. ─ Desde que essa doutrina deverá ser ali ensinada mais tarde, parece-nos que se o fosse imediatamente aceleraria o progresso e evitaria que a incerteza prejudicial tomasse conta de algumas pessoas.

─ Os desígnios de Deus são frequentemente impenetráveis. Porventura não há outras coisas que vos parecem incompreensíveis nos meios que Ele emprega para alcançar seus fins? É preciso que o homem se habitue a distinguir o verdadeiro do falso. Embora nem todos possam subitamente receber a luz sem se ofuscarem.

  1. ─ Teríeis a bondade de nos dar vossa opinião pessoal relativamente à reencarnação?

─ Os Espíritos são criados ignorantes e imperfeitos. Uma só encarnação não bastaria para que tudo aprendessem. É necessário que reencarnem, a fim de aproveitarem a felicidade que Deus lhes reserva.

  1. ─ Dá-se a reencarnação na Terra ou somente em outros globos?

─ A reencarnação se dá conforme o progresso do Espírito, em mundos mais perfeitos ou menos perfeitos.

  1. ─ Isto não esclarece se pode ocorrer na Terra.

─ Sim, pode ocorrer na Terra, e se o Espírito a pede como missão, ser-lhe-á mais meritório do que se a pedisse para avançar mais rapidamente em mundos mais perfeitos.

  1. ─ Rogamos a Deus Todo-Poderoso permita que o Espírito que tomou o nome do Padre Ambrósio venha comunicar-se conosco.

─ Aqui estou; mas não me queirais confundir.

  1. ─ És realmente o Padre Ambrósio? Em nome de Deus te conjuro a dizer a verdade!

─ Não.

  1. ─ Que pensas do que disseste em seu nome?

─ Penso como pensavam os que me escutavam.

  1. ─ Por que te serviste de um nome respeitável para dizer semelhantes tolices?

─ Aos nossos olhos os nomes nada valem: as obras são tudo. Como podiam ver o que eu era pelo que eu dizia, não liguei maior importância ao empréstimo desse nome.

  1. ─ Por que não sustentas a impostura em nossa presença?

─ Porque minha linguagem é uma pedra de toque, com a qual não vos podeis enganar.

OBSERVAÇÃO: Por diversas vezes nos foi dito que a impostura de certos Espíritos é uma prova para a nossa capacidade de julgar. É uma espécie de tentação permitida por Deus, a fim de que, como disse o Padre Ambrósio, o homem se habitue a distinguir o verdadeiro do falso.

  1. ─ Que pensas de teu camarada Clemente XIV?

─ Não vale mais do que eu; ambos necessitamos de indulgência.

  1. ─ Em nome de Deus Todo-Poderoso, eu lhe peço que ele venha.

─ Aqui estou, desde que chegou o falso Padre Ambrósio.

  1. ─ Por que abusaste da credulidade de pessoas respeitáveis, para dar uma falsa ideia da Doutrina Espírita?

─ Por que nos inclinamos ao erro? Porque não somos perfeitos.

  1. ─ Não pensastes, ambos, que um dia vosso embuste seria descoberto, e que os verdadeiros Padre Ambrósio e Clemente XIV não se exprimiriam como o fizestes?

─ Os embustes já eram conhecidos e castigados por Aquele que nos criou.

  1. ─ Pertenceis à mesma classe de Espíritos que chamamos batedores?

─ Não, pois ainda é necessário raciocínio para fazer o que fizemos em Nova Orleans.

  1. (Ao verdadeiro Padre Ambrósio). ─ Estes impostores vos estão vendo aqui?

─ Sim. E sofrem com o meu olhar.

  1. ─ São eles errantes ou reencarnados?

─ Errantes. Não seriam suficientemente perfeitos para se desprenderem, caso estivessem encarnados.

  1. ─ E vós, Padre Ambrósio, em que estado vos encontrais?

─ Encarnado num mundo feliz e desconhecido para vós.

  1. ─ Nós vos agradecemos os esclarecimentos que tivestes a bondade de nos dar. Teríeis a gentileza de voltar outras vezes, trazendo-nos boas palavras e deixando-nos um ditado que mostrasse a diferença entre o vosso estilo e o daquele que usurpou o vosso nome?

─ Estou com aqueles que querem o bem na verdade.”

 

*******************************************************

 

VII. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – SETEMBRO DE 1858

OS GRITOS NA NOITE DE SÃO BARTOLOMEU

 

Obs.: A NOITE DE SÃO BARTOLOMEU é a matança dos huguenotes, os seguidores do Protestantismo, ocorrida na noite de 24 de agosto de 1572 (que era o dia de São Bartolomeu) em Paris e em outras cidades francesas por ordem de Carlos IX, influenciado por sua mãe Catarina de Médicis. Esses assassinatos aconteceram como forma de repressão ao protestantismo, engendrado pelos reis franceses, que eram católicos. Estima-se que entre 5 000 e 30 000 pessoas tenham sido mortas, dependendo da fonte atribuída.

 

De Saint-Foy, em sua Histoire de L´ordre du Saint-Espirit, edição de 1778, cita a seguinte passagem, retirada de uma coletânea escrita pelo marquês Christophe Juvénal des Ursins, tenente-general do governo de Paris, escrita pelos fins do ano de 1572 e impressa em 1601.

“A 31 de agosto de 1572, oito dias após o massacre de São Bartolomeu, eu tinha ceado no Louvre, em casa da Senhora de Fiesque. Durante todo o dia havia feito muito calor. Fomos sentar-nos sob uma pequena latada, às margens do rio Sena, para respirar ar fresco. De repente ouvimos no ar um barulho horrível de vozes tumultuosas e de gemidos misturados a gritos de raiva e de furor.

Ficamos imóveis, tomados de pavor, olhando-nos de instante em instante, mas sem coragem de falar. Creio que esse barulho tenha durado cerca de meia hora.

Por certo o rei Carlos IX também o ouviu, ficou apavorado, não dormiu mais durante o resto da noite e, embora não comentasse o fato no dia seguinte, perceberam-lhe o ar sombrio, pensativo e alucinado.

Se algum prodígio não deve encontrar incrédulos, este é um, atestado por Henrique IV. Conforme d’Aubigné, no livro I, capítulo 6, página 561:

Várias vezes esse príncipe nos contou, entre os seus familiares e íntimos cortesãos ─ e tenho várias testemunhas vivas de que jamais relataram o fato sem se sentirem tomadas de pavor ─ que oito dias depois do massacre de São Bartolomeu, viu grande quantidade de corvos pousar e crocitar (corvejar) sobre o pavilhão do Louvre; que nessa mesma noite, Carlos IX, duas horas depois de se haver deitado, saltou da cama, fez com que os camareiros se levantassem e mandou dar busca, pois ouvia no ar um grande barulho de vozes e gemidos, em tudo semelhantes aos que se ouviam na noite do massacre; que todos esses gritos eram tão chocantes, tão marcados e tão distintamente articulados, que Carlos IX pensou que os inimigos dos Montmorency e de seus partidários estivessem atacando de surpresa, pelo que mandou um destacamento de sua guarda para impedir um novo massacre. Os guardas informaram que Paris estava tranquila e que todo aquele barulho que se ouvia permanecia no ar.

OBSERVAÇÃO: O fato relatado por Saint-Foy e por Juvénal des Ursins tem muita analogia com a história do fantasma que aparecia a Mademoiselle Clairon, relatada em nosso número de janeiro, com a diferença de que naquele caso foi um único Espírito a manifestar-se durante dois anos e meio, ao passo que depois da Noite de São Bartolomeu parece ter havido uma inumerável quantidade de Espíritos que fizeram o ar vibrar apenas por alguns instantes.

Aliás, esses dois fenômenos têm evidentemente o mesmo princípio que os outros fatos contemporâneos da mesma natureza por nós já relatados, e deles não diferem senão pelo detalhe de forma. Interrogados sobre a causa desta manifestação, vários Espíritos responderam que era um castigo de Deus, o que é fácil de compreender.”

 

*******************************************************

 

CONVERSAS FAMILIARES DE ALÉM-TÚMULO

SENHORA SCHWABENHAUS. LETARGIA EXTÁTICA

Segundo o Courrier des États-Unis, vários jornais relataram o fato que se segue e que nos pareceu fornecer matéria para um estudo interessante.

“Diz o Courrier des États-Unis que uma família alemã de acaba de ficar vivamente emocionada por um caso singular de morte aparente.

Doente desde muito tempo, a Sra. Schwabenhaus parecia ter exalado o último suspiro na noite de segunda para terça-feira. As pessoas que dela cuidavam observaram todos os sintomas da morte: o corpo ficou gelado, os membros se enrijeceram. Depois de ter prestado ao cadáver os últimos cuidados e quando tudo na câmara mortuária estava preparado para o enterro, os assistentes foram repousar.

Em breve os seguiu o Sr. Schwabenhaus, esgotado pela fadiga. Ele estava mergulhado num sono agitado quando, cerca de seis horas da manhã, a voz da esposa feriu-lhe o ouvido. A princípio julgou-se vítima de um sonho, mas o seu nome, repetido várias vezes, em breve não lhe deixou mais dúvida.

Precipitou-se para o quarto da esposa, e aquela que havia sido deixada como morta estava sentada na cama, aparentemente fruindo de todas as faculdades e mais forte do que jamais havia estado desde o começo da doença.

A Sra. Schwabenhaus pediu água e depois quis tomar chá e vinho.

Então, pediu ao marido que fizesse adormecer a criança que chorava num quarto vizinho, mas ele, que estava muito emocionado para isso, correu a chamar todas as pessoas da casa.

A doente acolheu sorridente os amigos e empregados que se aproximaram trêmulos do seu leito. Ela não parecia surpresa com o aparato funerário que lhe feria os olhos:

‘Eu sei que vocês pensavam que eu estivesse morta’, disse ela; ‘entretanto, eu estava apenas adormecida. Durante esse tempo minha alma foi transportada às regiões celestes. Um anjo veio buscar-me e em poucos instantes transpusemos o espaço. O anjo que me conduzia era a filhinha que perdemos no ano passado… Oh! em breve irei reunir-me a ela… Agora que gozei as alegrias do Céu, não mais queria viver na Terra. Pedi ao anjo para, uma vez mais, vir beijar meu marido e meus filhos, mas logo retornará para buscar-me.’

Às oito horas, depois de se haver ternamente despedido do marido, dos filhos e de uma porção de pessoas que a rodeavam, a Sra. Schwabenhaus expirou realmente, conforme foi constatado pelos médicos, de maneira a não deixar mais dúvida.

Esse fato comoveu vivamente a população de Baltimore”.

Evocado numa sessão da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas no dia 27 de abril de 1858, o Espírito da senhora Schwabenhaus manteve a seguinte conversa.

“1. ─ Com o fito de nos instruirmos, queremos fazer algumas perguntas, relativamente à vossa morte.

─ Como não vos atender, agora que começo a perceber as verdades eternas, e sabedora da necessidade que igualmente sentis de também as conhecer?

  1. ─ Lembrais da circunstância particular que precedeu a vossa morte?

─ Sim. Foi aquele o mais feliz momento de minha existência na Terra.

  1. ─ Durante a vossa morte aparente ouvíeis o que se passava em torno e percebíeis os preparativos do funeral?

─ Minha alma estava muito preocupada com a sua felicidade que se avizinhava.

OBSERVAÇÃO: Sabe-se, que em geral, que os letárgicos veem e ouvem o que se passa à volta deles, conservando a lembrança ao despertar. O fato que a que nos referimos oferece a particularidade de ser o sono letárgico acompanhado de êxtase, circunstância que explica por que foi desviada a atenção da paciente.

  1. ─ Tínheis consciência de não estar morta?

─ Sim, mas isto me era ainda mais penoso.

  1. ─ Podeis dizer-nos qual a diferença entre o sono natural e o sono letárgico?

─ O sono natural é o repouso do corpo; o letárgico é a exaltação da alma.

  1. ─ Sofríeis durante a letargia?

─ Não.

  1. ─ Como se operou vosso retorno à vida?

─ Deus permitiu que eu voltasse para consolar os corações aflitos que me rodeavam.

  1. ─ Desejaríamos uma explicação mais material.

─ Aquilo a que chamais perispírito ainda animava o meu invólucro (envoltório) terrestre.

  1. ─ Como é que não ficastes surpreendida, quando despertastes, com os preparativos que estavam sendo feitos para o vosso enterro?

─ Eu sabia que ia morrer. Aquilo tudo pouco me importava, pois eu havia entrevisto a felicidade dos eleitos.

  1. ─ Voltando à consciência, ficastes satisfeita com a volta à vida?

─ Sim, para consolar.

  1. ─ Onde estivestes durante o sono letárgico?

─ Não posso descrever toda a felicidade que experimentava. A linguagem humana é incapaz de exprimir essas coisas.

  1. ─ Ainda vos sentíeis na Terra ou no espaço?

─ Nos espaços.

  1. ─ Voltando a vós, dissestes que a filha que havíeis perdido no ano anterior vos tinha vindo buscar. É verdade?

─ Sim. Ela é um Espírito puro.

OBSERVAÇÃO: Nas respostas dessa mãe, tudo indica que ela era um Espírito elevado. Nada, pois, há que admirar que um Espírito ainda mais elevado se tivesse unido ao seu por simpatia. Contudo, não devemos tomar ao pé da letra a expressão Espírito Puro, que os Espíritos por vezes se dão mutuamente. Sabe-se que isto significa uma ordem mais elevada, pois os que se acham completamente desmaterializados e depurados não mais estão sujeitos à reencarnação: são anjos que desfrutam a vida eterna. Ora, os que não atingiram ainda um grau suficiente não compreendem esse estado supremo. Podem, pois, empregar a expressão ‘Espírito Puro’ para designar uma superioridade relativa, não no sentido absoluto. Temos disto numerosos exemplos. A Sra. Schwabenhaus parece estar neste caso. Também os Espíritos zombadores, por vezes, se atribuem a qualidade de Espíritos Puros, a fim de inspirar mais confiança àqueles a quem desejam enganar e que não têm suficiente perspicácia para lhes julgar a linguagem, onde sempre traem a sua inferioridade.

  1. ─ Que idade tinha essa criança quando morreu?

─ Sete anos.

  1. ─ Como a reconhecestes?

─ Os Espíritos superiores se conhecem mais depressa.

  1. ─ Vós a reconhecestes sob uma forma qualquer?

─ Somente a vi como Espírito.

  1. ─ O que ela vos dizia?

─ “Vem; segue-me para o Eterno”.

  1. ─ Vistes outros Espíritos além do de vossa filha?

─ Vi uma porção de outros, mas a voz da minha filha e a felicidade que pressentia eram minhas únicas preocupações.

  1. ─ Quando de vosso retorno à vida dissestes que em breve iríeis reencontrar vossa filha. Tínheis, pois, consciência de vossa morte próxima?

─ Para mim era uma esperança feliz.

  1. ─ Como sabíeis?

─ Quem não sabe que é preciso morrer? Minha doença me dizia bem.

  1. ─ Qual era a causa de vossa enfermidade?

─ Os desgostos.

  1. ─ Que idade tínheis?

─ Quarenta e oito anos.

  1. ─ Deixando a vida definitivamente, tivestes imediatamente consciência clara e lúcida de vossa nova condição?

─ Tive-a no momento da letargia.

  1. ─ Experimentastes a perturbação que geralmente acompanha a volta à vida espírita?

─ Não. Eu estava deslumbrada, mas não perturbada.

OBSERVAÇÃO: Sabe-se que a perturbação que se segue à morte é tanto menor e menos duradoura quanto mais depurado em vida é o Espírito. O êxtase que precedeu a morte dessa senhora era, aliás, o primeiro desprendimento que a alma tinha dos laços terrenos.

  1. ─ Depois da morte revistes a vossa filha?

─ Frequentemente estou com ela.

  1. ─ Estais reunida a ela para toda a eternidade?

─ Não. Entretanto, sei que depois de minhas últimas encarnações estarei na morada onde habitam os Espíritos Puros.

  1. ─ Então vossas provas não estão terminadas?

─ Não, mas agora elas serão mais felizes. Só me resta esperar, e a esperança é quase a felicidade.

  1. ─ Vossa filha tinha habitado outros corpos antes daquele com o qual foi vossa filha?

─ Sim, em muitos outros.

  1. ─ Sob que forma estais entre nós?

─ Sob minha derradeira forma de mulher.

  1. ─ Vós nos vedes tão distintamente quanto se estivésseis viva?

─ Sim.

  1. ─ Desde que aqui vos encontrais com a forma que tínheis na Terra, é pelos olhos que nos vedes?

─ Não, o Espírito não tem olhos. Só me encontro sob minha última forma para satisfazer às leis que regem os Espíritos quando evocados e obrigados a retomar aquilo a que chamais perispírito.

  1. ─ Podeis ler os nossos pensamentos?

─ Sim, posso. Eu os lerei se vossos pensamentos forem bons.

  1. ─ Agradecemos as explicações que tivestes a bondade de nos dar. Reconhecemos pela sabedoria de vossas respostas que sois um Espírito elevado e esperamos que venhais a gozar da felicidade que mereceis.

─ Sinto-me feliz por contribuir com a vossa obra. Morrer é uma alegria quando se pode colaborar com o progresso, como o faço agora.”

 

*******************************************************

 

VIII. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – OUTUBRO DE 1858

OBSEDIADOS E SUBJUGADOS

“(…) O Sr. F…, moço instruído, de esmerada educação, de caráter suave e benevolente, mas um pouco fraco e indeciso, tornou-se hábil médium psicógrafo com bastante rapidez. Obsidiado pelo Espírito que dele se apoderou e lhe não dava sossego, escrevia sem parar. Se uma pena ou um lápis lhe caía na mão, tomava-o num movimento convulsivo e enchia páginas e páginas em poucos minutos. Na falta de instrumento, simulava escrever com o dedo, em qualquer parte onde se encontrasse: na rua, nas paredes, nas portas etc. Entre outras coisas, esta lhe era ditada:

‘O homem é composto de três coisas: o homem, o mau Espírito e o bom Espírito. Todos vós tendes vosso mau Espírito, que está ligado ao corpo por laços materiais. Para expulsar o mau Espírito é necessário quebrar esses laços para o que é preciso enfraquecer o corpo. Quando este se acha suficientemente enfraquecido, o laço se parte e o mau Espírito vai embora, deixando apenas o bom.’

Em consequência desta teoria fizeram-no jejuar durante cinco dias consecutivos e velar à noite. Quando estava extenuado, eles lhe disseram:

‘Agora a coisa está feita e o laço partido. Teu mau Espírito se foi: ficamos apenas nós, em quem deves crer sem reservas.’

E ele, persuadido de que seu mau Espírito havia fugido, acreditava cegamente em todas as suas palavras. A subjugação havia chegado a um ponto em que se lhe tivessem dito para atirar-se na água ou partir para os antípodas, ele o teria feito. Quando queriam obrigá-lo a fazer qualquer coisa que lhe repugnava, era arrastado por uma força invisível.

(…) Encheríamos um volume com todas as tolices que lhe foram ditadas e com as circunstâncias que se seguiram. Entre outras coisas fizeram-no desenhar um edifício de tais dimensões que as folhas de papel, coladas umas às outras, chegavam à altura de dois andares. (…)

O Espírito que representava o papel principal nesse caso dava o nome de François Dillois, quando não se cobria com a máscara de um nome respeitável. Mais tarde viemos a saber o que esse tal Dillois tinha sido em vida, e então, nada mais nos surpreendeu em sua linguagem.

Todavia, no meio de todas essas extravagâncias, era fácil reconhecer um Espírito  bom que lutava, fazendo de quando em quando ouvir algumas boas palavras para desmentir os absurdos do outro.

Havia, evidentemente, um combate, mas a luta era desigual. O moço se achava de tal modo subjugado, que sobre ele a voz da razão era impotente. O Espírito de seu pai fez-lhe escrever especialmente isso:

‘Sim, meu filho, coragem! Sofres uma rude prova, que será para o teu bem no futuro. Infelizmente, neste momento, nada posso fazer para te libertar, e isto muito me custa bastante. Vai ver Allan Kardec; escuta-o, e ele te salvará’.

Realmente, o Sr. F… veio procurar-me e contou-me sua história. Fiz com que escrevesse diante de mim, e, desde logo reconheci a influência perniciosa sob a qual se achava submetido, seja pelas palavras, seja por certos sinais materiais que a experiência dá a conhecer, e que não nos podem enganar.

Ele voltou várias vezes. Empreguei toda a minha força de vontade para chamar os bons Espíritos por seu intermédio; toda a minha retórica para lhe provar que era vítima de Espíritos detestáveis; que aquilo que escrevia não tinha o menor sentido e, além disso,  era profundamente imoral.

Para essa obra de caridade associei-me a um de meus companheiros mais devotados, o Sr. T… e aos poucos conseguimos fazer com que escrevesse coisas sensatas. Ele tomou aversão àquele mau gênio, repelindo-o por vontade própria cada vez que tentava manifestar-se, e pouco a pouco, apenas os Espíritos bons prevaleceram.

Para renunciar às suas ideias, ele seguiu o conselho dos Espíritos, de entregar-se a um trabalho rude, que lhe não deixasse tempo para ouvir as sugestões más.

O próprio Dillois acabou confessando-se vencido e manifestou o desejo de progredir em nova existência. Confessou o mal que tinha tentado fazer e deu provas de arrependimento.

A luta foi longa, penosa e ofereceu ao observador particularidades realmente curiosas.

Hoje o Sr. F. sente-se livre e é feliz; parece que se livrou de um fardo. Recuperou a alegria e nos agradece pelo serviço que lhe prestamos.

(…) Esta história, que infelizmente não é a única de nosso conhecimento, levanta uma questão muito grave. Perguntar-se-á se não é para esse moço um aborrecimento ter sido médium. Não terá sido tal faculdade a causa da obsessão de que foi vítima? Numa palavra, não será uma prova do perigo das comunicações espíritas?

Nossa resposta é simples e pedimos que a analisem cuidadosamente.

Não foram os médiuns que criaram os Espíritos. Eles sempre existiram e sempre exerceram sobre os homens uma influência salutar ou perniciosa. Para isto, pois, não é necessário ser médium. A faculdade medianímica não lhes é mais que um meio de manifestar-se; na falta dessa faculdade, agem de mil e uma outras maneiras.

Se esse moço não fosse médium, nem por isso ter-se-ia subtraído à influência desse mau Espírito que sem dúvida lhe teria feito praticar extravagâncias, as quais teriam sido atribuídas a qualquer outra causa.

Felizmente, para ele, permitindo a sua faculdade de médium que o Espírito se comunicasse por palavras, foi por essas palavras que o Espírito se traiu. Elas permitiram conhecer a causa de um mal que poderia ter tido consequências funestas para ele e que, como se viu, nós destruímos por meios muito simples e racionais, e sem exorcismos.

A faculdade medianímica permitiu ver o inimigo, se assim nos podemos exprimir, face a face, e combatê-lo com suas próprias armas. Pode-se, pois, dizer, com absoluta certeza, que foi ela que o salvou. Quanto a nós, fomos apenas o médico que, tendo julgado a causa do mal, aplicamos o remédio.

Grave erro seria pensar que os Espíritos não exercem sua influência senão por comunicações verbais ou escritas. Essa influência é constante, e aqueles que não acreditam em Espíritos estão a ela expostos tanto quanto os outros, e até mais do que os outros, porque não têm, em contrapartida, o conhecimento.

A quantos atos, infelizmente, não somos impelidos, e que teriam sido evitados se tivéssemos tido um meio de nos esclarecermos! Os mais incrédulos não se dão conta de que dizem uma verdade quando afirmam, a propósito de um homem que se desencaminha com obstinação: É o seu mau gênio que o empurra para a perdição.”

 

*******************************************************

 

  1. – REVISTA ESPÍRITA – ANO I – DEZEMBRO DE 1858

FENÔMENO DE BI-CORPOREIDADE

“Um dos membros da Sociedade envia-nos uma carta de um de seus amigos de Boulogne-sur-Mer (é uma cidade francesa, à borda do Canal da Mancha), datada de 26 de julho de 1856, onde se lê a passagem seguinte:

Desde que o magnetizei – por ordem dos Espíritos – meu filho tornou-se um médium muito raro, conforme a revelação que fez em estado sonambúlico, no qual eu o havia posto, a pedido dele, a 14 de maio último e outras quatro ou cinco vezes depois.

Para mim é fora de dúvida que, desperto, meu filho conversa livremente com os Espíritos com quem deseja, por intermédio de seu guia, que chama familiarmente de seu amigo; que se transporta à vontade em Espírito aonde deseja. Vou citar um fato cuja prova escrita tenho em minhas mãos.

Faz hoje exatamente um mês que estávamos ambos na sala de jantar. Eu lia o curso de magnetismo do Sr. Du Potet, quando meu filho tomou o livro e o folheou. Quando chegou a certa passagem, seu guia lhe disse ao ouvido: “Leia isto.” Era a aventura de um doutor da América, cujo Espírito tinha visitado um amigo a 15 ou 20 léguas de distância, enquanto dormia. Depois de ter lido, meu filho disse:

─ Gostaria de fazer uma viagem semelhante.

─ Então! Onde queres ir? perguntou-lhe o guia.

─ A Londres, respondeu meu filho, ver os amigos. E designou aqueles a quem desejava visitar.

Amanhã é domingo. Não és obrigado a te levantares cedo para trabalhar. Dormirás às oito horas e irás passear em Londres até às oito e meia. Na próxima sexta-feira receberás uma carta de teus amigos, censurando-te por teres ficado tão pouco tempo com eles.

Efetivamente, no dia seguinte, pela manhã, à hora indicada, ele caiu num sono profundo. Despertei-o às oito e meia. Ele não se lembrava de nada. De minha parte nada lhe disse, esperando os acontecimentos.

Na sexta-feira seguinte eu trabalhava numa das minhas máquinas e como de hábito fumava, por ter acabado de almoçar. Meu filho olhava a fumaça do cachimbo e me disse:

─ Olha! Há uma carta na fumaça.

─ Como vês uma carta na fumaça?

─ Verás, respondeu ele, pois eis que chega o carteiro.

Realmente, o carteiro veio entregar uma carta de Londres, na qual os amigos de meu filho censuravam-no por ter passado com eles apenas alguns minutos, no domingo anterior, das oito às oito e meia, com uma porção de detalhes que seria longo aqui relatar, entre os quais o fato singular de ter tomado o café da manhã com eles. Possuo a carta, como havia dito, como prova de que não estou inventando.

Tendo sido contado o fato acima, um dos assistentes disse que a História narra diversos casos semelhantes. Citou Santo Afonso de Liguori, que foi canonizado antes do tempo exigido, por se haver mostrado simultaneamente em dois lugares diferentes, o que foi considerado como um milagre.

Santo Antônio de Pádua estava pregando na Itália (vide nota especial na página 482 da Revista Espírita, 5ª Edição, FEB), quando seu pai, em Lisboa, ia ser supliciado, sob a acusação de haver cometido um assassínio. No momento da execução, Santo Antônio aparece e demonstra a inocência do acusado. Comprovou-se que, naquele instante, Santo Antônio pregava na Itália, na cidade de Pádua.

Santo Afonso de Liguori foi evocado e lhe dirigimos as seguintes perguntas:

  1. ─ O fato pelo qual fostes canonizado é real?

─ Sim.

  1. ─ Esse fenômeno é excepcional?

─ Não. Ele pode apresentar-se em todos os indivíduos desmaterializados.

  1. ─ Era motivo justo para vos canonizarem?

─ Sim, pois que por minha virtude eu me havia elevado para Deus. Sem isso eu não teria podido transportar-me simultaneamente para dois lugares diferentes.

  1. ─ Todos os indivíduos com os quais ocorrem esses fenômenos merecem ser canonizados?

─ Não, pois nem todos são igualmente virtuosos.

  1. ─ Poderíeis dar-nos uma explicação desse fenômeno?

─ Sim. Quando o homem, por sua virtude, se acha completamente desmaterializado; quando elevou sua alma para Deus, pode aparecer em dois lugares ao mesmo tempo, do seguinte modo: Sentindo vir o sono, o Espírito encarnado pode pedir a Deus para se transportar a um lugar qualquer. Seu Espírito ou sua alma, como queirais chamar, então abandona o seu corpo, seguido de uma parte de seu perispírito e deixa a matéria imunda num estado vizinho ao da morte. Digo vizinho ao da morte porque fica no corpo um laço que liga o perispírito e a alma à matéria, e esse laço não pode ser definido. O corpo então aparece no lugar desejado. Creio que é tudo o que desejais saber.

  1. ─ Isto não nos dá a explicação da visibilidade e da tangibilidade do perispírito.

─ Achando-se desprendido da matéria, conforme o seu grau de elevação, o Espírito pode tornar a matéria tangível.

  1. ─ Entretanto, certas aparições tangíveis de mãos e de outras partes do corpo devem-se evidentemente a Espíritos inferiores.

─ São Espíritos superiores que se servem dos inferiores a fim de provar o fato.

  1. ─ O sono do corpo é indispensável para que o Espírito apareça noutros lugares?

─ A alma pode dividir-se quando se sente transportada a um lugar diferente daquele onde se acha o seu corpo.

  1. ─ Que aconteceria a um homem mergulhado em sono profundo e cujo Espírito aparecesse alhures, se fosse despertado subitamente?

─ Isto não aconteceria, porque se alguém tivesse o intuito de despertá-lo, o Espírito preveria a intenção e voltaria ao corpo, tendo em vista que o Espírito lê o pensamento.”

 

*******************************************************

 

CONVERSAS FAMILIARES DE ALÉM-TÚMULO

UMA VIÚVA DE MALABAR (Malabar consiste numa faixa costeira de cerca de 900 quilómetros que se  estende ao longo da costa ocidental da Índia)

“Desejávamos interrogar uma dessas mulheres da Índia, sujeitas ao costume de queimar-se sobre o cadáver do marido. Não conhecendo nenhuma, tínhamos pedido a São Luís que nos enviasse uma em condições de responder às nossas perguntas de maneira satisfatória. Ele nos respondeu que de boa vontade o faria oportunamente. Na sessão da Sociedade, no dia 2 de novembro de 1858, o Sr. Adrien, médium vidente, avistou uma disposta a falar, e da qual nos deu a seguinte descrição:

Olhos negros e grandes, com a esclerótica amarela; rosto arredondado; faces salientes e gordas; pele amarelo-açafrão; cílios longos e supercílios arqueados e negros; nariz um pouco grande, ligeiramente achatado; boca grande e sensual; belos dentes largos e iguais; cabelos lisos, abundantes, negros e empastados de gordura. Corpo bem gordo, grande e atarracado. Roupagem de seda deixando o peito meio descoberto. Pulseiras nos braços e nas pernas.

  1. Lembrai-vos mais ou menos em que época vivestes na Índia e onde fostes queimada com o corpo de vosso marido?

– Ela fez um sinal, indicando que não se lembrava. – S. Luís respondeu, indicando que foi há cerca de cem anos.

  1. ─ Lembrai-vos do nome que tínheis?

─ Fátima.

  1. ─ Que religião professáveis?

─ A maometana.

  1. ─ Mas o Islamismo não proíbe tais sacrifícios?

─ Nasci muçulmana, mas meu marido era da religião de Brahma. Tive que me conformar com o costume da região onde eu morava. As mulheres não se pertencem.

  1. ─ Que idade tínheis quando fostes morta?

─ Creio que vinte anos aproximadamente.

OBSERVAÇÃO: O Sr. Adrien adverte que ela parece ter de vinte e oito a trinta anos, mas que naquele país as mulheres envelhecem mais rapidamente.

  1. ─ Vosso sacrifício foi voluntário?

─ Eu preferia ter-me casado com outro. Pensai bem e compreendereis que todas pensamos do mesmo modo. Segui o costume, mas no fundo teria preferido não fazê-lo. Durante vários dias esperei por outro marido, mas ninguém veio. Então obedeci à lei.

  1. ─ Que sentimento poderia ter ditado essa lei?

─ Ideia supersticiosa. Imaginam que nos queimando agradam à Divindade; que resgatamos as faltas daquele que perdemos e que vamos ajudá-lo a viver feliz no outro mundo.

  1. ─ Vosso marido ficou satisfeito com o vosso sacrifício?

─ Nunca procurei rever o meu marido.

  1. ─ Há mulheres que assim se sacrificam de boa vontade?

─ Há poucas: uma em mil. No fundo elas não desejariam fazê-lo.

  1. ─ O que aconteceu convosco, no momento em que se extinguiu a vida corporal?

─ Perturbação. Senti um escurecimento, depois não sei o que aconteceu. Minhas ideias não ficaram claras senão muito tempo depois. Eu ia a toda parte, entretanto, não via bem. Ainda agora não me sinto completamente lúcida. Terei que passar por muitas encarnações para me elevar, mas não me queimarei mais… Não vejo necessidade de me queimar, de lançar-me no meio das chamas para me elevar…, sobretudo pelas faltas que não cometi. Além disso, aquilo não me agradou. Aliás, eu nunca procurei saber. Teríeis a bondade de orar um pouco por mim? Eu entendo que não há nada como a prece para nos dar coragem a fim de suportarmos as provas que nos são enviadas… Ah! Se eu tivesse fé!

  1. ─ Pedis que oremos por vós, mas nós somos cristãos. Como poderiam nossas preces ser-vos agradáveis?

─ Só há um Deus para todos os homens.

OBSERVAÇÃO: Em várias sessões seguidas, a mesma mulher foi vista entre os Espíritos que as assistiam. Ela disse que vinha para instruir-se. Parece que foi sensível ao interesse por ela demonstrado, porque nos acompanhou em várias outras reuniões e até mesmo na rua.”

 

*******************************************************

  1. – AOS LEITORES DA REVISTA ESPÍRITA

CONCLUSÃO DO ANO DE 1858

“A Revista Espírita acaba de completar o seu primeiro ano e nos sentimos felizes em anunciar que estando doravante sua existência assegurada por um número de assinantes que aumenta dia a dia, sua publicação continuará.

Os testemunhos de simpatia que de toda parte recebemos e o sufrágio (aprovação, adesão) dos homens mais eminentes pelo saber e pela posição social são para nós um encorajamento na tarefa laboriosa que empreendemos. Recebam aqui, pois, aqueles que nos ajudaram na realização de nossa obra, o testemunho de nossa gratidão.

Se não nos tivéssemos defrontado com críticas nem contradições, estaríamos ante um fato inaudito nos fastos da publicidade, principalmente por se tratar da emissão de ideias tão novas. Se, entretanto, de algo nos devemos admirar é de tê-las encontrado tão poucas, em comparação com os sinais de aprovação que nos têm sido dados. Isto, sem dúvida, se deve muito menos ao mérito do escritor do que aos atrativos do próprio assunto tratado e ao crédito que dia a dia conquista nas mais altas camadas da Sociedade; devemo-lo também ─ e disto estamos convencidos ─ à dignidade que sempre temos conservado perante os nossos adversários, deixando que o público julgue entre a moderação, de uma parte, e a inconveniência, de outra.

O Espiritismo avança a passos de gigante pelo mundo inteiro. Diariamente reconquista alguns dissidentes pela força das coisas e se de nossa parte podemos colocar algumas migalhas na balança desse grande movimento que se opera e que marcará a nossa época como uma era nova, não será irritando ou mesmo atacando de frente aqueles mesmos que desejamos atrair, mas será pelo raciocínio e não pelas injúrias que nos faremos escutar.

A tal respeito dão-nos os Espíritos superiores, que nos assistem, o preceito e o exemplo. Seria indigno de uma doutrina que não prega senão o amor e a benevolência, descer à arena do personalismo. Deixamos essa tarefa aos que não a compreendem.

Nada, pois, nos desviará da linha que temos seguido, da calma e do sangue-frio que não deixaremos de manter no exame raciocinado de todas as questões, de vez que sabemos que assim conquistamos mais partidários sérios para o Espiritismo do que pela aspereza e pela acrimônia.

Na introdução com que abrimos o primeiro número traçamos o plano que nos propúnhamos seguir: citar os fatos, mas também analisá-los e submetê-los ao escalpelo da observação; apreciá-los e deduzir-lhes as consequências.

No início, toda a atenção se concentrou nos fenômenos materiais, que então alimentavam a curiosidade pública, mas essa tem o seu tempo; uma vez satisfeita, deixamo-la de lado, assim como a criança que abandona um brinquedo. Então os Espíritos nos disseram:

“Este é o primeiro período; em breve passará, para dar lugar a ideias mais elevadas. Novos fatos revelar-se-ão, marcando um novo período, o filosófico, e a doutrina crescerá em pouco tempo, como a criança que deixa o seu berço. Não vos inquieteis com as zombarias, pois zombarão dos próprios zombeteiros e amanhã encontrareis defensores zelosos entre os mais ardorosos adversários de hoje. Deus quer que seja assim e nós somos encarregados de executar a sua vontade. A má vontade de alguns homens não prevalecerá contra ela. O orgulho daqueles que querem saber mais que Deus será abatido.”

Efetivamente, estamos longe das mesas girantes, que já não divertem, porque tudo cansa. Só não nos cansamos daquilo que fala ao nosso entendimento, e o Espiritismo navega a velas pandas em seu segundo período. Todos compreenderam que é toda uma Ciência que se funda, toda uma Filosofia, toda uma nova ordem de ideias. Era preciso acompanhar esse movimento. Mais do que isso, era preciso dar-lhe nossa contribuição, sob pena de sermos em breve ultrapassados. Eis por que nos esforçamos por nos mantermos à altura, sem nos fecharmos nos estreitos limites de um boletim anedótico.

Elevando-se ao plano de uma doutrina filosófica, o Espiritismo conquistou inúmeros aderentes, mesmo entre aqueles que jamais testemunharam um fato material. É porque o homem aprecia aquilo que lhe fala à razão, aquilo que ele pode compreender. Na filosofia espírita ele encontra alguma coisa diferente de um divertimento, alguma coisa que preenche o vazio pungente da sua incerteza. Penetrando no mundo extracorporal por meio da observação, quisemos nele introduzir os nossos leitores e fazer com que o compreendessem. Cabe-lhes dizer se atingimos o nosso objetivo.

Prosseguiremos em nossa tarefa no ano que se vai iniciar e que, tudo o prenuncia, será fecundo. Novos fatos de uma ordem estranha surgem neste momento e nos revelam novos mistérios. Registrá-los-emos cuidadosamente e neles procuraremos a luz com tanta perseverança quanto no passado, porque tudo pressagia que o Espiritismo vai entrar numa nova fase, mais grandiosa e ainda mais sublime. ALLAN KARDEC”

 

FONTES:

– REVISTA ESPÍRITA – ANO I – 1858.

– REVISTA ESPÍRITA, ÍNDICE GERAL – 1858 – 1869.                  

– OBRAS PÓSTUMAS, 33ª. Ed., Rio de Janeiro: FEB, 2003. p. 294.

 

 

Share This Post!

Intuição – palestra 25.5.22

Alergia e Obsessão – Dias da Cruz

Pesquisar Assunto

Categorias

Tópicos recentes

  • Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho, palestra 25.01.23
  • Os 12 Apóstolos e sua Personalidades – palestra 28.12.22
  • Obsessão e Desobsessão por Manoel Philomeno de Miranda – palestra 30.11.22
  • Do Orgulho à Humildade, palestra 28.9.22
  • Imposição de Mãos

Arquivos

  • fevereiro 2023
  • janeiro 2023
  • dezembro 2022
  • outubro 2022
  • agosto 2022
  • julho 2022
  • maio 2022
  • abril 2022
  • março 2022
  • janeiro 2022
  • novembro 2021
  • outubro 2021
  • agosto 2021
  • julho 2021
  • maio 2021
  • abril 2021
  • março 2021
  • janeiro 2021
  • novembro 2020
  • outubro 2020
  • agosto 2020
  • junho 2020
  • maio 2020
  • abril 2020
  • fevereiro 2020
  • dezembro 2019
  • novembro 2019
  • outubro 2019
  • setembro 2019
  • agosto 2019
  • julho 2019
  • maio 2019
  • março 2019
  • janeiro 2019
  • novembro 2018
  • outubro 2018
  • setembro 2018
  • julho 2018
  • junho 2018
  • maio 2018
  • março 2018
  • fevereiro 2018
  • janeiro 2018
  • novembro 2017
  • outubro 2017
  • julho 2017
  • junho 2017
  • maio 2017
  • março 2017
  • julho 2016
  • junho 2016
  • maio 2016
  • abril 2016
  • fevereiro 2016
  • janeiro 2016
  • novembro 2015
  • outubro 2015
  • setembro 2015
  • julho 2015
  • junho 2015
  • maio 2015
  • abril 2015
  • março 2015
  • fevereiro 2015
  • janeiro 2015
  • dezembro 2014
  • novembro 2014
  • outubro 2014
  • setembro 2014
  • agosto 2014
  • julho 2014
  • junho 2014
  • maio 2014
  • abril 2014
  • fevereiro 2014
  • janeiro 2014
  • dezembro 2013
  • novembro 2013
  • setembro 2013
  • junho 2013
  • maio 2013
  • março 2013
  • fevereiro 2013
  • janeiro 2013
  • dezembro 2012
  • outubro 2012
  • junho 2012
  • abril 2012
  • março 2012
  • fevereiro 2012
  • janeiro 2012
  • dezembro 2011
  • novembro 2011
  • outubro 2011
  • setembro 2011
  • junho 2011
  • maio 2011
  • abril 2011
  • fevereiro 2011
  • janeiro 2011
  • dezembro 2010
  • setembro 2009
  • março 2009
  • fevereiro 2009
  • agosto 2008
  • março 2008
Conhecer o Passado, Trabalhar no Presente e Construir o Futuro
O espiritismo não será a religião do futuro, e sim o futuro das religiões.
Copyright CELC