O Porque das Infelicidades e Decepções (L.E.)
Livro dos Espíritos
852 – Há pessoas que uma fatalidade parece perseguir, independentemente de sua maneira de agir; a infelicidade não está no seu destino?
– Pode ser que sejam provas que elas devem suportar e que escolheram. Mas, ainda uma vez, levais à conta do destino o que não é, o mais freqüentemente, senão a conseqüência de vossa própria falta. Nos males que te afligem, esforça-te para que a tua consciência seja pura, e serás consolado em parte.
862 – Há pessoas para as quais nada sai bem, e que um mau gênio parece perseguir em todas suas empreitadas; não há nisso o que se pode chamar fatalidade?
– Há fatalidade, se a queres chamar assim; ela, porém, se prende à escolha do gênero de existência, porque essas pessoas quiseram ser experimentadas por uma vida de decepção, a fim de exercitar sua paciência e sua resignação. Entretanto, não creiais que essa fatalidade seja absoluta; freqüentemente, ela é o resultado de um caminho falso que tomaram, e que não está em relação com sua inteligência e suas aptidões. Aquele que quer atravessar um rio a nado, sem saber nadar, tem grande chance de se afogar; assim é na maior parte dos acontecimentos da vida. Se o homem não empreendesse senão coisas compatíveis com suas faculdades, ele teria êxito quase sempre; o que o perde é seu amor-próprio e sua ambição que o fazem sair de seu caminho e tomar, por uma vocação, o desejo de satisfazer certas paixões. Ele fracassa e a culpa é sua; mas, em lugar de tomá-la sobre si, prefere acusar sua estrela. Tal seria um bom operário e ganharia honradamente sua vida, que seria um mau poeta e morreria de fome. Haveria lugar para todos, se cada um soubesse se colocar no seu lugar.
864 – Se há pessoas às quais a sorte é contrária, outras parecem ser favorecidas, porque tudo lhes sai bem; a que se prende isso?
– Freqüentemente, é porque elas sabem escolher melhor; mas isso pode ser também um gênero de provas, pois o sucesso as embriaga e confiam-se ao seu destino, pagando, no geral, mais tarde, esses mesmos sucessos por cruéis revezes que poderiam evitar com a prudência.
932 – Por que, no mundo, os maus, tão freqüentemente, sobrepujam os bons em influência?
– Pela fraqueza dos bons; os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o quiserem, dominarão.
933 – Se o homem, freqüentemente, é o artífice dos seus sofrimentos materiais, não ocorre o mesmo com os sofrimentos morais?
– Mais ainda, porque os sofrimentos materiais, algumas vezes são independentes da vontade; mas o orgulho ferido, a ambição frustrada, a ansiedade da avareza, a inveja, o ciúme, todas as paixões, em uma palavra, são torturas da alma.
A inveja e o ciúme! Felizes aqueles que não conhecem esses dois vermes roedores! Com a inveja e o ciúme, não há calma nem repouso possível para aquele que está atacado desse mal: os objetos de sua cobiça, de seu ódio, de seu despeito, se levantam diante dele como fantasmas que não lhe dão nenhuma trégua e o perseguem até no sono. Os invejosos e os ciumentos estão num estado de febre contínua. Portanto, está aí uma situação desejável e não compreendeis que, com suas paixões, o homem criou para si suplícios voluntários, e a Terra torna-se para ele um verdadeiro inferno?
708 – Não há situações em que os meios de existência não dependem de modo algum, da vontade do homem, e onde a privação do necessário, o mais imperioso, é uma conseqüência da força das coisas?
– É uma prova, freqüentemente cruel, que deve suportar, e à qual ele sabia que estaria exposto. Seu mérito está em sua submissão à vontade de Deus, se sua inteligência não lhe fornece nenhum meio de se livrar dos empeços. Se a morte o deve alcançar, deve submeter-se a ela, sem murmurar e pensando que a hora da verdadeira libertação chegou e que o desespero do último momento pode fazê-lo perder o fruto de sua resignação.
909 – O homem poderia sempre vencer suas más tendências pelos seus esforços?
– Sim, e, algumas vezes, por fracos esforços. É a vontade que lhe falta. Ah! quão poucos dentre vós fazem esforços!
551 – Pode um homem mau, com a ajuda de um mau Espírito que lhe é devotado, fazer mal ao seu próximo?
– Não, Deus não o permitiria.
557 – A bênção e a maldição podem atrair o bem e o mal sobre aqueles que são o seu objeto?
– Deus não escuta uma maldição injusta, e aquele que a pronuncia é culpado aos seus olhos. Como temos os dois gênios opostos, o bem e o mal, ela pode ter uma influência momentânea, mesmo sobre a matéria, mas essa influência não ocorre senão pela vontade de Deus e como acréscimo de prova para aquele que é dela objeto. De resto, o mais freqüentemente, se maldizem os maus e se bendizem os bons. A bênção e a maldição não podem jamais desviar a Providência do caminho da justiça; ela não atinge o maldito senão se é mau, e sua proteção não cobre senão aquele que a merece.