As Penas
Quando pequenas, minha irmã e eu éramos muito sonhadoras. O sonho e a imaginação se conjugam muito bem. E, de quando em vez, inventávamos histórias sobre nossas companheiras. Essas histórias se transformavam em boatos que, em uma cidade pequena, terminavam por provocar dissabores e desagradáveis incidentes entre nossa família e a vizinhança. Na verdade, não fazíamos aquilo por mal, mas, naturalmente, enquanto dávamos rédeas soltas à nossa fantasia os desagradáveis incidentes se multiplicavam.
E, de cada vez que um desses episódios se repetia, corríamos para nossa mãe e dizíamos:
_ Mamãe, nós prometemos reparar o mal que fizemos.
Minha mãe, com certeza, percebia que castigos e reprimendas não corrigiriam os excessos de nossas mentes. Ela nos ouvia com atenção, assentia com a cabeça e não dizia nada.
Lembro-me muito bem de certa manhã, antes do inverno chegar. Ventava muito e nós brincávamos no galpão. Entretanto mamãe, com os cabelos dançando em torno de sua bonita cabeça, estava sentada em um tamborete, ao aberto, bem no meio do quintal.
Aquilo nos intrigou um pouco, porém logo nos distraímos.
Nossa atenção voltou a ser despertada quando ela nos chamou:
_ Filhas, por favor, venham até aqui. Aí, perto de vocês, há uma almofada e uma tesoura. Tragam-mas.
Nós atendemos. Mas fazíamos um indagação: o que mamãe estava pretendendo fazer?
_ Agora, disse mamãe quando colocamos os dois objetos junto dela, vocês vão cortar a almofada ao meio. Cada uma cortará de um lado.
Obedecemos. A almofada estava cheia de penas e, logo em seguida, levadas pelo vento, elas enchiam o quintal num espetáculo tão lindo como uma tempestade de neve. Eu e minha irmã pulávamos e rodopiávamos encantadas com o espetáculo imprevisto.
Todavia, mamãe tornou a nos chamar. Junto dela estava a sua cesta de costura, que nem tínhamos visto. Foi lá de dentro que ela tirou uma capa de almofada nova, bordada e vazia.
_ Olhem, disse ela, agora vocês vão encher de novo esta almofada.
Era simplesmente incrível o que mamãe estava propondo. E nós redargüimos:
_ Mas, isso é impossível, as penas voaram por toda parte.
_ Não é que foi mesmo! disse mamãe dando a impressão de estar admirada, enquanto olhava as penas que dançavam no vento.
E fez, em seguida, um comentário que eu e minha irmã não pudemos esquecer durante toda a vida:
_ Essas penas parecem os boatos que certas pessoas propagam: uma vez espalhados, não há meios de fazê-los voltar ao ponto de partida.
Eu, pessoalmente, quando me sinto inclinada a repetir comentários e rumores ouvidos, lembro-me sempre daquelas penas soltas no vento e que, de nenhuma forma poderíamos tornar a recolher para uma nova almofada.
DA OBRA: “E, PARA O RESTO DA VIDA…” DE: WALLACE LEAL V. RODRIGUES