Por que a dor é necessária? – palestra 30.3.22
POR QUE A DOR É NECESSÁRIA?
CELC – 30.03.22 – Ananda
Introdução
No dicionário Michaelis encontramos duas definições para a dor:
– Sensação desagradável ou penosa, de intensidade variável, causada por um estado anômalo do organismo ou parte dele e mediada pela estimulação de fibras nervosas que levam os impulsos dolorosos para o cérebro; sofrimento físico.
– Estado de espírito caracterizado por decepção, desgosto ou desgraça; sofrimento moral; decepção, dissabor, mágoa.
Platão disse: “A dor não surge apenas por estimulação periférica, mas também por uma experiência da alma, que reside no coração.”
Quando escolhi esse tema, pensei em titular esse estudo com – A dor é mesmo necessária? – Mas refletindo, pensei que assim como tudo nessa vida, se ela existe e se Deus a permite, é porque tem alguma necessidade… e por isso intitulei com o porquê ela é necessária.
Porém, ninguém gosta de sentir dor né? E como seria se não houvesse a dor?
A analgesia congênita ou insensibilidade congênita à dor, é uma doença rara e incurável, que faz com que o indivíduo não sinta nenhum tipo de dor, não percebam as diferenças de temperatura, podendo se queimar com facilidade, e embora eles sejam sensíveis ao tato, são incapazes de sentir dor física sendo propensos a graves lesões, até mesmo esmagamento de membros. Como a pessoa não sente dor, doenças progridem e se agravam, sendo descobertas numa fase avançada.
Na faculdade de Farmácia, aprendi que a dor é um sintoma protetor em que o corpo se utiliza para sinalizar que tem algo errado, uma enfermidade, uma doença, um desequilíbrio, ou para proteger a integridade do organismo, por ex. quando as articulações são utilizadas de forma extrema. E que o uso indiscriminado dos fármacos é prejudicial, pois muitas vezes mascaram doenças e enfermidades, ou seja, na Sociedade do Analgésico, que vivemos hoje, onde o imediatismo impera, a dor é apenas um empecilho que deve ser sanado o mais rápido possível, prorrogando e piorando um quadro que poderia ser tratado sem grandes danos.
No âmbito das dores morais, não é muito diferente. Sabemos quão prejudicial se torna para o crescimento de um filho, a superproteção de pais que fazem de tudo por impedir qualquer decepção ou obstáculos na vida dos filhos, quando na verdade estão lhes privando do exercício, do aprendizado e quando chegam a vida adulta, não conseguem se posicionar e enfrentar a vida real!
Um sábio proverbio chinês já dizia: “Quando não entendemos a dor, ela nos dilacera. Quando entendemos seus fins, ela nos aperfeiçoa.”
O objetivo desse estudo é buscar compreender a necessidade da dor nesse planeta, para que possamos através de um maior conhecimento, aceitar com resignação os desígnios do Senhor para nossas vidas, enfrentar com fé, coragem e amor aquilo que precisamos mudar dentro de nós mesmos para assim evoluirmos e nos reeducarmos.
No site do Leocádio, tem um artigo da Revista Internacional de Espiritismo 05/2008 – Waldehir Bezerra de Almeida que diz:
“Os sábios da Antiguidade grega teorizaram sobre a natureza da dor e formas de evitá-la ou minimizar a sua ação. Platão (427-347 a.C.) afirmou que “A dor ocorre quando a proporção ou a harmonia dos elementos que compõem o ser vivo é ameaçada ou comprometida”. Assim, segundo o discípulo de Sócrates, vivendo em harmonia consigo mesmo e com a Natureza o homem se livra da dor. Epicuro (341-270 a.C.) admitia que a dor era uma consequência da busca do prazer vulgar e desmesurado. Zenon de Cicio (334-262 a.C.), fundador do estoicismo, ensinava que as paixões são as causas do sofrimento e que, para evitá-lo, deveria o homem seguir a natureza, aceitando o destino e conservando a serenidade em qualquer circunstância. O judaísmo, por sua vez, entendia a dor como um castigo divino pela desobediência, resquício de um impiedoso atavismo do “pecado original”. Quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, Jeová castigou a mulher a dar à luz com dor e ao homem a ganhar o pão com o suor de seu rosto. A história de Jó, no Antigo Testamento, é forte testemunho desse complexo de culpa. Jesus desenvolveu esforços para desfazer essa concepção de dor-castigo, quando bem-aventurou os aflitos, assinalando que o sofrimento seria oportunidade de purificação da alma.
Durante a Idade Média, os homens, interpretando mal a dinâmica da vida, aplicavam a dor como instrumento de justiça e de repressão, submetendo os condenados a sessões de torturas públicas, acreditando que assim educaria o povo a obedecer às ordens emanadas do Estado e da Igreja. Fortalecida pela Igreja, a cultura judaico-cristã insistia que a doença era um castigo divino ou forma de advertência ao povo pecador. Doenças incuráveis à época, tal como a lepra, e as epidemias que assolavam milhares de vidas, enquadravam-se na visão de um deus antropomórfico caprichoso e vingativo que refletia as características morais do homem medieval, que não via as causas daqueles flagelos na falta de saneamento básico, na alimentação inadequada e no descuido com a higiene pessoal. No início do século XVIII houve um salto e o filósofo inglês Alexander Pope (1688-1744) ensinava que se deveria considerar a dor individual como um sofrimento parcial a serviço de um bem universal, alertando, sem dúvida, para os cuidados que se deveriam ter no alastramento das infecções. O Arquidiácono William Paley (1743-1805) pensava da mesma forma: administrava aos estudantes de Cambridge que a dor de um era um mal menor, destinado a proteger a humanidade de um mal muito maior. Exemplificava que uma doença nos dedos dos pés era uma advertência providencial para reduzir o consumo de álcool, que posteriormente poderia provocar uma crise de gota. Aqui, nos parece uma referência à dor-auxílio, de que André Luiz vem conceituar muito bem.”
Dor na visão da Doutrina
Vamos iniciar esse estudo da dor na visão da doutrina, com a questão 241 do livro O Consolador:
— Onde o maior auxílio para nossa redenção espiritual?
- No Trabalho de nossa redenção individual ou coletiva, a dor é sempre o elemento amigo e indispensável. E a redenção de um Espírito encarnado, na Terra, consiste no resgate de todas as suas dívidas, com a consequente aquisição de valores morais passíveis de serem conquistados nas lutas planetárias, situação essa que eleva a personalidade espiritual a novos e mais sublimes horizontes na vida do Infinito.
Entre a Terra e o Céu, obra De André Luiz, no capítulo 21, item 2 temos:
“A dor é o grande e abençoado remédio. Reeduca-nos a atividade mental, reestruturando as peças de nossa instrumentação e polindo os fulcros anímicos de que se vale a nossa inteligência para desenvolver-se na jornada para a vida eterna. Depois do poder de Deus, é a única força capaz de alterar o rumo de nossos pensamentos, compelindo-nos a indispensáveis modificações, com vistas ao Plano Divino, a nosso respeito, e de cuja execução não poderemos fugir sem graves prejuízos para nós mesmos.”
No Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap XVII, item 7 temos o esclarecimento que nos comove a pensar como Deus é perfeito em todas as coisas:
“Deus criou todos os homens iguais para a dor; pequenos ou grandes, ignorantes ou instruídos, sofrem todos pelos mesmos motivos, a fim de que cada um pese judiciosamente o mal que pode fazer. Não existe o mesmo critério para o bem, que é infinitamente mais variado nas suas expressões. A igualdade em relação à dor é uma sublime previsão de Deus, que quer que os seus filhos, instruídos pela experiência comum, não cometam o mal desculpando-se com a ignorância dos seus efeitos”.
O sofrimento é a forma que expressamos a dor que sentimos, portanto, podemos sofrer as mesmas dores diante das situações, mas o sofrimento pode ser muito distinto, para uns pode ser tolerável e para outros insuportável.
Veja o que nos diz Léon Denis no livro O problema do ser, do destino e da dor, no cap XXVI:
“Epicteto dizia: “As coisas são apenas o que imaginamos que são.” Assim, pela vontade podemos domar, vencer a dor ou, pelo menos, fazê-la redundar em nosso proveito, fazer dela meio de elevação.
A ideia que fazemos da felicidade e da desgraça, da alegria e da dor, varia ao infinito segundo a evolução individual. A alma pura, boa e sábia não pode ser feliz à maneira da alma vulgar. O que encanta uma deixa a outra indiferente. À medida que se sobe, o aspecto das coisas muda. Como a criança que, crescendo, deixa de lado os brinquedos que a cativaram, a alma que se eleva procura satisfações cada vez mais nobres, graves e profundas. O Espírito que julga com superioridade e considera o fim grandioso da vida achará mais felicidade, mais serena paz num belo pensamento, numa boa obra, num ato de virtude e até na desgraça que purifica, do que em todos os bens materiais e no brilho das glórias terrestres, porque estas o perturbam, corrompem, embriagam ficticiamente.
É muito difícil fazer entender aos homens que o sofrimento é bom. Cada qual quereria refazer e embelezar a vida à sua vontade, adorná-la com todos os deleites, sem pensar que não há bem sem dor, ascensão sem suores e esforços.
A tendência geral consiste em fecharmo-nos no estreito círculo do individualismo, do cada um por si; por essa forma, o homem abate-se, reduz a estreitos limites tudo quanto nele é grande, tudo que está destinado a desenvolver-se, a estender-se, a dilatar-se, a desferir voo: o pensamento, a consciência, numa palavra, toda a sua alma. Ora, os gozos, os prazeres e a ociosidade estéril não fazem mais do que apertar esses limites, acanhar nossa vida e nosso coração. Para quebrar esse círculo, para que todas as virtudes ocultas se expandam à luz, é necessária a dor.”
Então a forma como enfrentamos a dor/sofrimento denota nossa evolução espiritual, devemos, portanto nos esforçar, compreendendo melhor o sentido da dor, para dessa forma aceitá-la como bênção e não como infortúnio, deixando de nos revoltar e perdendo assim o objetivo da mesma.
Me chamou a atenção quando ele diz que a dor é necessária para que todas as virtudes ocultas se expandam à luz e eu ouvi isso numa palestra, onde foi acrescentado também as habilidades. Não é perfeito?
Podemos entender melhor nos próximos parágrafos no mesmo cap desta obra:
“O primeiro movimento do homem infeliz é revoltar-se sob os golpes da sorte. Mais tarde, porém, depois de o Espírito ter subido os aclives e quando contempla o escabroso caminho percorrido, o desfiladeiro movediço de suas existências, é com um enternecimento alegre que se lembra das provas, das tribulações com cujo auxílio pôde alcançar o cimo. Se, nas horas da provação, soubéssemos observar o trabalho interno, a ação misteriosa da dor em nós, em nosso “eu”, em nossa consciência, compreenderíamos melhor sua obra sublime de educação e aperfeiçoamento. Veríamos que ela fere sempre a corda sensível. A mão que dirige o cinzel é a de um artista incomparável, que não se cansa de trabalhar, enquanto não tem arredondado, polido, desbastado as arestas de nosso caráter. Para isso voltará tantas vezes à carga quantas sejam necessárias. E, sob a ação das marteladas repetidas, forçosamente a arrogância e a personalidade excessiva hão de cair nesse indivíduo; a moleza, a apatia e a indiferença desaparecerão em outro; a dureza, a cólera e o furor, num terceiro. Para todos terá processos diferentes, infinitamente variados segundo os indivíduos, mas em todos agirá com eficácia, de modo a provocar ou desenvolver a sensibilidade, a delicadeza, a bondade, a ternura, a fazer sair das dilacerações e das lágrimas alguma qualidade desconhecida que dormia silenciosa no fundo do ser ou então uma nobreza nova, adorno da alma, para sempre adquirida.
Quanto mais a alma se eleva, cresce, se faz bela, tanto mais a dor se espiritualiza e torna sutil. Os maus precisam de numerosas operações como as árvores de muitas flores para produzirem alguns frutos. Porém, quanto mais o ser humano se aperfeiçoa, tanto mais admiráveis se tornam nele os frutos da dor. Às almas gastas, mal desbastadas, tocam os sofrimentos físicos, as dores violentas; às egoístas, às avarentas hão de caber as perdas de fortuna, as negras inquietações, os tormentos do espírito. Depois, aos seres delicados, às mães, às filhas, às esposas, as torturas ocultas, as feridas do coração. Aos nobres pensadores, aos inspiradores, a dor sutil e profunda que faz brotar o grito sublime, o relâmpago do gênio!
Assim, por trás da dor, há alguém invisível que lhe dirige a ação e a regula segundo as necessidades de cada um, com uma arte, uma sabedoria infinita, trabalhando por aumentar nossa beleza interior nunca acabada, sempre continuada, de luz em luz, de virtude em virtude, até que nos tenhamos convertido em Espíritos celestes. Por mais admirável que possa parecer à primeira vista, a dor é apenas um meio de que usa o Poder Infinito para nos chamar a si e, ao mesmo tempo, tornar-nos mais rapidamente acessíveis à felicidade espiritual, única duradoura. É, pois, realmente, pelo amor que nos tem, que Deus envia o sofrimento. Fere-nos, corrige-nos como a mãe corrige o filho para educá-lo e melhorá-lo; trabalha incessantemente para tornar dóceis, purificar e embelezar nossas almas, porque elas não podem ser verdadeiras, completamente felizes, senão na medida correspondente às suas perfeições. Para isso pôs Deus, nesta terra de aprendizagem, ao lado das alegrias raras e fugitivas, dores frequentes e prolongadas, para nos fazer sentir que o nosso mundo é um lugar de passagem e não o ponto de chegada. Gozos e sofrimentos, prazeres e dores, tudo isso Deus distribuiu na existência como um grande artista que, na tela, combina a sombra e a luz para produzir uma obra-prima.”
Creio que através das passagens desse livro tão maravilhoso, pudemos compreender a importância da dor, e então partiremos por estudá-la, propriamente.
Perispírito
Antes de darmos continuidade ao estudo, acho de supra importância fazer algumas considerações sobre o perispírito, para que possamos seguir com a certeza do entendimento.
Peri = em torno e Spiritus = espírito, logo já se diz que é algo em torno do espírito. De fato, chamado também de corpo etéreo, trata-se de uma capa semimaterial que reveste o espírito e que é revestido pelo corpo físico enquanto encarnados.
Como o conteúdo de um fruto, faz o papel de revestir a semente e assimilar as informações dos nutrientes que ali estão. Indo mais além, é o que define a individualidade de cada espírito, assim como é a impressão digital para o corpo, trata-se do perispírito em sua plenitude.
Composto de matéria etérea, é fluídica e vaporosa aos olhos encarnados. No entanto, para aqueles que já se encontram no plano espiritual, tal substância ainda pode assumir um aspecto grosseiro, se depura conforme o tempo e é constituído do fluído cósmico universal, porém modificado de acordo com as necessidades físicas e espirituais de cada planeta no universo.
O envoltório se modifica conforme o espírito evolui e passa a apresentar uma aparência cada vez mais leve, sendo que, aos seres puros, seja imperceptível identificar sua existência.
A aparência do perispírito em seu estado de desencarne, pode ser moldada pelo próprio espírito, sendo que, geralmente, costuma assumir a última forma de seu corpo físico.
“Pode-se dizer que o corpo recebe a impressão, o perispírito a transmite, e o Espírito, que é o ser sensível e inteligente, a recebe. Quando o ato é de iniciativa do Espírito, pode dizer-se que o Espírito quer, o perispírito transmite e o corpo executa.” (Obras Póstumas, primeira parte, item 10).
E para o nosso estudo, o mais importante é compreender que todas as nossas atitudes ficam impressas nele, como diz Haroldo Dutra Dias, o espírito seria uma espécie de fotógrafo e cada gesto de bondade ou maldade é a foto registrada pelo perispírito.
Falando desse tema, não vejo como não nos remeter ao Ensaio Teórico sobre a sensação nos Espíritos, no Livro dos Espíritos questão 257, observem como ele inicia a questão:
“O corpo é o instrumento da dor. Se não é a causa primária desta é, pelo menos, a causa imediata. A alma tem a percepção da dor: essa percepção é o efeito. A lembrança que da dor a alma conserva pode ser muito penosa, mas não pode ter ação física. De fato, nem o frio, nem o calor são capazes de desorganizar os tecidos da alma, que não é suscetível de congelar-se, nem de queimar-se. Não vemos todos os dias a recordação ou a apreensão de um mal físico produzirem o efeito desse mal, como se real fora? Não as vemos até causar a morte? Toda gente sabe que aqueles a quem se amputou um membro costumam sentir dor no membro que lhes falta. Certo que aí não está a sede, ou, sequer, o ponto de partida da dor. O que há, apenas, é que o cérebro guardou desta a impressão…
…O perispírito é o laço que à matéria do corpo prende o Espírito, que o tira do meio ambiente, do fluido universal. Participa ao mesmo tempo da eletricidade, do fluido magnético e, até certo ponto, da matéria inerte. Poder-se-ia dizer que é a quintessência da matéria. (Quinta essência – é uma alusão à Aristóteles, que considerava que o universo era composto de quatro elementos principais – terra, água, ar e fogo-, mais um quinto elemento, uma substância etérea que permeava tudo e impedia os corpos celestes de caírem sobre a Terra.) É o princípio da vida orgânica, porém, não o da vida intelectual, que reside no Espírito. É, além disso, o agente das sensações exteriores. No corpo, os órgãos, servindo-lhes de condutos, localizam essas sensações. Destruído o corpo, elas se tornam gerais. Daí o Espírito não dizer que sofre mais da cabeça do que dos pés, ou vice-versa.
Não se confundam, porém, as sensações do perispírito, que se tornou independente, com as do corpo. Estas últimas só por termo de comparação as podemos tomar e não por analogia. Liberto do corpo, o Espírito pode sofrer, mas esse sofrimento não é corporal, embora não seja exclusivamente moral, como o remorso, pois que ele se queixa de frio e calor. Também não sofre mais no inverno do que no verão: temo-los visto atravessar chamas, sem experimentarem qualquer dor. Nenhuma impressão lhes causa, conseguintemente, a temperatura. A dor que sentem não é, pois, uma dor física propriamente dita: é um vago sentimento íntimo, que o próprio Espírito nem sempre compreende bem, precisamente porque a dor não se acha localizada e porque não a produzem agentes exteriores; é mais uma reminiscência do que uma realidade, reminiscência, porém, igualmente penosa. Algumas vezes, entretanto, há mais do que isso, como vamos ver…
…Durante a vida, o corpo recebe impressões exteriores e as transmite ao Espírito por intermédio do perispírito, que constitui, provavelmente, o que se chama fluido nervoso. Uma vez morto, o corpo nada mais sente, por já não haver nele Espírito, nem perispírito. Este, desprendido do corpo, experimenta a sensação, porém, como já não lhe chega por um conduto limitado, ela se lhe torna geral. Ora, não sendo o perispírito, realmente, mais do que simples agente de transmissão, pois que no Espírito é que está a consciência, lógico será deduzir-se que, se pudesse existir perispírito sem Espírito, aquele nada sentiria, exatamente como um corpo que morreu. Do mesmo modo, se o Espírito não tivesse perispírito, seria inacessível a toda e qualquer sensação dolorosa. É o que se dá com os Espíritos completamente purificados. Sabemos que quanto mais eles se purificam, tanto mais etérea se torna a essência do perispírito, donde se segue que a influência material diminui à medida que o Espírito progride, isto é, à medida que o próprio perispírito se torna menos grosseiro…
…Dizendo que os Espíritos são inacessíveis às impressões da matéria que conhecemos, referimo-nos aos Espíritos muito elevados, cujo envoltório etéreo não encontra analogia neste mundo. Outro tanto não acontece com os de perispírito mais denso, os quais percebem os nossos sons e odores, não, porém, apenas por uma parte limitada de suas individualidades, conforme lhes sucedia quando vivos. Pode-se dizer que, neles, as vibrações moleculares se fazem sentir em todo o ser e lhes chegam assim ao sensorium commune, que é o próprio Espírito, embora de modo diverso e talvez, também, dando uma impressão diferente, o que modifica a percepção. Eles ouvem o som da nossa voz, entretanto nos compreendem sem o auxílio da palavra, somente pela transmissão do pensamento. Em apoio do que dizemos há o fato de que essa penetração é tanto mais fácil, quanto mais desmaterializado está o Espírito. Pelo que concerne à vista, essa, para o Espírito, independe da luz, qual a temos. A faculdade de ver é um atributo essencial da alma, para quem a obscuridade não existe. É, contudo, mais extensa, mais penetrante nas mais purificadas. A alma, ou o Espírito, tem, pois, em si mesma, a faculdade de todas as percepções. Estas, na vida corpórea, se obliteram pela grosseria dos órgãos do corpo; na vida extracorpórea, se vão desanuviando, à proporção que o invólucro semimaterial se eteriza.
Haurido do meio ambiente, esse invólucro varia de acordo com a natureza dos mundos. Ao passarem de um mundo a outro, os Espíritos mudam de envoltório, como nós mudamos de roupa, quando passamos do inverno ao verão, ou do polo ao equador. Quando vêm visitar-nos, os mais elevados se revestem do perispírito terrestre e então suas percepções se produzem como no comum dos Espíritos. Todos, porém, assim os inferiores como os superiores, não ouvem, nem sentem, senão o que queiram ouvir ou sentir. Não possuindo órgãos sensitivos, eles podem, livremente, tornar ativas ou nulas suas percepções. Uma só coisa são obrigados a ouvir – os conselhos dos Espíritos bons. A vista, essa é sempre ativa; mas, eles podem fazer-se invisíveis uns aos outros. Conforme a categoria que ocupem, podem ocultar-se dos que lhes são inferiores, porém não dos que lhes são superiores. Nos primeiros instantes que se seguem à morte, a visão do Espírito é sempre turvada e confusa. Aclara-se, à medida que ele se desprende, e pode alcançar a nitidez que tinha durante a vida terrena, independentemente da possibilidade de penetrar através dos corpos que nos são opacos. Quanto à sua extensão através do espaço indefinido, do futuro e do passado, depende do grau de pureza e de elevação do Espírito.
Objetarão, talvez: toda esta teoria nada tem de tranquilizadora. Pensávamos que, uma vez livres do nosso grosseiro envoltório, instrumento das nossas dores, não mais sofreríamos e eis nos informais de que ainda sofreremos. Desta ou daquela forma, será sempre sofrimento. Ah! sim, pode dar-se que continuemos a sofrer, e muito, e por longo tempo, mas também que deixemos de sofrer, até mesmo desde o instante em que se nos acabe a vida corporal.
Os sofrimentos deste mundo independem, algumas vezes, de nós; muito mais vezes, contudo, são devidos à nossa vontade. Remonte cada um à origem deles e verá que a maior parte de tais sofrimentos são efeitos de causas que lhe teria sido possível evitar. Quantos males, quantas enfermidades não deve o homem aos seus excessos, à sua ambição, numa palavra: às suas paixões? Aquele que sempre vivesse com sobriedade, que de nada abusasse, que fosse sempre simples nos gostos e modesto nos desejos, a muitas tribulações se forraria. O mesmo se dá com o Espírito. Os sofrimentos por que passa são sempre a consequência da maneira por que viveu na Terra. Certo já não sofrerá mais de gota, nem de reumatismo; no entanto, experimentará outros sofrimentos que nada ficam a dever àqueles. Vimos que seu sofrer resulta dos laços que ainda o prendem à matéria; que quanto mais livre estiver da influência desta, ou, por outra, quanto mais desmaterializado se achar, menos dolorosas sensações experimentará. Ora, está nas suas mãos libertar-se de tal influência desde a vida atual. Ele tem o livre-arbítrio, tem, por conseguinte, a faculdade de escolha entre o fazer e o não fazer. Dome suas paixões animais; não alimente ódio, nem inveja, nem ciúme, nem orgulho; não se deixe dominar pelo egoísmo; purifique-se, nutrindo bons sentimentos; pratique o bem; não ligue às coisas deste mundo importância que não merecem; e, então, embora revestido do invólucro corporal, já estará depurado, já estará liberto do jugo da matéria e, quando deixar esse invólucro, não mais lhe sofrerá a influência. Nenhuma recordação dolorosa lhe advirá dos sofrimentos físicos que haja padecido; nenhuma impressão desagradável eles deixarão, porque apenas terão atingido o corpo e não a alma. Sentir-se-á feliz por se haver libertado deles e a paz da sua consciência o isentará de qualquer sofrimento moral.
Interrogamos, aos milhares, Espíritos que na Terra pertenceram a todas as classes da sociedade, ocuparam todas as posições sociais; estudamo-los em todos os períodos da vida espírita, a partir do momento em que abandonaram o corpo; acompanhamo-los passo a passo na vida de além-túmulo, para observar as mudanças que se operavam neles, nas suas ideias, nos seus sentimentos e, sob esse aspecto, não foram os que aqui se contaram entre os homens mais vulgares os que nos proporcionaram menos preciosos elementos de estudo. Ora, notamos sempre que os sofrimentos guardavam relação com o proceder que eles tiveram e cujas consequências experimentavam; que a outra vida é fonte de inefável ventura para os que seguiram o bom caminho. Deduz-se daí que, aos que sofrem, isso acontece porque o quiseram; que, portanto, só de si mesmos se devem queixar, quer no outro mundo, quer neste.
Classificação
Emmanuel nos responde na questão 239 do Consolador:
— Entre a dor física e a dor moral, qual das duas faz vibrar mais profundamente o Espírito humano?
- Podemos classificar o sofrimento do Espírito como a dor-realidade e o tormento físico, de qualquer natureza, como a dor-ilusão.
Em verdade, toda dor física colima o despertar da alma para os seus grandiosos deveres, seja como expressão expiatória, como consequência dos abusos humanos, ou como advertência da natureza material ao dono de um organismo.
Mas, toda dor física é um fenômeno, enquanto a dor moral é uma essência.
Daí a razão por que a primeira vem e passa, ainda que se faça acompanhar das transições de morte dos órgãos materiais, e só a dor espiritual é bastante grande e profunda para promover o luminoso trabalho do aperfeiçoamento e da redenção.”
Em Ação e Reação – André Luiz por Chico Xavier, no cap 9, Druzo classifica a dor em:
– Dor-evolução, atua de fora para dentro, aprimorando o ser, sem a qual não existiria progresso: O ferro sob o malho, a semente na cova, o animal em sacrifício, tanto quanto a criança chorando, irresponsável ou semiconsciente, para desenvolver os próprios órgãos.
No artigo da Revista Internacional de Espiritismo – Vitor Ronaldo Costa que foi publicado no site do Leocádio em junho de 2004, encontrei:
Na cura do cego de Siloé (Jo 9:1-41), Jesus responde aos que lhe desafiavam a sabedoria e o poder, que nem o cego nem os seus pais haviam pecado para que se justificasse sua condição de cego de nascença, mas que ali estava para que nele se manifestassem as obras de Deus, permitindo inferir que haja quem sofra sem estar em débito com a contabilidade divina. Se não era uma expiação do passado, era uma provação apropriada ao progresso daquele Espírito, porquanto Deus, que é justo, não lhe imporia um sofrimento sem utilidade.
O que caracteriza a dor-evolução é o confronto com os vetores desarmonizantes que nos atingem de fora para dentro, mas que servem para estimular a paciência, a resignação, a fé, o perdão e a capacidade de luta. Poucos amadurecem efetivamente sem que experimentem dificuldades e obstáculos de toda ordem. “A luta intensiva, porém, dilata as aspirações íntimas. O sofrimento, quando aceito à luz da fé viva, é uma fonte criadora de asas espirituais”
Os exemplos são incontáveis: é o convívio com o parente difícil; a paciência a ser requisitada diante do cônjuge incompreensivo; a dificuldade em educar e encaminhar para o bem o filho rebelde; as pressões exercidas pela chefia no trabalho profissional; a ameaça de perda do emprego honesto que nos sustenta; a traição de alguém muito amado em quem depositávamos irrestrita confiança; a perda precoce de um ente querido vitimado por acidente ou doença incurável e assim por diante. São problemas corriqueiros, comuns à maioria das pessoas, mas que nos atingem de inopino nos deixando marcados pela dor dilacerante e pelas lágrimas sentidas. As provações, quando enfrentadas com a devida resignação e confiança no auxílio do Pai Maior, não passam de convites da própria vida ofertados em prol do nosso aprimoramento íntimo.
Embora tenhamos a certeza de que muitos Espíritos sem carma reencarnam na Terra por amor a alguém ou por algum ideal e submetendo-se às leis da matéria sofram sem merecerem, raros são os registros que nos permitem afirmar com convicção esse ou aquele caso. Mas o Espírito Emmanuel nos revela dois desses casos. Quem ler os livros Ave Cristo e Renúncia pulando o 1º capítulo de cada um deles, vai admitir que as dores por que passaram Quinto Varro e Alcíone foram expiações por faltas do passado. Mas não foi bem isso.
No Ave Cristo, Quinto Varro solicita a Clódio – entidade de esfera superior – seu regresso à Terra para auxiliar Taciano, que fora seu filho na última existência e que não conseguira conduzi-lo ao Cristo como pretendera, e a resposta foi:
“- Mas, por quê? Conheço-te o acervo de serviços, não somente à causa da ordem, mas igualmente à causa do amor. No mundo patrício, as tuas derradeiras romagens foram as do homem correto até ao extremo sacrifício e os teus primeiros ensaios na edificação cristã foram dos mais dignos. Não será aconselhável o prosseguimento de tua marcha, acima das inquietantes paisagens da carne”. No Renúncia, Alcíone, Espírito de elevada hierarquia, prestando serviços no sistema de Sírius, dirige-se a Antênio, seu mentor, que cumpria as ordenações de Jesus, solicitando sua volta à Terra, para cooperar com Pólux, seu eterno amor. Depois de muito argumentar, não concordando com seu retorno, já que não acreditava que Pólux estivesse pronto para merecer seu sacrifício, diz-lhe:
“- Recorda que as leis planetárias não afetam somente os espíritos em aprendizado ou reparação, mas, também, os missionários da mais elevada estirpe. Experimentarás, igualmente, o olvido das tuas conquistas, sentirás o mesmo desejo de compreensão e a mesma sede de afeto que palpitam nos outros mortais.”
Diante dessas revelações, podemos concluir que a dor não é somente produto da consciência culpada. “Não há crer, no entanto, que todo sofrimento suportado neste mundo denote a existência de uma determinada falta. Muitas vezes são simples provas buscadas pelo Espírito para concluir a sua depuração e ativar o seu progresso. Assim, a expiação serve sempre de prova, mas nem sempre a prova é uma expiação.” Nos casos de Quinto Varro e Alcíone, foram eles provados na sua grandeza moral, alcançando patamares mais elevados do progresso espiritual pelos seus sacrifícios em nome do amor.
Nos remetendo a obra de Leon Denis mais uma vez, no mesmo cap XXVI temos:
“A dor não fere somente os culpados. Em nosso mundo, o homem honrado sofre tanto como o mau, o que é explicável. Em primeiro lugar, a alma virtuosa é mais sensível por ser mais adiantado o seu grau de evolução; depois, estima muitas vezes e procura a dor, por lhe conhecer todo o valor.
Há dessas almas que só vêm a este mundo para dar o exemplo da grandeza no sofrimento; são, por sua vez, missionários e sua missão não é menos bela e comovedora que a dos grandes reveladores. Encontram-se em todos os tempos e ocupam todos os planos da vida; estão em pé nos cimos resplandecentes da História, e, para encontrá-las, é preciso ir procurá-las no meio da multidão onde se acham, escondidas e humildes.
Admiramos o Cristo, Sócrates, Antígono, Joana d’Arc; mas, quantas vítimas obscuras do dever ou do amor caem todos os dias e ficam sepultadas no silêncio e no esquecimento! Entretanto, não são perdidos seus exemplos; eles iluminam toda a vida dos poucos homens que os presenciaram.
Para que uma vida seja completa e fecunda, não é necessário que nela superabundem os grandes atos de sacrifício, nem que a remate uma morte que a sagre aos olhos de todos. Tal existência, aparentemente apagada e triste, indistinta e despercebida, é, na realidade, um esforço contínuo, uma luta de todos os instantes contra a desgraça e o sofrimento. Não somos juízes de tudo o que se passa no recôndito das almas; muitas, por pudor, escondem chagas dolorosas, males cruéis, que as tornariam tão interessantes aos nossos olhos como os mártires mais célebres. Fá-las também grandes e heroicas, a essas almas, o combate ininterrupto que pelejam contra o destino! Seus triunfos ficam ignorados, mas todos os tesouros de energia, de paixão generosa, de paciência ou amor, que elas acumulam nesse esforço de cada dia, constituir-lhes-ão um capital de força, de beleza moral que pode, no Além, fazê-las iguais às mais nobres figuras da História.
Na oficina augusta, onde se forjam as almas, não são suficientes o gênio e a glória para fazê-las verdadeiramente formosas. Para dar-lhes o último traço sublime tem sido sempre necessária a dor. Se certas existências se tornaram, de obscuras que eram, tão santas e sagradas como dedicações célebres, é que nelas foi contínuo o sofrimento. Não foi somente uma vez, em tal circunstância ou na hora da morte, que a dor as elevou acima de si mesmas e as apresentou à admiração dos séculos; foi por toda a sua vida ter sido uma imolação constante. É esta obra de longo aperfeiçoamento, este lento desfilar das horas dolorosas, esta afinação misteriosa dos seres que se preparam, assim, para as derradeiras ascensões, força a admiração dos próprios Espíritos. É esse espetáculo comovedor que lhes inspira a vontade de renascerem entre nós, a fim de sofrerem e morrerem outra vez por tudo o que é grande, por tudo o que amam e para, com este novo sacrifício, tornarem mais vivo o próprio brilho.”
Em outros trechos desse mesmo livro, o autor nos oferece mais conteúdos com exemplos de dor evolução em outros âmbitos:
“A ação da dor não é menos eficaz para as coletividades do que o é para os indivíduos. Não foi graças a ela que se constituíram os primeiros agrupamentos humanos? Não foi a ameaça das feras, da fome, dos flagelos que obrigou o indivíduo a procurar seu semelhante para se lhe associar? Foi da vida comum, dos sofrimentos comuns, da inteligência e labor comuns que saiu toda a Civilização, com suas artes, ciências e indústrias!
…A dor é como uma asa dada à alma escravizada pela carne para ajudá-la a desprender-se e a elevar-se mais alto.”
…O sofrimento, nos animais, é já um trabalho de evolução para o princípio de vida que existe neles; adquirem, por esse modo, os primeiros rudimentos de consciência; e o mesmo sucede com o ser humano nas suas reencarnações sucessivas. Se, desde as primeiras estadas na Terra, a alma vivesse livre de males, ficaria inerte, passiva, ignorante das coisas profundas e das forças morais que nela jazem. O alvo a que nos dirigimos está à nossa frente; nosso destino é caminhar para ele sem nos demorarmos no caminho. Ora, as felicidades deste mundo imobilizaram-nos, há atrasos, há esquecimentos; mas, quando a demora é excessiva, vem a dor e impele-nos para a frente.
– Dor-expiação, que vem de dentro para fora, marcando a criatura no caminho dos séculos, detendo-a em complicados labirintos de aflição, para regenerá-la, perante a Justiça.
*Falaremos bastante sobre essa dor mais abaixo…
– Dor-auxílio: Em muitas ocasiões, no decurso da luta humana, nossa alma adquire compromissos vultosos nesse ou naquele sentido. Habitualmente, logramos vantagens em determinados setores da experiência, perdendo em outros. Às vezes, interessamo-nos vivamente pela sublimação do próximo, olvidando a melhoria de nós mesmos. É assim que, pela intercessão de amigos devotados à nossa felicidade e à nossa vitória, recebemos a bênção de prolongadas e dolorosas enfermidades no envoltório físico, seja para evitar-nos a queda no abismo da criminalidade, seja, mais frequentemente, para o serviço preparatório da desencarnação, a fim de que não sejamos colhidos por surpresas arrasadoras, na transição da morte. O enfarte, a trombose, a hemiplegia, o câncer penosamente suportados, a senilidade prematura e outras calamidades da vida orgânica constituem, por vezes, dores-auxílio, para que a alma se recupere de certos enganos em que haja incorrido na existência do corpo denso, habilitando-se, através de longas reflexões e benéficas disciplinas, para o ingresso respeitável na Vida Espiritual.
Falaremos um pouco mais desse tipo de dor, no próximo tópico, onde Carlos Toledo Rizzini se refere as restrições pedidas.
Classificação da dor de acordo com Carlos Toledo Rizzini em Evolução Para o Terceiro Milênio
No cap. 5 de Evolução para o terceiro Milênio, no item 17 que trata das moléstias orgânicas, o autor nos recorda que toda moléstia e sofrimento tem por consequência a violação das Leis de Deus, e, portanto, tem origem espiritual, onde confirma que há doentes e não doenças e que a Medicina terrena avança nesse entendimento quando conceitua moléstia psicossomática (doença do corpo oriunda de um estado desajustado da mente – tensão, conflito).
E segue nos ajudando a compreender a causa profunda das enfermidades e a função que elas desempenham em nossa vida eterna. Começa nos lembrando um dos princípios fundamentais da Doutrina: Deus é amor, justiça e sabedoria, tudo impregnado da perfeição suprema e, portanto, devemos nos lembrar que não há injustiça no Universo e devemos procurar a causa da enfermidade dentro de nós mesmos, que enfraquecemos nossos centros de força do perispírito e o lesamos com o acúmulo de nossos erros, vícios e abusos:
– Estresse, estados de tensão (ansiedade, frustrações, ódio) muito prolongados que originam lesões graves em vários órgãos, capazes de produzirem úlceras gastroduodenais, arteriosclerose e hipertensão arterial… foi comprovado por experiencias feitas pelo Prof. e Endocrinologista Hans Selye (primeiro a pesquisar seriamente o estresse na década de 30), introduzindo conceitos e conhecimentos que André Luiz, em Sinal Verde, afirma exatamente a mesma coisa: “Quanto mais avança, a ciência médica mais compreende que o ódio em forma de vingança, condenação, ressentimento, inveja ou hostilidade está na raiz de numerosas doenças e que o único remédio eficaz contra semelhantes calamidades da alma é o específico do perdão no veículo do amor.” Por incrível que pareça, essa última assertiva do espírito fora antes formulada pelo citado cientista ao declarar que: “Amar ao próximo é um dos mais sábios conselhos médicos de todos os tempos.” Percebe-se que a acentuação se deslocou da religião para a ciência: o Evangelho é também um código de medicina profilática…
Tal é a causa principal dos nossos males físicos e mentais: as lesões do corpo espiritual, enquanto não houver reparação das condutas malfazejas e mudança nas inclinações, serão transferidas para o corpo material, que renascerá doente de mil maneiras diferentes.
É o próprio modo de ser do indivíduo que não é sadio. Seus pensamentos, sentimentos e impulsos, de várias maneiras, afastam-no da normalidade – levando-o ao proceder incorreto e ao desequilíbrio consequente. Residindo, assim, os fundamentos da moléstia no íntimo da pessoa, não seria possível obter a cura tão somente pelo uso de medicação externa. Os remédios materiais, com raras exceções (fim de débito) não pode curar integralmente a ninguém; consegue melhorar, aliviar, transferir o mal, mudar sua manifestação, eliminar algo, – mas a cura há de proceder do poder criador do Espírito. “O Espírito delinquente será imperiosamente o médico de si mesmo”. (André Luiz, No Mundo Maior). Daí, afirmar Emmanuel (Fonte Viva) que raros alcançam a cura completa, genuína, é mister apreciável cota de esforço próprio da renovação dos conteúdos mentais, para mudar as maneiras de pensar e de agir.
Temos aí moléstias orgânicas originárias de lesões perispirituais que surgiram de erros e abusos anteriores. Se o sujeito ingeriu veneno por sua deliberação, renascerá com a garganta pouco resistente a germes ou com o estômago lesado; se deu um tiro no coração voltará atacado de uma cardiopatia congênita; se usou a inteligência como astúcia para aproveitar de outros, virá a ser débil mental ou padecerá de hidrocefalia; se foi dado à maledicência ou calúnia, terá, mais tarde, a língua maior do que a boca. E assim por diante. Vemos a lei de causa e efeito em ação no plano espiritual determinando expiações.
– As doenças expiatórias, impostas ao reencarnante como indispensáveis a resgates necessários. É claro que nos exemplos acima temos também expiações…, mas neles, o indivíduo lesou a si mesmo e a moléstia é uma expressão da lesão do perispírito. Um indivíduo matou outro, como espírito, lutou ativamente pela própria regeneração e alcançou grandes méritos na prática do bem. Ao voltar ao mundo, recebe um coração defeituoso (que não tinha) para expiar o crime. Outro levou alguém à tuberculose, fazendo-o expor-se continuamente a condições adversas, ao renascer, recebe pulmões sem resistência ao bacilo de Koch. De dois dementes, um poderá ser realmente louco (espírito perturbado) e o outro não, tendo apenas o cérebro desarranjado por necessidade de expiação. Um idiota poderá ter o espírito lúcido. A diferença entre as duas modalidades só é nítida nos extremos, devendo haver muitas situações intermediárias menos definidas.
Um sem-número de lesões ou afecções se revela derivadas de episódios de vidas passadas. Um evento desses, até muito antigo, ligado à situação interpessoal não resolvida, só mostra consequências no corpo físico em diversas vidas. Segue-se um exemplo que explicaria casos na área psicológica (Netherton).
*Netherton : Dr. Morris Netherton é um psicanalista protestante que após sonhar repetitivamente que estava numa embarcação que naufragava resolveu iniciar estudos espirituais; e após fazer uma regressão descobriu que ele morrera nesse naufrágio e durante essa regressão recordara seu próprio nome, há época e o nome da embarcação. E para sua surpresa, pesquisando encontrou tudo num registro americano de navios que afundaram. Sendo assim, aprofundou os estudos e pesquisas na hipótese de vidas passadas.
Em 1967 desenvolveu o próprio método de hipnose ativa que consiste no acesso do inconsciente sem afastar o consciente. Netherton já atendeu mais de 40mil pacientes e diz que não se importa se a pessoa que ele atende acredita se tratar de uma vida passada ou prefere encarar como algo imaginário; o que importa pra ele é a cura e não provar a reencarnação.
Certa mulher nova não só sentia dor no curso do ato genésico como também tinha verdadeiro horror ao mesmo; e, além disso, acordava costumeiramente de madrugada com cólicas abdominais; sintomas, portanto, físicos e psíquicos, aos quais se devem ajuntar uma infecção vaginal crônica rebelde ao tratamento ginecológico. A regressão de memória semiconsciente, conservando a lembrança posterior dos fatos evocados, revelou que em existência bem anterior (numa “civilização primitiva”), em seguida ao adultério, o marido mandou prendê-la em jaula baixa, onde só cabia acocorada; tal posição determinou-lhe, então, fortes e contínuas dores no ventre. Dias depois, por ordem dele, um médico seccionou lhe o clitóris, sentindo, na ocasião, rápida dor lancinante; era seu intuito usá-la sexualmente sem que ela pudesse corresponder. E assim foi anulada a atividade erótica. Em vida subsequente, descreve-se com jovem meretriz que atravessa triste episódio, apaixonada por certo homem, este, alcançando o próprio orgasmo, a deixa no momento em que atingindo o clímax, ofende-a então, gravemente com palavras pesada. Confusa e frustrada cai do alto da escada e é deixada sem socorro até morrer. Dessa experiência procede a sua desconfiança dos homens e da anterior o pavor das relações carnais; as dores são ainda sequelas da gaiola baixa e da operação cruenta; a vaginite, complicação do ato cirúrgico séptico.
Vejam. Coisas muito antigas em vigor! É que por detrás delas há um erro moral, já profligado em os Dez Mandamentos! Mas, muita gente assoalha que os tempos mudaram e que o mundo é diferente… O passado gravado nas profundezas das almas não sabe disso e emerge sob a forma de distúrbios psicossomáticos e de sintomas neuróticos! Tal mulher – nossa irmã não mais errada do que somos em geral – curou-se inteiramente; esgotaram-se lhe os débitos mediante os sofrimentos que enfrentou até 1970, digamos. E, naturalmente, mudou a sua condição íntima, do mesmo passo.
É bom recordar que André Luz conta a estória de dois espíritos bastante aprimorados que, não obstante, permaneciam no plano inferior. Querendo saber por que não conseguiam ascender, a análise do passado de ambos revelou que, cinco séculos antes, haviam lançado dois companheiros muralha abaixo, liquidando-os sumariamente. Tiveram que renascer, como pilotos de prova, para dar a vida pelo progresso da aviação, caindo no devido tempo… Consultem Ação e Reação, obra em que o querido instrutor menciona casos de débitos pendentes há mais de 1.000 anos, confirmando os achados da regressão de memória. Informa no Cap. VII:
“Conheço irmãos nossos, portadores do estigma de padecimentos atrozes, que se encontram animalizados, há séculos, nos despenhadeiros infernais”. Não se imagine, porém, que estejam entregues à própria sorte; a despeito da revolta, os mensageiros divinos espreitam a oportunidade de resgatá-los das trevas para a luz.
Acabamos de fazer observar que vasta cópia de dissonâncias psicossomático-neuróticas promana dessa fonte, incluindo úlceras pépticas, enxaquecas, ejaculação precoce, impotência, frigidez, fobias, inibições, esclerose, coronárias, dispepsia, e mais o que seja: é um nunca acabar. Resultam, por assim dizer, de “sobras emotivas” de alguma existência passada, como diz K. Muller; repetindo; são lembranças arquivadas em estado inconsciente que estão carregadas de emoções perturbadoras, não integradas ao patrimônio psíquico e, portanto, ainda ativos. Segue-se que quando o paciente recorda tais episódios e libera a emoção reprimida, esta perde sua força traumática (ou virulência) – o que se consegue mediante a regressão de memória, usualmente hipnótica, ou quase consciente (Netherton), porque já se esgotou o débito cármico, ou pelo esclarecimento e prática do bem, segundo a orientação espírita, que leva a modificações definitivas do intimo da alma.
– Restrições pedidas, defeitos ou inibições funcionais que limitam atividades abusivas do organismo. Antes de encarnar, prevendo sua queda num setor onde isso já ocorreu antes, o espírito solicita que certos órgãos ou funções sejam um tanto defeituosos, de modo a funcionarem em ritmo reduzido. Na carne, por mais que o sujeito queira exagerar no uso para obter prazer ou se lançar à prática do mal, não o consegue. E nada neste mundo livra-o da inibição solicitada…
É natural que o gastrônomo peça um estômago delicado ou lento, um intestino facilmente desarranjável, que o leve a limitara ingestão de alimentos e bebidas. Que o fascinador queira, agora, ter feições mais grosseiras, que a ninguém venha atrair. Que aquele que se deixou levar pela intriga prefira voltar surdo; que o caluniador peça a mudez.
– Doença gerada pelo contato íntimo com um espírito perturbado, geralmente inconsciente do seu estado, cujo perispírito conteria lesões oriundas da vida material. Estabelecida a sintonia, as sensações mórbidas transmitem-se ao encarnado, que passa a sentir-se enfermo sem o estar. É o caso da moça que um dia começou a cair facilmente; uma vidente percebeu sobre os ombros dela um espírito montado, o qual, incorporado, revelou ser o pai dela e não ter consciência da situação. Ora, o velho sofria de forte artrite nos joelhos e não podia andar; doutrinado, acabou deixando a filha livre. Ou do indivíduo que entra a tossir, a escarrar, a ter febrícula à tarde, como se estivesse tuberculoso; quem o está fazendo sentir-se doente é o espírito que se lhe aderiu à aura, e que morreu naquele estado, conservando as sensações doentias e transferindo-as ao encarnado que está sintonizado com a vibração dele. Foi o que Inácio Ferreira denominou intoxicação fluídica, em sua obra pioneira.
A Professora Helena de Carvalho (J.E. 45:9, 1979), dá o nome de “contaminação fluídica” à semelhante mecanismo morbígeno e sugere que tais casos “são bem mais frequentes do que se supõe, principalmente nesta época de perturbações excessivas”. Cita como exemplo, o sucedido com certo indivíduo que atendeu outro em plena crise asmática. Saiu de braço dado com ele, amparando-o. O doente foi melhorando pouco a pouco. Não demorou a ir-se enquanto o pobre socorrista ficou a chiar com forte falta de ar… Passou para ele o obsessor inconsciente do seu próprio estado; cujas sensações patológicas transmitiam aos encarnados que com ele entravam em adiantado grau de sintonia vibratória.
Uma variante original da presente patogenia foi comunicada pelo Dr. Hernani G. Andrade (I.B.P. P; SP, monografia nº 3, 1980). Devia reencarnar um ex-suicida que ingerira formicida. A futura mãe, avisada em sessão mediúnica, tornou-se, naturalmente, de apreensões quanto à sanidade do próximo filho, prevendo-o defeituoso. No entanto, o mentor espiritual esclareceu que se ela estivesse disposta a fazer tal sacrifício pelo espírito reencarnante, a criança nasceria normal – agregando que ela é quem iria sofrer as consequências do antigo envenenamento. E foi o que sucedeu! Contou dita senhora que durante a gravidez “minha boca ficava em feridas, em carne viva. Eu sentia que era roída por dentro e então caia. Minha irmã disse que, às vezes, eu começava a tremer e parecia estar morrendo…” sentia o gosto e o cheiro do formicida, queimação no estômago, vômitos etc. Tudo desapareceu após o parto, o suicídio fora induzido por um obsessor – mas a criança nasceu perfeita e com 5 kg. Era agora uma menina que, quase 06 anos antes, fora irmão da sua mãe atual e que se matara aos 28 anos, tendo crescido como bela e forte (aos 17 anos) jovem cujas inclinações se revelaram preferentemente masculinas. Não que deixasse de ser feminina, mas inclinava-se por roupas, corte de cabelo e brincadeiras de menino e, depois, não era dada a namoricos…
Nos casos em que o obsessor, movido por ódio intenso, envia descargas fluídicas constantes sobre a vítima, produzidas uma doença sem base física no próprio doente, Manoel P. de Miranda (nos Bastidores da Obsessão, FEB, 1970) dá o nome de moléstia-simulacro a tal estado mórbido. É assim que uma pessoa “fica leprosa e é internada em leprosário por apenas apresentar a aparência de hanseniana; bom meio de isolar alguém e levá-lo ao suicídio… A vítima, estando sintonizada pela culpa do agressor e tendo a mente preparada pela hipnose, seguindo o desejo do obsessor, pode exibir os sinais da morfeia. Ai, o tratamento é espiritual, mediante a transformação íntima de ambos.
Muitos daqueles que, rápida e superficialmente, tomam contato com os postulados do Espiritismo, podem acreditar que ele cultua a dor e o sofrimento como forma de se encontrar a felicidade. Entretanto, a Doutrina Espírita, primeiramente, dilata nossa compreensão a respeito de Deus: não é Ele um ser punitivo e vingativo, mas uma inteligência que, com supremacia, se fez causa primeira de todas as coisas.
Em virtude de a ótica espírita ser, essencialmente, otimista, a dor e os obstáculos deixam, com efeito, de ser interpretados como castigos, para assumirem o papel de instrumentos de aprimoramento também necessários ao processo de evolução. Assim, a existência ganha um sentido muito mais transcendente e dinâmico, porque ensina que todas as criaturas foram criadas com um destino marcado: a perfeição, a angelitude. O erro, desse modo, passa a ser compreendido como um desvio que pode ser refeito a qualquer instante; e se o indivíduo optar pela reparação de seus equívocos, de livre e espontânea vontade, por que a Sabedoria Divina precisará fazer uso de um mecanismo doloroso, que terá por objetivo, pura e simplesmente, acordar-lhe a consciência?
Faz-se notar dessa maneira, que em mundos mais avançados não é mais necessário o recurso da dor.
Qual a melhor maneira de lidarmos com as dores?
Ainda no cap. 5, mas no item 6 e 7 do livro Evolução para o Terceiro Milênio, temos:
“É oportuno procurarmos entender a significação das moléstias que geramos em nós mesmos, que são a imensa maioria.
A verdade é que o sofrimento, longe de ser uma desgraça ocasional, “tem função preciosa nos planos da alma”, esclarece Emmanuel. Ele surge como uma consequência de erros e violações, mas dispôs a Providência Divina que ele fosse mais do que isso; que tivesse uma função retificadora dos desequilíbrios do espírito e das lesões corporais. Por isso, apresenta patente utilidade ao homem que sofre; sem ele, esse não poderia se reajustar, seria difícil acordar a consciência para a realidade superior – o sofrimento é o “aguilhão benéfico”, diz o Irmão X (Luz Acima). Deriva daí que a nossa atitude frente à dor que nos avassala, se a compreensão das leis superiores da Vida nos felicita a alma, deverá ser de conformação lúcida. Esta atitude, a única produzida sempre que o sofrimento não puder ser removido pelos recursos da inteligente indústria humana, concorda com a necessidade de observar dois conselhos básicos de Emmanuel (Fonte viva):
1º) O doente (todos nós…) precisa envidar esforços para deixar de ser triste, desanimado, revoltado, odiento, raivoso etc. como vimos acima, estados de ódio e de ansiedade lesam o corpo e a alma, o desânimo entorpece as forças desta, a maledicência consome as energias, e assim por diante. Urge renovar-se intimamente, mudar as disposições psíquicas. Se não, o remédio externo pouco poderá fazer a nosso favor; se houver melhoras, é preciso não regressar aos abusos anteriores, caso em que não haverá cura.
2º) Importante, muito importante é que aprendamos a não pedir o afastamento da dor; ela é o amargo elixir da regeneração do espírito faltoso. Devemos isto sim, rogar forças íntimas para suportá-la com serenidade e valor a fim de que não percamos as vantagens que nos trará no capítulo da recuperação. É preciso aprender a aproveitar os obstáculos que criamos e, para isso, podem-se pedir recursos ao Alto – sempre que os recursos da Terra falhar; acontecendo isto, a resignação consciente é chamada a intervir.
Em síntese, a enfermidade é produto derivado das violações que conscientemente praticamos ao escolher o caminho do mal de maneira voluntária. Hoje, temos que enfrentar as consequências disso, isto é, o sofrimento. Este representa, ao mesmo tempo, a expiação e o tratamento, porquanto, tem função medicinal por servir ao reajustamento do espírito culpado, logo, doente.
É lícito, procurar a medicina terrena, que pode aliviar muito e curar onde for permitido; assim como a Misericórdia Divina pô-la ao nosso alcance, embora com certas limitações sociais e econômicas, que servem de provas ao espírito em processo de cura definitiva. Mas, em todos os casos, para quem já adquiriu certa compreensão dos níveis superiores de Vida, mais do que opera em nós ainda hoje. E, para tanto, o esforço pessoal torna-se indispensável; o serviço de aproveitamento das lições evangélicas – como orar, auxiliar, desapegar-se de posses e posições, trabalhar pelo bem etc. – é individual e intransferível. Com ele, mudam as nossas tabelas de valores; a solidariedade, a cooperação. A contenção as paixões ou impulsos, o sacrifício, a renúncia. O serviço prestado, a conformação assume a significação de normas de vida. É só então, que Jesus, o Mestre da Terra, curará os males para todo o sempre.
É, em suma, a doença (e o sofrimento) muito importante no processo de redenção do espírito humano – pondo a este de acordo com a Lei que rege a evolução no Universo. Não se trata de entronizar o sofrimento, de conferir primazia às desgraças, e coisas assim. O Espiritismo pura e simplesmente esclareceu o papel da dor na vida humana; ninguém a procura, mas quando ela desponta cumpre dar-lhe o tratamento adequado para que ela não venha a ser, realmente, “uma desgraça completa”. A intensidade da dor é proporcional à atitude íntima do sofredor, ao seu estado de espírito; tanto mais forte quanto mais insubmisso ele for. Para quem só conhece a vida terrena, o sofrimento parece interminável e desesperador muitas vezes; tal pessoa julga-se vítima de toda a desgraça possível. A certeza da vida espiritual e a fé no poder superior, levando à compreensão e aceitação da dor como resultado de erros passados e instrumento de redenção, gera o estado de oração que facilita tudo. Bom será ir mudando de ponto de vista, dando acentuação aos aspectos espirituais da vida, de modo que a vida material vá diminuindo em importância diante da necessidade evolutivas do espírito eterno; o amanhã vem aí e logo será hoje…
Uma violenta cólica renal dói bem menos quando dizemos do fundo da alma: “Pai infinito, seja feita a tua vontade e não os meus caprichos… sei que a dor é necessária à correção dos meus desvios… ampara-me para que eu saiba suportá-la sem revolta, aproveitando-a para o meu soerguimento com Teu filho!” Uma das faltas tidas como mais graves é a revolta da criatura contra o Criador, a ausência de submissão à vontade divina (O Evangelho Segundo o Espiritismo); logo, se considerarmos Deus injusto, se murmurar contra as aflições do caminho, ao invés de aproveitá-las para o nosso adiantamento, aumentaremos a dívida e teremos de recomeçar mais tarde, tantas vezes quantas forem necessárias para o nosso desprazer e angústia. Vamos, em conclusão, viver na Terra de olhos fitos no Alto, fazendo desta vida uma contínua preparação para a outra, buscando o que seja motivo de elevação e largando o que nos amarre aos círculos inferiores de lutas e sofrimentos. As maiores dificuldades e obstáculos estão dentro de nós mesmos.
Uma última observação, não menos importante para o espírito superiormente evoluído, o sofrimento é mera contingência natural dos planos inferiores de existência e não merece maior consideração; não recebe daquela qualquer relevância. Muitos missionários descem da Espiritualidade Superior movidos pelo amor aos semelhantes retardatários, para o desempenho de tarefas que incluem necessariamente o sofrimento e até em doses fortes. Enfrentam-no como condição natural do mundo material a fim de darem cumprimento ao objetivo designado, que lhes foi atribuído pelo Poder Supremo.
Vejam os antigos profetas e os primitivos cristãos, que viveram a Terra implantar o Evangelho o Senhor, não havia tortura que os afastasse do caminho do testemunho de amor ao próximo e da submissão a Deus e a Jesus. O que sofreram Pedro, Paulo, Francisco de Assis, Kardec, Gandhi, o nosso Chico etc. servem de exemplo para o auspicioso fato de que a dor só impressiona desfavoravelmente ao devedor e ao indivíduo, ou seja, ao doente e ao fraco. Para ser da Esfera Mais alta, ela é simplesmente um fator peculiar aos mundos dominados pelo apego à matéria e, logicamente. Quem desce a tais planos fica sujeito a suportá-lo. Eis tudo.
Vejam as excursões de André Luiz e seus mentores aos círculos de sombra: tiveram naturalmente de aguentar o peso e a densidade da atmosfera local e os desmandos dos habitantes dali; inclusive prisão em uma cela. Mas, estavam a serviço do amor universal e o sofrimento era uma injunção natural, um preço decorrente do estado de perturbação do ambiente. Também os nossos amigos e mentores descem até nós enfrentando vibrações viscosas e nenhum se queixa, movem-nos o poder mais forte do Amor, do Bem e da Luz…
Esse livro, compila todos os assuntos de forma tão clara, que nem precisaríamos fazer adendos, mas como tudo em nossas vidas, não podemos nos esquecer do recurso da oração, já que nos momentos de maior aflição é que alguns de nós nos recordamos mais veemente desse recurso.
Observemos a questão 245 do Consolador:
“— Se é justo esperarmos no decurso do nosso roteiro de provações na Terra, por determinadas dores, devemos sempre cultivar a prece?
— A lei das provas é uma das maiores instituições universais para a distribuição dos benefícios divinos.
Precisais compreender isso, aceitando todas as dores com nobreza de sentimento.
A prece não poderá afastar os dissabores e as lições proveitosas da amargura, constantes do mapa de serviços que cada Espírito deve prestar na sua tarefa terrena, mas deve ser cultivada no íntimo, como a luz que se acende para o caminho tenebroso, ou mantida no coração como o alimento indispensável que se prepara de modo a satisfazer à necessidade própria, na jornada longa e difícil, porquanto, a oração sincera estabelece a vigilância e constitui o maior fator de resistência moral, no centro das provações mais escabrosas e mais rudes.”
Espero poder contribuir, através desse estudo com o esclarecimento e compreensão da dor, esse recurso da Evolução de aprimoramento do nosso Ser, que nos proporciona tantas experiências importantes que iluminam nossos corações e extraem do nosso íntimo virtudes e habilidades que ainda não possuíamos, eis sua beleza oculta.
Que guardemos a certeza de que nenhuma dor deve ser desprezada ou desdenhada, merecendo daquele que se propõe a ajudar a melhor consideração, atenção e solidariedade.
Que nós, espíritas não nos esqueçamos da bandeira que a doutrina levanta: Fora da caridade não há salvação, e busquemos no nosso cotidiano a tarefa desafiadora de socorrer o nosso próximo ofertando o nosso melhor, sem qualquer tipo de julgamento ou tentativa de a dor alheia, pois com a visão espírita, aprendemos que cada ser é um Espírito imortal com conquistas morais diferenciadas, com luzes e trevas em seu interior, de tal sorte que cada pessoa tem um grau de resistência moral para as dores humanas, físicas e/ou morais.
Alguns enfrentam bem o luto, outros fazem uma depressão crônica; alguns lidam equilibradamente com a doença, outros se perturbam; alguns nem dão bola para a febre, outros reclamam e preferem cultivar o repouso, algumas vezes em exagero; alguns crescem com os desafios familiares, outros falham moralmente.
Aliás, sob a perspectiva biológica, também encontraremos pessoas com graus diversos de tolerância à dor. Algumas suportam dores físicas intensas (dor de dente, realizam procedimentos médicos e odontológicos sem anestesia etc.), ao passo que outras sofrem com as mínimas dores (dor de cabeça leve, optam por anestesia em qualquer tipo de intervenção física, não conseguem tomar líquidos quentes, como cafés e chás etc.).
Deveremos sempre ouvir as queixas alheias com imensa solidariedade e desejo de ajudar, seja com a oração, seja com bons conselhos, ou apenas ouvindo com paciência e atenção, demonstrando nossa amorosidade e sincera consideração.
O importante é colocarmo-nos na situação do próximo e entender que aquele desafio, maior ou menor, o está incomodando, fragilizando-o, merecendo de nós uma conduta cristã, de auxílio fraternal, desinteressado e com plena dedicação, até porque, ao chegar a nossa vez de vivenciar a dor, certamente apreciaremos a presença de um amigo que possa nos acolher, sem julgamento.
E por fim lembremos a reflexão do Chico que nos diz que tudo passa, guardando a esperança do porvir, com a fé em Deus e na sua Sabedoria.
Tudo passa – Chico Xavier
Todas as coisas na Terra passam.
Os dias de dificuldade passarão…
Passarão, também, os dias de amargura e solidão.
As dores e as lágrimas passarão.
As frustrações que nos fazem chorar… Um dia passarão.
A saudade do ser querido que está longe, passará.
Os dias de tristeza…
Dias de felicidade…
São lições necessárias que, na Terra, passam, deixando no espírito imortal as experiências acumuladas.
Se, hoje, para nós, é um desses dias, repleto de amargura, paremos um instante.
Elevemos o pensamento ao Alto e busquemos a voz suave da Mãe amorosa, a nos dizer carinhosamente: ‘isto também passará’
E guardemos a certeza pelas próprias dificuldades já superadas que não há mal que dure para sempre, semelhante a enorme embarcação que, às vezes, parece que vai soçobrar diante das turbulências de gigantescas ondas.
Mas isso também passará porque Jesus está no leme dessa Nau e segue com o olhar sereno de quem guarda a certeza de que a agitação faz parte do roteiro evolutivo da Humanidade e que um dia também passará.
Ele sabe que a Terra chegará a porto seguro porque essa é a sua destinação.
Assim, façamos a nossa parte o melhor que pudermos, sem esmorecimento e confiemos em Deus, aproveitando cada segundo, cada minuto que, por certo, também passará.
Tudo passa… exceto Deus.
Deus é o suficiente!
*Chico colocou uma placa na cabeceira de sua cama com os dizeres: “Isso também passa”.
Fontes
– Bíblia Sagrada
– O Consolador – Francisco Cândido Xavier, pelo espírito Emmanuel
– Evolução para o Terceiro Milênio – Carlos Toledo Rizzini
– O evangelho Segundo o Espiritismo – Allan Kardec
– O livro dos Espíritos – Allan Kardec
– Obras póstumas – Allan Kardec
– O Problema do ser, do destino e da dor – Léon Denis
– Entre a Terra e o Céu – Francisco Candido Xavier, pelo espírito Andre Luiz
– Ação e reação – Francisco Candido Xavier, pelo espírito Andre Luiz
– https://centroespiritaleocadio.org.br