A Cesta
Quando menina eu era preguiçosa e reclamava quando me atribuíam mesmo os mais insignificantes deveres dentro de casa. Sempre que possível eu transferia o que tinha a fazer para os meus irmãos. Eles, entretanto, não tinham melhor disposição do que eu, de modo que estávamos sempre discutindo e de cara feia uns para com os outros. Meus pais nada diziam e esperavam que decidíssemos as querelas. Hoje percebo que papai simplesmente pensava na maneira pela qual iria nos dar uma lição proveitosa.
Uma das minhas tarefas e a que me deixava sempre mal-humorada, consistia em pegar uma cesta e ir comprar pão para a ceia.
Um dia meu pai chegou do trabalho e nos encontrou em conflito, com a cesta no chão, entre nós. Ele estava visivelmente fatigado, porém, ao invés de se sentar um pouco para descansar, voltou-se para mim e me disse em tom carinhoso:
– Filha, dê-me a cesta.
Eu acedi de pronto, certa de que tinha levado a melhor e que um de meus irmãos ia ser mandado à padaria. Mas não foi isso que aconteceu. Dirigindo-se a nós todos, propôs-nos o seguinte:
– Filhos, até aqui eu tenho dado o dinheiro e vocês têm feito as compras. Vamos mudar um pouco. Vocês vão dar o dinheiro e eu irei fazer as compras. Já estou com a cesta e vou à padaria buscar o pão. Vocês, por favor, me dêem o dinheiro para pagá-lo.
Aquela mudança inesperada nos assustou a todos e ficamos por um instante a nos entreolhar sem dizer palavra.
Sem suportar por mais tempo a situação, tomei-lhe a cesta, peguei o dinheiro e fui buscar os pães, muito pensativa, deixando meus irmãos em um silêncio de perplexidade. Papai foi tomar o seu banho como se nada tivesse acontecido.
Voltei e quando já estávamos todos sentados à mesa para a refeição, com muita cordialidade ele se dirigiu a nós:
– Filhos, disse, a ceia representa uma bênção de Deus e o esforço de cada um de nós. Deus nos abençoou para que eu pudesse trabalhar e ganhar o dinheiro, vocês fizessem as compras com ele e sua mãe cozinhasse a comida. Assim, todos nos alimentamos e nos sentimos satisfeitos. A cooperação é a garantia do lar e da Humanidade inteira. Quando ela falta a bênção de Deus não pode ser realizada. Ao longo de toda a vida vocês verão que tal acontece.
Depois disso nossa atitude mudou. A lição serviu para todos nós e ainda hoje, quando nos reunimos, lembramo-nos de papai e daquela ceia. De cada vez que a nossa colaboração, para qualquer trabalho digno, nos é solicitada, lembramo-nos daquela cesta de carregar pão e alegremente aceitamos a incumbência certos de que, assim, a bênção de Deus nos estará beneficiando e beneficiando a todos.
DA OBRA “E, PARA O RESTO DA VIDA …” DE WALLACE LEAL V. RODRIGUES