Ensáio Teórico das Curas Instantâneas
Tal é o caso de grande número de doenças, cuja origem é devida aos fluídos perniciosos, dos quais é penetrado o organismo. Para obter a cura, não são moléculas deterioradas que devem ser substituídas, mas um corpo estranho que se deixe expulsar; desaparecida a causa do mal, o equilíbrio se restabelece e as funções retomam o seu curso. Concebe-se que em semelhantes casos os medicamentos terapêuticos, por sua natureza destinados a agir sobre a matéria, não tenham eficácia sobre um agente fluídico. Assim, a medicina ordinária é inoperante em todas as doenças causadas por fluídos viciados, e alas são numerosas. À matéria pode opor-se a matéria, mas a um fluído mau há que opor um fluído melhor e mais poderoso. A medicina terapêutica naturalmente falha contra os agentes fluídicos; pela mesma razão a medicina fluídica falha onde há que opor matéria; a medicina homeopática nos parece ser o intermediário, o traço de união entre esses dois extremos, e deve particularmente ter êxito nas afecções que poderiam chamar-se mistas.
Seja qual for a pretensão de cada um destes sistemas à supremacia, o que há de positivo é que, cada um de seu lado, obtém estar na posse exclusiva da verdade; de onde há que concluir que todas têm sua utilidade, e que o essencial é as aplicar adequadamente. Não temos que nos ocupar aqui dos casos em que o tratamento fluídico é aplicável, mas da causa pela qual esse tratamento por vezes pode ser instantâneo, ao passo que em outros casos exige uma ação continuada.
Esta diferença se deve à mesma natureza e à causa primeira do mal. Duas afecções que apresentam, na aparência, sintomas idênticos, podem ter causas diferentes; uma pode ser determinada pela alteração das moléculas orgânica e, neste caso, é necessário reparar, substituir, como me disseram, as moléculas deterioradas por outras sãs, operação que só se pode fazer gradualmente; a outra, por infiltração, nos órgãos sãos, de um fluído mau, que perturba as suas funções. Neste caso não se trata de reparar, mas expulsar. Esses dois casos requerem, no fluído curador, qualidades diferentes. No primeiro, é preciso um fluído curador suave que violento, sobretudo rico em princípios reparadores; no segundo, um fluído enérgico, mais próprio à expulsão pode ser rápida e como por efeito de uma descarga elétrica. Subitamente livre da causa estranha que o fazia sofrer, o doente sente-se aliviado imediatamente, como acontece na extirpação de um dente estragado. Não estando mais obliterado, o órgão volta ao seu estado normal e retoma as suas funções.
Assim podem explicar-se as curas instantâneas, que não são, na realidade, senão uma variedade da ação magnética. Como se vê, elas repousam num miraculoso que os outros fenômenos espíritas. Compreende-se desde logo porque essas espécies de curas as mesmo tempo, à causa primeira do mal, que não é a mesma em todos os indivíduos, e às quantidades especiais do fluído que se lhe opõe. Disso resulta que tal pessoa que produz efeitos rápidos, nem sempre é indicada para um tratamento magnético regular, e que excelentes magnetizadores são impróprios para curas instantâneas. Esta teoria pode assim resumir-se: “Quando o mal exige a reparação de órgãos alterados, necessariamente a cura é lenta e requer uma ação contínua e um fluído de qualidade especial; quando se trata da expulsão de um mau fluído, ela pode ser rápida e, mesmo, instantânea.” Para simplificar a questão, não consideramos senão os dois pontos extremos; mas entre os dois há nuanças infinitas, isto é, uma multidão de casos em que as duas causas existem simultaneamente em diferentes graus, e com mais ou menos preponderância de cada uma; em que, por conseqüência, é necessário, ao mesmo tempo expulsar e reparar. Conforme aquela das duas causas que predomina, a cura é mais ou menos lenta; se for a do mau fluído, após a expulsão é preciso a reparação; se for a desordem orgânica, após a reparação é necessária a expulsão. A cura só é completa após a destruição das duas causas. É o caso mais comum; eis porque os tratamentos terapêuticos muitas vezes necessitam ser completados por tratamento fluídico e reciprocamente; eis, também, porque as curas instantâneas, que ocorrem nos casos em que a predominância fluídica é, por assim dizer, exclusiva, jamais poderão tornar-se um meio curativo universal; não são, conseqüentemente, chamadas a suplantar nem a medicina, nem a homeopatia, nem o magnetismo ordinário. A cura instantânea radical e definitiva pode ser considerada como um caso excepcional, visto que é raro: 1º – que a expulsão do mau fluido seja completa no primeiro golpe; 2º – que a causa fluídica não seja acompanhada de alguma alteração orgânica, o que obriga, num caso como no outro, a olhar várias vezes. Enfim, não podendo os maus fluídos provir senão de maus Espíritos, sua introdução na economia se liga muitas vezes à obsessão. Daí resulta que, parar obter a cura, é preciso tratar, ao mesmo tempo, o doente e o Espírito obsessor. Estas considerações mostram quantas coisas há que levar em conta no tratamento das moléstias, e quando ainda resta a aprender o tal respeito. Além disso, vem confirmar um fato capital, que ressalta da obra a Gênese, é a aliança do Espiritismo e da ciência. O Espiritismo marcha no mesmo terreno que a ciência, até os limites da matéria tangível; mas, ao passo que a ciência detém neste ponto, o Espiritismo continua seu caminho e procede suas investigações nos fenômenos da natureza com o auxílio dos elementos que colhe no mundo extra-material; só aí está a solução das dificuldades contra as quais se choca a ciência. Nota: A pessoa cujo pedido motivou esta explicação está no caso das doenças de causa complexa. Seu organismo está profundamente alterado, ao mesmo tempo que saturado de fluídos os mais perniciosos, que a tornam incurável apenas pela terapêutica ordinária. Uma magnetização violenta e muito enérgica apenas produziria uma super excitação momentânea, logo seguida de maior prostração, ativando o trabalho da decomposição. Ser-lhe-ia necessária uma magnetização suave, continuada por muito tempo, um fluído reparador penetrante, e não um fluído que abala, mas nada repara. Ela é, pois, inacessível à cura instantânea.