Orígenes – (185 – 253 d. C.)
Orígenes
Orígenes, em grego ????????, (c. 185 — 253 d.C.) foi um teólogo e prolixo escritorcristão. Nasceu em Alexandria, Egipto, e faleceu, segundos alguns dados em Cesaréia, na actual Palestina ou, mais provavelmente, segundo outras fontes, em Tiro.
Biografia
O maior erudito da Igreja antiga – segundo J. Quasten – nasceu de uma família cristã egípcia e teve como mestre Clemente de Alexandria. Assumiu, em 203, a direção da escola catequética em Alexandria – que havia sido fundada por um estóico chamado Panteno que se havia convertido à mensagem de Cristo – atraindo muitos jovens estudantes pelo seu carisma, conhecimento e virtudes pessoais. Depois de ter também frequentado, desde 205, a escola de Amônio Sacas – fundador do neo-platonismo e mestre de Plotino -, apercebeu-se da necessidade do conhecimento apurado dos grandes filósofos. No decurso de uma viagem à Grécia, no ano de 230, foi ordenado sacerdote na Palestina pelos bispos Alexandre de Jerusalém e Teoctisto de Cesaréia. Em 231, Orígenes foi forçado a abandonar Alexandria devido à animosidade que o bispo Demétrio lhe devotava pelo facto de se ter feito eunuco no sentido literal e físico desta palavra. Também, contribui para esse facto o de Orígenes ter levado ao extremo a apropriação da filosofia platónica, tendo sido considerado herético. Orígenes, então, passou a morar num lugar onde Jesus havia, muitas vezes, estado: Cesaréia, na Palestina, onde prosseguiu as actividades com grande sucesso abrindo a chamada Escola de Cesaréia. Na sequência da onda de perseguição aos cristãos, ordenada por Décio, Orígenes foi preso e torturado, o que lhe causou a morte, por volta de 253.
A produção teológica
Orígenes escreveu – diz-nos São Jerónimo – nada menos que 600 obras, entre as quais as mais conhecidas são: “‘De Princippis’“; “‘Contra Celso’“ e a “‘Hexapla’“. Entre os seus numerosos comentários bíblicos devem ser realçados: “Comentário ao Evangelho de Mateus”; “Comentário ao Evangelho de João”. O número das suas Homílias que chegaram até aos dias de hoje ultrapassam largamente a centena.
Traços de um pensamento
A importância do Espírito Santo:
«O Espírito sopra onde quer (Jo 3, 8). Isto significa que o Espírito é um ser substancial e não, como alguns afirmam, uma simples força ou atividade de Deus sem existência individual. O Apóstolo (São Paulo), depois de enumerar os dons do Espírito, prossegue: “um só e o mesmo Espírito opera todas estas coisas, repartindo particularmente a cada um de acordo com a sua vontade” (1 Cor 12, 11). Portanto, se atua e distribui de acordo com a sua vontade, é um ser substancial ativo, e não uma mera atividade ou manifestação.»
Fragm. in Jo. 37.
Orígenes dedicava-se ao estudo e à discussão da filosofia, em especial Platão e os filósofos estóicos. No seu pensamento, podemos referir a tese da pré-existência da alma e a doutrina da “apocatastase”, ou seja, da restauração universal (PALINGENESIA), ambas posteriormente condenadas no Segundo Concílio de Constantinopla, realizado em 553, por serem formalmente contrárias ao núcleo irredutível do ensinamento bíblico -, embora estudiosos modernos e contemporâneos reconheçam inequivocamente que a primeira era mais «atribuída a Orígenes (por outros) do que propriamente defendida por ele». Segundo o renomado livro sobre a História da Filosofia de Giovanni Reale(1) a condenação de algumas doutrinas de Orígenes se deu muito pelos exageros cometidos pelos seus discípulos, os origenistas.
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(1) REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Patrística e Escolástica.2.ed. São Paulo: Paulus, 2005, v.2, p.44.
Ao contrário do que afirmam certos teosofistas – como, por exemplo Geddes MacGregor no seu livro de 1978 “Reincarnation in Christianity: A New Vision of the Role of Rebirth in Christian Thought” -, Orígenes era totalmente contrário à doutrina da metempsicose (renascimento do ser humano em animais). Profundo conhecedor deste conceito a partir da filosofia grega, afirma que a metempsicose (transmigracão) «é totalmente alheia à Igreja de Deus, não ensinada pelos Apóstolos e não sustentada pela Escritura» ( “Comentário ao Evangelho de Mateus” XIII, 1, 46–53).
Orígines, embora não duvidando de que o texto sagrado seja invariavelmente verdadeiro, insiste na necessidade da sua correcta interpretação. Assim, teve a suficiente percepção para distinguir três níveis de leitura das escrituras: 1) o Literal 2) o Moral; 3) o Espíritual, que é o mais importante e também o mais difícil. Segundo Orígenes, cada um destes níveis indica um estado de consciência e amadureciamento espiritual e psicológico.
Santíssima Trindade
Orígenes como é comum nos escritores cristãos influenciados pelas doutrinas derivadas de Platão coloca as Idéias platônicas na Mente Divina, na Sabedoria de Deus. O Filho de Deus, Segunda Pessoa da Trindade, é a Sabedoria biblica: Mente de Deus, substancialmente subsistente:
“… Deus sempre foi Pai, e sempre teve o Filho unigênito, que, conforme tudo o que expusemos acima, é chamado também de sabedoria (…) nesta sabedoria que sempre estava com o Pai, estava sempre contida, preordenada sob a forma de idéias, a criação, de modo que não houve momento em que a idéia daquilo que teria sido criado não estivesse na sabedoria…”.(2)
Influenciado pelo Medioplatonismo e pelo inicio do Neoplatonismo Orígenes admite certa subordinação do Filho ao Pai, é importante ressaltar que tal subordinação foi exagerada por seus adversários. E que apesar de discordar da perfeita paridade entre o Pai e o Filho, na História da Filosofia de Giovanni Reale afirma que Orígenes defende que o Pai e o Filho possuem a mesma essência.
Ao contrário dos homens que tornaram-se filhos de Deus pela adoção do Espírito: “Porquanto não recebestes um espírito de escravidão para viverdes ainda no temor, mas recebestes o espírito de adoção pelo qual clamamos: Aba! Pai!” (Romanos 8,15). Orígenes afirma que Cristo é Filho por natureza, “o Filho unigênito do Pai”(2)
(2) Os princípios, livro I, 4, 4-5 – Orígenes.
O que vai configurar o pensamento do Concílio de Nicéia, com a ressalva que Cristo Se fez menor do que o Pai quando Se encarnou até a morte na cruz, quando ressuscita ao terceiro dia e Se senta segundo Suas palavras à direita do Poder (Mt 26, 64).
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REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Patrística e Escolástica.2.ed. São Paulo: Paulus, 2005, v.2, p.44,45.
Maria no cristianismo
O pensamento de Orígenes chama bastante atenção no que diz respeito a esse tema, pois alem de afirmar a virgindade perpétua de Maria, o que foi praticamente uma unanimidade nos primeiros séculos do cristianismo, realça os olhos com que naturalidade afirma também a imaculada conceição de Maria:
“Desposada com José, mas não carnalmente unida. A Mãe deste foi Mãe imaculada, Mãe incorrupta, Mãe intacta. A Mãe deste, de qual este? A Mãe do Senhor, Unigênito de Deus, do Rei universal, do Salvador e Redentor de todos.” (Orígenes – homilia inter collectas ex variis locis).
Primado de Pedro
Conforme fragmento conservado na “História Eclesiástica” de Eusébio, III,1 Orígenes conta como foi o martírio do apóstolo Pedro em Roma:
“Pedro, finalmente tendo ido para Roma, lá foi crucificado de cabeça para baixo”.
E professa também o Primado de Pedro:
“E Pedro, sobre quem a Igreja de Cristo foi edificada, contra a qual as portas do inferno não prevalecerão.(…)” (In Joan. T.5 n.3)
Batismo
Orígenes também atesta que a Igreja como sempre fez deve batizar as crianças: “A Igreja recebeu dos Apóstolos a tradição de dar batismo também aos recém nascidos”. (Epist. ad Rom. Livro 5,9).
A Contra Celso e a exegese alegórica
Orígenes dedicou uma de suas obras contra Celso, considerado um dos primeiros críticos da doutrina do Cristianismo. Do que sabemos de Celso foi o próprio Orígenes quem nos deu a conhecer, inclusive a sua obra a Alêthês Lógos (O logos verdadeiro). A partir de Orígenes, sabemos ainda apenas que ele é do século II, e que escreveu a sua obra por volta de 178, e, portanto, sob o reinado do imperador Marco Aurélio (que se deu de 161 a 180). “A Alêthês Lógos, de Celso, coloca em questão vários assuntos da crença relacionados à criação e à unidade de Deus, à encarnação e ressurreição de Jesus, aos profetas, aos milagres, etc. Ela questiona também assuntos da vida religiosa, não só sobre a moral, mas também sobre a participação da Igreja e dos cristãos na vida política e social” (SPINELLI, M. Helenização e Recriação de Sentidos. Porto Alegre: Edipucrs, 2002, p.84). Na seqüência, Spinelli analisa esses vários pontos que a Contra Celso de Orígenes se propõe a combater. A obra exegética de Orígenes se concentra sobretudo no tratado que ele desenvoleu Sobre os princípios (Perì archôn). A exegese difundida e aplicada por ele está apoiada no que o judeu Fílon de Alexandria (20 a.C a 42 d.C.) concebeu como intepretação alegórica dos textos sagrados do judaísmo. “Filon era de opinião de que o texto bíblico, de um modo geral, carecia de ser interpretado historicamente (no sentido da crítica das fontes, da origem do texto e de seu contexto). Dado que as palavras tinham um sentido escondido, mas admirável e profundo, era necessário adentrar-se nessa profundeza, a fim de trazer à tona, além do sentido magnífico, todo o seu valor… É nessa mesma perspectiva de Fílon (representante da Escola Bíblica Judaica), e no ambiente das escolas exegéticas de Alexandria… que se desenvolveu a exegese de Orígenes” (SPINELLI, M. Helenização e Recriação de Sentidos. Op. cit., p.135).
BIBLIOGRAFIA
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SPINELLI, Miguel. Helenização e Recriação de Sentidos. A Filosofia na época da expansão do Cristianismo, séculos II, III e IV. Porto Alegre: Edipucrs, 2002, capítulos 5 e 7 dedicados a Orígenes.
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